Mark Levinson Nº320S, pairando acima da música
Tal como acontece hoje com certos nomes famosos da alta-costura, há marcas que são autónomas das personalidades que lhes deram origem. É o caso de Mark Levinson-homem que já não tem nada a ver com Mark Levinson-marca. Mas o prestígio do nome mantém-se, apesar das vicissitudes bolsistas.
A Mark Levinson faz hoje parte do grupo Harman, depois de ter sido comercializada sob a chancela Madrigal, junto com a Proceed, entretanto descontinuada. Saneadas as finanças e restruturada a empresa, a Mark Levinson regressou em força ao mercado de highend com novos prévios e amplificadores e tem já em carteira a produção de um leitor Universal de referência.
José Júdice, um dos três co-fundadores da revista Audio, e Jorge «Maître» Gaspar, um dos mais conceituados audiófilos nacionais, propuseram-me, em nome da AudioElite, que distribui a Mark Levinson em Portugal, a audição de um duo composto pelo preamplificador ML Nº320S e o amplificador estéreo ML Nº432.
Na audição prévia o duo foi acolitado pelo par residente de colunas Martin Logan Odyssey (cabos Nordost e Siltech), tendo como fontes os excelentes Theta Compli, Sony XA777es c/ ou sem a participação do Chord DAC64. O Nº432 soou algo «verde»: menos «solto», expansivo e vigoroso que um Krell FPB400cx com dois anos de uso intensivo, ainda que o potencial sonoro fosse óbvio e a evolução evidente à medida que o tempo avançava. Gostei em especial da ausência de assinatura acústica, indiciando uma electrónica neutra que se recomenda aos puristas. A sugestão feita por José Júdice para que a análise crítica se efectuasse apenas após 300 horas de «queima» parece excessiva mas é pertinente, e até vulgar nos meios audiófilos especializados, e também inconciliável com os meus compromissos editoriais (e a conta da EDP!), pelo que ficou aprazada a audição posterior do Nº432 já em estado de maturação avançada.
PASSIVO OU ACTIVO?
Há actualmente uma clara tendência nos meios audiófilos fundamentalistas para considerar os «prévios» activos, isto é, com ganho, dispensáveis. De facto, a tensão de saída das fontes digitais é tão elevada que um «passivo» artesanal com um simples potenciómetro utilizado como «atenuador» de volume é quanto basta. Por outro lado, o áudio em dois canais é cada vez mais um nicho de mercado no vasto panorama AV, que tem na visão/audição de filmes e no som multicanal o seu «core business». Assim, o ML Nº320S, ou qualquer outro prévio highend, pelo qual se tem a desfaçatez de pedir alguns milhares de euros, arrisca-se a ser encarado como mais uma provocação em época de recessão. Contudo, já tinhamos visto aqui, quando escrevi sobre o leitor-CD Reimyo CDP-777, que custa 14 000 euros (!), que a audiofilia, tal como a relojoaria, arte, canetas, isqueiros, charutos, bebidas, automóveis, roupa, etc., tem, a partir de um certo patamar de qualidade, razões que a razão desconhece. Basta ler a revista do Expresso, onde se propõem relógios de 80 000 euros (horas são horas, não?!...).
Na gastronomia, estão também agora na moda as trufas selvagens a preços selváticos (caviar é coisa de novo rico). O Herman adora-as, pode pagá-las, e faz disso propaganda. Os Mark Levinson, Krell, Spectral, Halcro, McIntosh, etc, são «trufas» audiófilas, iguarias sonoras só para quem as sabe apreciar e pode pagar.
O highend (ultraaltafidelidade) não é para espíritos fracos, de coração (e carteira) mole. O mercado de produtos de luxo existe, sempre existiu e vai continuar a existir, dependendo o seu sucesso, não só de factores económicos e sociais, mas fundamentalmente do nível de cultura de uma sociedade. Ou seja, não basta ter dinheiro, é preciso saber gastá-lo com conhecimento de causa, tal como sucede no mercado de arte, pois é de arte que se trata aqui também. A mim compete-me apenas analisar se, em termos audiófilos absolutos, o ML Nº320S justifica o investimento no universo limitado de potenciais consumidores. Deixo as questões socioeconómicas para quem de direito, com a ressalva de que este tipo de produtos tem conhecido ultimamente grande sucesso nos meios financeiros da nova Rússia e, pasme-se!, da China, um país comunista em forte expansão... capitalista.
Para miséria chega lá em casa, diz o povo. Assim vamos fechar o ano de 2004 em beleza e sem falsos preconceitos.
