Hotel Intercontinental/Palácio das Cardozas, Porto
A Imacústica convidou-me para a apresentação oficial das Sonus Faber AIDA (ver Artigos Relacionados). Fui com a minha esposa num pé e vim no outro. De comboio. No Alfa pendular. E fiquei hospedado no excelente Intercontinental/Palácio das Cardozas, que me trouxe recordações do Waldorf Astoria de Nova Iorque: o luxo dos mármores e granitos, a qualidade do mobiliário, o conforto e o requinte, a patine, enfim.
Corredor de acesso ao Salão de Chá Astoria
Mas com muito melhor serviço: o pessoal é todo jovem e de uma inexcedível cortesia no atendimento e simpatia no trato. E não se dá ares de superioridade como os novairquinos. Por curiosa coincidência, nesta mesma data, Lucette Nicholl tinha-me convidado para estar precisamente no Waldorf Astoria para reportar sobre o novo show de NY. Mas a proximidade do Highend Show obrigou-me a optar por Munique. E em boa hora o fiz: o Porto estava lindo, e não foi por acaso considerado um dos destinos turísticos de eleição na Europa.
A room with a view over the city lights
À noite, da janela do quarto, a vista da zona nobre da cidade, vestida de luzes, ouviam-se gaivotas pairando fantasmagóricas sobre a estátua equestre de D. Pedro IV. Uma homenagem alada de seres livres na Praça da Liberdade e um bom prenúncio do espectáculo que Aida me iria proporcionar no auditório da Imacústica - sem o coro dos escravos - e o espelho da proverbial hospitalidade da família Dias.
A opulência arquitectónica da praça, que alberga a alta finança, inspirou-me a jogar no Euromilhões no “Deus dá Sorte”, não fosse o diabo tecer a hipótese de levar comigo um par de Aida na bagagem. Posso confirmar que Ele a mim não me deu essa graça. Pelo menos na forma de 53 milhões de euros! Ou teria sido uma “festa” para os importadores de highend, tal como a Parque Escolar o foi, segundo a ex-Ministra Lurdes, para as empresas de construção. Tudo coisas que li no caminho, não tendo que me preocupar com a condução. E pergunto-me: qual a vantagem do TGV numa viagem entre Lisboa e Porto? Quanto iria custar cada minuto a menos? Quanto iria custar a mais cada bilhete, se já pedem 80 euros ida-volta/pessoa pelo Alfa? Aliás, fiquei com a estranha sensação que fui dos poucos que pagou, os outros ou tinham uma credencial da CP ou constavam de uma lista. Enquanto eu mostrei o bilhete, eles só tinham de mostrar o cartão de cidadão. Quanto é mesmo que a CP dá todos os anos de prejuízo aos contribuintes?...
Das Mágicas Q1 à magia do cinema
Isto suscita-nos outra questão, esta já relacionada com a temática do Hificlube. Até que ponto, cada euro a mais corresponde a uma melhoria audível no campo do highend? Será aqui também necessário o TGV do som? Primeiro é preciso saber ouvir ou não vale a pena investir. Depois tem de haver empatia entre o ouvinte e o produto em si, isto é, a maior ou menor importância, que cada um atribui às pequenas diferenças, faz toda a... diferença, na justificação racional de um investimento que tem muito de emocional.
Antes de assistir ao espectáculo das Aida, no auditório principal, Luís Campos, os mestre do CD, propôs-me ouvir duas recentes aquisições do plantel da Imacústica: o tão esperado amplificador Dan D'Agostino estéreo, na versão preto-cobre, e os minimonitores Magico Q1. Sugeri que se ouvissem duas ou três faixas específicas, que seriam depois repetidas no sistema principal, para avaliar em que medida pagar dez vezes mais pode ou não significar 'ouvir' dez vezes mais música, dando de barato que a escala, sobretudo do palco sonoro, é à partida um dado adquirido. As Aida são uma catedral gótica; as Q1 um igreja evangélica, à qual não falta, contudo, ambiência e espiritualidade. Oiça-se a comparação:
Ouvimos assim religiosamente as 'mil vozes' de um coro na Ave Maria, de Bruckner, e, depois, gostosamente a misteriosa ambiguidade de Ney Matogrosso e a sensualidade pueril de Maria Gadú.
