Mário Bettencourt Resendes (foto DN, direitos reservados)
Fui durante 15 anos colaborador do DN. Sempre na área do “Som”. Quase sempre com o Mário como director. Sendo um defensor convicto do jornalismo substantivo, nunca me fez sentir um colaborador acessório, que escrevia sobre fait-divers audiófilos e “roubava” páginas a cores ao elitismo cultural do DNA. Pelo contrário, incentivou-me, apoiou-me e pediu-me muitas vezes opiniões sobre qual a melhor forma de apreciar a música de que tanto gostava. Fui eu que lhe sugeri o equipamento de som.
E, quando Mário Bettencourt Resendes defendia algo ou apoiava alguém, fazia-o com tal determinação, veemência mesmo, a raiar a exuberância física do proverbial murro na mesa, que não deixava margem para dúvidas, a quem ousasse contrariá-lo, sobre qual era a sua decisão definitiva e inapelável.
Paradoxalmente, era uma pessoa que irradiava serenidade, fundada não na personalidade calma do ilhéu, mas na profundidade das suas convicções moldadas pela vasta cultura e pelo cosmopolitismo. Mário era um homem com mundo. E talvez por isso compreendesse melhor o país que outros que o não tinham.
O jornalismo deve muito a Mário Bettencourt Resendes. E os audiófilos perderam um director que lhes concedeu uma tribuna privilegiada num jornal de referência, durante mais de uma década. Tantos anos quantos lutou contra o cancro ao qual nunca se rendeu. Como nunca se rendeu aos interesses económicos e políticos. Já não há directores destes. Já não há jornais destes.
Amigo Mário, descansa em paz, agora que a velha metáfora audiófila da música celestial se tornou finalmente realidade para ti.