Continua (ver Parte 2 em Artigos Relacionados abaixo)
Tal como acontece hoje com certos nomes famosos da alta-costura, há marcas que são autónomas das personalidades que lhes deram origem. É o caso de Mark Levinson-homem que já não tem nada a ver com Mark Levinson-marca. Mas o prestígio do nome mantém-se, apesar das vicissitudes bolsistas.
A Mark Levinson faz hoje parte do grupo Harman, depois de ter sido comercializada sob a chancela Madrigal, junto com a Proceed, entretanto descontinuada. Saneadas as finanças e restruturada a empresa, a Mark Levinson regressou em força ao mercado de highend com novos prévios e amplificadores e tem já em carteira a produção de um leitor Universal de referência.
José Júdice, um dos três co-fundadores da revista Audio, e Jorge «Maître» Gaspar, um dos mais conceituados audiófilos nacionais, propuseram-me, em nome da AudioElite, que distribui a Mark Levinson em Portugal, a audição de um duo composto pelo preamplificador ML Nº320S e o amplificador estéreo ML Nº432.
Na audição prévia o duo foi acolitado pelo par residente de colunas Martin Logan Odyssey (cabos Nordost e Siltech), tendo como fontes os excelentes Theta Compli, Sony XA777es c/ ou sem a participação do Chord DAC64. O Nº432 soou algo «verde»: menos «solto», expansivo e vigoroso que um Krell FPB400cx com dois anos de uso intensivo, ainda que o potencial sonoro fosse óbvio e a evolução evidente à medida que o tempo avançava. Gostei em especial da ausência de assinatura acústica, indiciando uma electrónica neutra que se recomenda aos puristas. A sugestão feita por José Júdice para que a análise crítica se efectuasse apenas após 300 horas de «queima» parece excessiva mas é pertinente, e até vulgar nos meios audiófilos especializados, e também inconciliável com os meus compromissos editoriais (e a conta da EDP!), pelo que ficou aprazada a audição posterior do Nº432 já em estado de maturação avançada.
PASSIVO OU ACTIVO?
Há actualmente uma clara tendência nos meios audiófilos fundamentalistas para considerar os «prévios» activos, isto é, com ganho, dispensáveis. De facto, a tensão de saída das fontes digitais é tão elevada que um «passivo» artesanal com um simples potenciómetro utilizado como «atenuador» de volume é quanto basta. Por outro lado, o áudio em dois canais é cada vez mais um nicho de mercado no vasto panorama AV, que tem na visão/audição de filmes e no som multicanal o seu «core business». Assim, o ML Nº320S, ou qualquer outro prévio highend, pelo qual se tem a desfaçatez de pedir alguns milhares de euros, arrisca-se a ser encarado como mais uma provocação em época de recessão. Contudo, já tinhamos visto aqui, quando escrevi sobre o leitor-CD Reimyo CDP-777, que custa 14 000 euros (!), que a audiofilia, tal como a relojoaria, arte, canetas, isqueiros, charutos, bebidas, automóveis, roupa, etc., tem, a partir de um certo patamar de qualidade, razões que a razão desconhece. Basta ler a revista do Expresso, onde se propõem relógios de 80 000 euros (horas são horas, não?!...).
Na gastronomia, estão também agora na moda as trufas selvagens a preços selváticos (caviar é coisa de novo rico). O Herman adora-as, pode pagá-las, e faz disso propaganda. Os Mark Levinson, Krell, Spectral, Halcro, McIntosh, etc, são «trufas» audiófilas, iguarias sonoras só para quem as sabe apreciar e pode pagar.
O highend (ultraaltafidelidade) não é para espíritos fracos, de coração (e carteira) mole. O mercado de produtos de luxo existe, sempre existiu e vai continuar a existir, dependendo o seu sucesso, não só de factores económicos e sociais, mas fundamentalmente do nível de cultura de uma sociedade. Ou seja, não basta ter dinheiro, é preciso saber gastá-lo com conhecimento de causa, tal como sucede no mercado de arte, pois é de arte que se trata aqui também. A mim compete-me apenas analisar se, em termos audiófilos absolutos, o ML Nº320S justifica o investimento no universo limitado de potenciais consumidores. Deixo as questões socioeconómicas para quem de direito, com a ressalva de que este tipo de produtos tem conhecido ultimamente grande sucesso nos meios financeiros da nova Rússia e, pasme-se!, da China, um país comunista em forte expansão... capitalista.
Para miséria chega lá em casa, diz o povo. Assim vamos fechar o ano de 2004 em beleza e sem falsos preconceitos.
Continua (ver Parte 2 em Artigos Relacionados abaixo)