Em ambos os casos, o dueto D'Agostino/Magico (fonte Audio Research CD7; prévio AR REF5SE) justificou o preço e a fama, não tanto pelo que me deixou ouvir. Muito bom. Tão bom, aliás, que pedi ao Manuel a graça de me deixar testar o sistema. Mas, sobretudo, pela excelente gestão das pausas, dos silêncios do espírito. Todos os audiófilos entendem a importância da boa reprodução de 'decay', a mítica 'visão' da cauda do meteoro acústico, na escuridão sideral da reverberação de uma catedral, enquanto cimento harmónico das vozes de um coro. Bruckner não busca a harmonia per si, antes a cultiva a partir da 'suspensão' contrapontística. É esta 'arte da suspensão' que só pode ser correctamente reproduzida por um sistema de elevada resolução intrínseca (não confundir com o detalhe explícito e, quantas vezes, quase obsceno, neste contexto) e umas colunas, as Q1, que, pela sua concepção e construção, não armazenam energia.
É curioso como esta notável característica de gestão de silêncios (que não se deve confundir com ausência de som, pois tem extraordinário conteúdo informativo) está patente também na voz a solo de Maria Gadú. Não é só o que canta, é como canta: o ritmo está, não nas palavras, mas nas pausas. É nestas que está gravada a perfídia inocente do gozo da adolescente que toma consciência da sua transformação numa mulher adulta e sensual, e no poder que isso tem sobre quem antes a rejeitou.
São assim as Q1: deixe-se dominar pela sobranceria que o seu reduzido tamanho lhe pode suscitar, levando-o à negação e ao engano, e um dia elas crescem (na admiração da crítica internacional, entenda-se), sente o desejo de as possuir e só vai poder olhar. É para aprender a nunca mais as 'esnobar'... Por falar em olhar, haverá sempre quem prefira ver como S. Tomé. Até para não sofrer a desilusão que eu tive, quando vi finalmente a Gadú. É um dos tais casos em que eu prefiro ouvir a ver: aquela sensualidade toda, afinal, vem de uma maria-rapaz!
Nero incendeia o grande ecrã
Assim, ainda antes da abertura da Aida, não a de Verdi, a de Paolo Tezzon, o também italiano Sim 2 Nero incendiou o ecrã da sala de AV, tendo como guarda pretoriana a Theta, Krell e colunas Martin Logan. Aqui nada é deixado à imaginação do ouvinte: via-se cada fio do cabelo sedoso da bela Katherine McPhee, uma carinha laroca, com um fiozinho de azeite virgem na voz, que mal temperou o caldo espesso dos metais da Boston Pops, e não chega aos calcanhares do 'azeite balsâmico' que dá sabor à voz de Diana Krall; cada implante da dentadura do rocker Steven Tyler; e cada implante individual da cabeleira loira de Elton John, um gay assumido com voz de macho, ao contrário de Ney, um macho com voz de fêmea. Em todos os casos, não havia qualquer ambiguidade: excelente imagem e som a condizer. Mas o leitor também pode ver para crer...
Imagem obtida directamente da tela projectada pelo Sim2 Nero e som registado directamente do sistema de colunas Martin Logan. Nota: se a sua net aguentar o andamento para melhor efeito seleccione 1080p e full screen. Se observar muitas paragens reduza a resolução.
Porto de honra_ The Luís Campos' CD collection
Slideshow com ilustração musical de Jennifer Warnes (som captado directamente do sistema em demonstração sem qualquer processamento posterior, além da compressão imposta pelo You Tube). Nota: para melhor efeito seleccione full screen 1080p
Grappelli afinal vive dentro de uma Aida, no Porto
Piéce de résistance_ The Guilhermimo Pereira's rare LP collection
Guilhermino Pereira tem na sua colecção discos pretos que valem ouro...
O concerto da AIDA no palco da IMACÚSTICA não terminou sem uma prova de LPs vintage da colecção de Guilhermino Pereira, alguns de tecnologia 'direct cut'. O HIFICLUBE deixa-lhe aqui um cestinho com amostras. A qualidade da imagem video é pobre, por deficiente iluminação, e o microfone da câmara sofreu horrores com a violência da guerra de Shostakovich e os excessos românticos de Berlioz. Por isso, não há nada como ir ouvir o original...
HIFICLUBE agradece à IMACÚSTICA, Manuel Dias e esposa, e a todos os seus colaboradores a hospitalidade, o carinho e atenção que dispensaram a JVH e esposa, sem os quais esta reportagem não teria sido possível.