
Se não fosse o prazer pessoal de escrever sobre aquilo de que gosto, já seria recompensa bastante para 20 anos de dedicação à causa audiófila o simples facto de, segundo Ernesto Damião, o Director da loja FNAC do Colombo, a minha escrita ter de algum modo inspirado a iniciativa, tão fantástica quanto surpreendente, de criar um espaço dedicado ao «highend» num mercado onde reinam o «electrodoméstico sonoro» e o «iPod». Afinal o «highend» existe e recomenda-se, não é apenas um delírio intelectual da meia-dúzia de maduros que me lêem...
APETÊNCIA LATENTE

Ernesto Damião tomou consciência disso quando, ao visitar amigos, verificava com surpresa que alguns tinham em casa equipamentos de som «highend», o patamar mais elevado do áudio. E constatou ainda que havia uma apetência latente num determinado estrato social pela qualidade suprema ao nível da reprodução sonora. Sendo a FNAC também uma fornecedora de discos das melhores etiquetas, e havendo em Portugal tantos distribuidores especializados, por que não apostar na melhor forma de reproduzir esses «conteúdos», mesmo tendo plena consciência de que o alvo é um nicho de mercado?
CONCEITO FNAC
O conceito de integração em espaço aberto, onde o consumidor ou simples visitante pode encontrar produtos culturais relacionados em áreas adjacentes e não-estanques, aposta na fluidez de movimentos, na liberdade de leitura e audição e na diversidade da oferta: livros, discos, «software», equipamentos e acessórios informáticos, fotografia, áudio e vídeo, bilhetes para espectáculos: um mundo a seus pés. Um autêntico microcosmos no qual a excelência da promoção tem o efeito centrípeto de alargar os horizontes culturais das áreas urbanas em que se insere.
ESTÚDIO HI-END

É neste «caldo de cultura» que nasce o «Estúdio Hi-End», uma iniciativa única no universo FNAC, que já recebeu a visita e a benção do Director-Geral do grupo. Arnaldo Oliveira, responsável do Departamento de Som/Imagem, juntou uma equipa jovem e entusiasta, composta por Vasco Gouveia, Pedro Magalhães e Francisco Silva, e meteu mãos à obra. Por razões de lógica funcional e estrutural, o «Estúdio» foi montado na área administrativa e não na loja, onde o hifi e o vídeo já dispõem de espaço próprio e a partir do qual são canalizados os potenciais clientes. Embora o conceito não seja o de «Clube VIP» restrito, as limitações de espaço e de tempo para atendimento especializado impõem algumas regras básicas de exploração, nomeadamente marcação prévia de audição. O visitante apresenta-se no balcão da secção de áudio/vídeo, diz a «senha» e é conduzido por um labirinto de portas e corredores até à «câmara secreta» onde decorre o ritual iniciático.
PRIMEIRA AUDIÇÃO

O «Estúdio Hi-End» está aberto à participação de todos os distribuidores mediante condições a negociar entre as partes. Na sessão inaugural actuou a Ajasom, que tem em António Almeida um dos principais apoiantes desta notável iniciativa. E não se poupou a esforços: trouxe consigo a «baixela de prata». Num auditório tratado com painéis acústicos RPG, actuou o “Kronos Quartet”, um sistema de sonho composto por: Leitor-Universal EAD, prévio e amplificadores a válvulas Nagra PL-L/Nagra VPA, colunas Audio Physics Kronos, cabos Kimber. Preço do conjunto: 100 000 euros!
Há ainda algumas questões de pormenor a tratar, nomeadamente resolver o problema de um gerador de energia próximo que produz um ruído incomodativo de baixa frequência, e eu acho que uns «tube traps» nos cantos seriam uma ajuda significativa no controlo dos graves de colunas de banda muito larga, como é o caso das Kronos. Mas nada disto tira o mérito à iniciativa: os mais difícil está feito!
NICHO DE MERCADO

Ernesto Damião tem consciência de que se trata de uma iniciativa arriscada no actual contexto económico e cultural. Além do óbvio esforço financeiro, a audiofilia exige também esforço de aprendizagem para poder ser apreciada em toda a sua glória. Ler «Sons» e navegar no «Hificlube» pode ser uma forma agradável de colmatar essa lacuna, a avaliar pelos simpáticos elogios de toda a equipa presente. Damião confessou mesmo que faz colecção das páginas de «Sons». E é em colaboração estreita entre todos os intervenientes da cena audiófila nacional que a FNAC aposta para o êxito desta iniciativa.
EM DEFESA DA CAUSA COMUM
A causa da audiofilia só tem a ganhar com este tão feliz quanto inesperado apoio institucional de uma organização de prestígio que conseguiu o feito de restabelecer a confiança num mercado discográfico em crise. Com o «Estúdio Hi-End» a busca do Graal Sónico é agora mais fácil. Enquanto houver bolsas de resistência audiófila no mundo, o “highend” perdurará no tempo como elemento cultural aglutinador de uma certa forma de estar na vida independentemente dos interesses comerciais em jogo. Obrigado FNAC.
Para mais informações: www.fnac.pt, tel. 21 711 42 00