Estive de férias. Da escrita, que não do trabalho. Ou foi a escrita que esteve de férias de mim. Por várias vezes ataquei o teclado, e não me saía nada de jeito. Não sei se é da ansiedade, por saber que mais tarde ou mais cedo vou ter de adoptar o acordo ortográfico. Será que ao passar a escrever ato, mesmo quando de um acto de escrita se trata, não se ato nem se desato?
Contudo, não estive de férias da música nem do hifi, embora o calor não convide a audições em Classe A. Seria o mesmo que negar a minha própria razão de existir, enquanto escriba. E como chegou a altura de fazer prova de vida, aqui vão algumas reflexões sobre coisas e loisas do áudio, não vão os leitores pensar que se viram finalmente livres de mim. As notícias sobre a minha reforma antecipada são como sempre muito exageradas. Eu já disse que vou até ao fim. Habituem-se a esta ideia.
Krell 402 e (foto publicada na reportagem CES 2010)
Assim, cá por casa, tem andado a tocar, em função da meteorologia, o novo Krell Evo402 e. E em verdade vos digo que o ezinhonão é só marketing. O 402 e constitui, de facto, uma evolução, mesmo que à revelia de Dan D’Agostino. O tradicional grave Krell está lá, só que não realça tanto do conjunto do espectro. Há agora mais team work: médio e agudo dispensam o subsídio de reinserção acústica, que consistia, no meu caso, em “tirar” um pouco ao grave para compensar sectores menos privilegiados da sociedade espectral.
Digamos que os novos Krell têm mais equilíbrio ecológico (hélas, não económico) e acústico. Mas deixemos a análise em profundidade para quando o tempo começar a refrescar e tiver finalmente início a saison audiófila.
Em Agosto, a roupa, a comida, a música e os amores querem-se leves e fáceis de digerir. Como o M2Tech HIFace. É fácil, é barato e dá acesso a milhões de faixas musicais, incluindo faixas em alta resolução a 24/96, e mesmo 24/192!, via computador à distância de um clic...
M2 Tech HiFace (RCA)
O HI FACE parece um tweak, funciona como um tweak, tem o preço de um tweak, mas não é um tweak. É um conversor (interface) USB/SPDIF de alta tecnologia que funciona tal como é publicitado. O que não é pouco, se considerarmos que faz o que apenas raros e caros conversores prometem fazer: transmissão assíncrona de sinais digitais até 24 bit/192kHz do seu PC/MAC via USB para a entrada SPDIF ou BNC do seu DAC. Ao contrário dos tweaks, não é uma questão de fé, de crença ou sugestão. Funciona mesmo!
Foi quando estive em Aveiro para fazer a reportagem do Highend Show que o Miguel, da Ultimate, me propôs testar o que, na altura, me parecia uma simples pen (USB Drive), que na outra ponta tinha uma saída RCA. Na altura, disse-me ele, enigmático: enfia-se isto na entrada USB do seu portátil, faz-se download de faixas em alta resolução disponíveis no site da Reference Recordings, por exemplo, liga-se a HiFace ao conversor et voilá. Custa só cerca de 115 euros/RCA (135 euros/BNC) e para iniciação na audiofilia cibernáutica é quanto basta. Quando a esmola é grande, pobre desconfia...
Tive a Hiface durante bastante tempo em stand-by , porque afinal não era só plug&play. Tinha de se instalar um software qualquer (nada de complexo, mesmo para mim). Mas preferi esperar que o meu filho tivesse uns momentos disponíveis para fazer a instalação no meu Vaio, não fosse eu meter os pés pelas mãos.
Um dia fui para o estúdio com o Vaio já artilhado debaixo do braço, a Hiface e uma pen com faixas em alta resolução sacadas da net (legalmente), liguei tudo direitinho ao sistema residente e...surpresa das surpresas, não é que aquilo tocava como prometido!
Como utilizei o software do iTunes, além do Media Monkey proposto pelo Miguel, ainda pensei para comigo, espera lá pá, o iTunes reconverte tudo para aac (versão variable bit rate da iTunes) e tu estás a ouvir ficheiros comprimidos. Mas não, porque eu nunca cheguei a transferir a informação da pen para o iTunes, e havia uma clara diferença entre ficheiros wav e aiif (o iTunes não aceita flac, vá-se lá saber porquê). Mais transparente o wav, mais encorpado e redondo o aiff. E quando procurava nas informações (properties) sobre as características do ficheiro, lá estava: 24 bit 176, 4kHz, 8467 kbps!
O que me deixou ainda mais perplexo. Porque o meu dac não converte, em princípio, ficheiros com resolução superior a 96kHz. Será que o Hiface faz downsampling, Miguel? Ou será que o aac da iTunes é melhor do que o pintam?
Mas fosse qual fosse a resolução, eu já estava satisfeito por isto funcionar sequer, quanto mais que a música me agradasse sobremaneira, mesmo através de um sistema onde já ouvi leitores CD/SACD de dezenas de milhares de euros. Só de pensar que, no futuro, um Vaio e um pinchavelho destes substitui com vantagem um transporte digital highend, assusta. E obriga-nos a rever os nossos critérios de preço/qualidade de som.
Bom, aqui e ali ouvi alguns soluços, uns tics que interrompiam a música por milésimos de segundo. Numa audição séria, seria inaceitável. Parece que isso se corrige aumentando o buffer do Vaio. Mas deixo isso para os entendidos.
A M2Tech HiFace é a concretização dos desejos dos audiófilos tesos que sonham com um conversor highend com entrada USB e conversão assíncrona, com duplo oscilador de quartzo e baixo jitter (2.5 ppm!!). É compatível com todas as frequências de amostragem utilizadas na indústria áudio: 44,1, 48, 88,2, 176,4, 96/192 kHz, e funciona em ambiente Windows e Mac (Linux em preparação). Tudo numa embalagem de bolso.
Que um tipo como eu admita que este é o componente com o mais elevado valor por bit musical que já passou pelo seu estúdio de audição, surpreende-me até a mim próprio. Ao que um crítico conservador que dedicou a vida ao highend pode chegar, pensam os leitores. Depois disto, como é que ele vai testar o leitor CD/SACD TAD600, que custa 33 000 euros? Mas é a pura verdade. E não há sentença que a mude.
Distribuidor: Ultimate Audio
Fabricante: M2Tech 6Moons review
Enjoy The Music Review Reference Recordings (faixas em alta resolução gratuitas)
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