Vi a libelinha voar pela primeira vez em Munique. Do facto dei notícia na reportagem do Highend 2012. Embora tenha registado a explicação que me foi dada em video, em ambiente de “show” a concentração é baixa e a solicitação alta, pelo que fiquei com a ideia errada de que era apenas mais um interface, como o excelente M2Tech, que “liga” uma saída USB a uma “entrada” RCA digital (coaxial) para se poder ouvir os ficheiros musicais guardados no computador, via DAC integrado num sistema de som.
Mas não. Esta libelinha (ou libélula) “voa” mais alto. O Dragonfly da Audioquest é um produto revolucionário e simples, como todos os ovos de Colombo. Aparentemente, é apenas mais um interface USB/MiniJack/RCA. Na verdade, é um MiniDAC, que, por ser um prévio, com volume regulável, pode alimentar directamente (com sinal e controlo de volume analógico, atenção!) um par de auscultadores. Com o cabo adequado (mini jack/duplo RCA), liga-se também a uma entrada de linha de um integrado ou mesmo a um amplificador .
Tem o tamanho e parece-se com uma simples pendrive, e introduz-se de igual modo numa entrada USB do computador, como qualquer outra pen, só que esta tem mesmo “drive” - if you catch my drift.
Genial, é o termo que nos ocorre, quando pensamos como é que conseguiram por lá dentro um circuito de conversão digital 24-bit/96kHz, com 3-chips, incluindo o 24-bit ESS Sabre, o mesmo utilizado pela Krell, por exemplo; e um amplificador Burr Brown, com controlo de volume (!), que alimenta um par de auscultadores, sem recurso a qualquer outra fonte externa de energia, além das 5 fontes reguladas internas – cinco! Até tem “clocks” separados para os dois grupos de frequências múltiplas: 44,1/88,2 e 48/96...
Bestial, é o termo que nos ocorre, quando ouvimos a diferença na qualidade de som entre a placa do nosso PC ou portátil e a do Dragonfly, numa comparação A/B mesmo que rápida e informal. O efeito é tão instantâneo como o do pudim flan. E igualmente doce...
Sensacional, é o termo que nos ocorre, quando vemos a bela libelinha mudar de cor com a frequência do sinal digital: verde (44,1), azul (48kHz), âmbar/alaranjado (88,2kHz) e magenta/avermelhado (96kHz). E também toca MP3 – a verde!...
Reproduz sem problemas sinais a 176,4 e 192kHz, com downsampling respectivamente para 88,2/96kHz (se eu não dissesse você nem dava por isso...), que a maior parte das vezes chega bem para as encomendas, tal a qualidade da conversão assíncrona. Para a qual utiliza o ubíquo protocolo USB concebido por Gordon Rankin, da Wavenlength, que permite que seja o “clock” do DAC – e não o do computador – a controlar o fluxo de dados, eliminando o jitter, que é um dos males que afectam o “PC Sound”, se deixado à sua sorte. Há DACs que custam milhares de euros e não utilizam este protocolo fundamental.
Para o montar, basta colocá-lo numa das entradas USB do computador e ligar o minijack de 3,5mm dos auscultadores na outra ponta; ou um cabo com duplo RCA se pretender ligá-lo ao prévio ou amplificador integrado. Aqui a oferta da Audioquest é ampla e os preços também. Mas funciona com qualquer cabo “chinoca” dos que vêm com outros engenhos portáteis de vária ordem e preveniência. Talvez o som não seja tão bom, mas isso depende de si e da sua carteira: não tem lógica pagar mais pelos cabos que pelo DAC...
Depois, é só seguir as instruções do breve manual: Microsoft Windows ou Mac OS X. A configuração faz-se em 5 minutos através do Control Panel/Sound Devices Properties e não é preciso fazer download de qualquer software. Admito que, no meu portátil Asus, foi mais fácil seguir o guião.
No meu “Super PC”, artilhado pelo meu filho Pedro Henriques, que os comercializa a preços sem concorrência, a libelinha ilumina-se de verde, quando a coloco a primeira vez no ninho USB. Ao fim de uns segundos, passa a magenta (96kHz), e já não muda mais de cor, o que significa que deve estar configurado para fazer upsampling.
Ora, se isto é óptimo em termos acústicos, faz-me perder o espectáculo visual do caleidoscópio de cores das libelinhas a que assisto no portátil Asus. Por outro lado, na “bomba” (preciso de um PC potente para processar imagens e videos), enquanto dura este processo de reclocking (poucos segundos, repito), produz alguns estalidos digitais (?). A partir daí, se o deixar sempre introduzido na entrada USB, só se ouve música – e da boa!
E a libelinha fica iluminada de vermelho vivo, mesmo quando desligo o computador. Don’t ask me why. Deve ser de felicidade...
Adorei ouvir o Dragonfly sobretudo com auscultadores. Primeiro com os Focal, depois com os Martin Logan Mikros 70, cortesia da Imacústica. Em ambos os casos, a diferença é colossal, para citar o nosso Gasparito, em relação ao convencional “som de computador”, inóspito e estéril por comparação: na cor, na textura, no corpo, no ritmo até.
De tal modo, que, não poucas vezes, me perguntei se estava a ser hipnotizado por aquela libelinha luminosa, sobretudo quando ouvia música às escuras. Mais impressionante ainda é o som dos filmes: ouvi finalmente graves decentes, que ambos estes auscultadores são capazes de reproduzir, através do computador. E eis que a excepcional imagem digital de Avatar passou a ser ilustrada com a dignidade acústica que merece.
A sensação de espaço nas cenas da floresta é agradavelmente envolvente, em estéreo!, talvez porque o Dragonfly reproduz melhor a floresta que as árvores (o Dragonfly não é, nem podia ser, a última palavra em resolução e transparência, que não é fácil e custa milhões: veja-se o custo dos sistemas de topo da dCS e da Wadia), com a vantagem de o equilíbrio tonal ser sobre o quente e relaxante, tipo SPA acústico, que é o que melhor se adapta às audições prolongadas, sem que por isso os agudos esmoreçam.
O desempenho com outros auscultadores pode variar em função da impedância e sensibilidade . O Dragonfly não substitui, como é óbvio, um bom amplificador de auscultadores dedicado. Há, contudo, alguns que custam mais que um enxame de libelinhas...
Faça as suas próprias experiências, pois pode levar o Dragonfly consigo para todo o lado, ao contrário de um amp dedicado a válvulas. Aliás, basta ter um portátil e um par de colunas activas de secretária. Abra a janela, deixe entrar a libelinha e encha a casa de música.
E pensar eu que, quando era miúdo, tinha medo das libelinhas, que sobrevoavam o meu território, quais precursores dos drones assassinos em voo rasante, e me obrigavam a procurar refúgio rapidamente na cabana da aventura. O meu outro ódio de estimação era o louva-a-Deus. Espero que não seja a inspiração do próximo DAC da Audioquest...
Este é o melhor DAC que se pode comprar até 300 euros? Talvez não, estou a pensar no MyDAC, da Micromega, cujo bouquet acústico é muito semelhante, mas que tem outro “estatuto” audiófilo, quando inserido num sistema highend.
A principal vantagem desta libelinha adorável é que se pode voar como ela para todo o lado – literalmente, pois é, sem dúvida, o DAC mais pequeno do mundo com performance de gente grande. Ideal para longas viagens de avião.
O Dragonfly pode até caber num bolso, que nem precisa de ser muito “fundo”, mas são poucos os DACs capazes de o “meter no bolso”. Quem disse que o tamanho conta?...
Tendo em conta as suas características únicas, preço, tamanho e notável desempenho, este é o Produto Áudio do Ano 2012 para Trabalho e Lazer. A que, após audição prolongada, junto agora... Prazer!