Como dizem os americanos, nada me tinha preparado para isto. Em Munique, há sempre novidades e curiosidades, algumas pré-anunciadas e divulgadas. Mas nenhuma foto faz justiça ao ‘Relentless’ e não sabia se devia ficar espantado ou em choque com as ‘cornetas’ chinesas da ESD Acoustic...
Apesar da minha vasta experiência, não é fácil abordar um evento desta envergadura, com tantos expositores e produtos novos, isto mesmo tendo em conta a excelente organização e a app com todos os mapas e localizações possíveis, que nos permite descobrir em segundos onde se encontra o que procuramos.
Começo sempre com um plano fantástico e um guia ordenado e lógico mas, quando chego ao M.O.C., perco-me no espaço e no tempo, entro e saio das salas ao sabor do acaso ou do instinto (entro, não entro?, fico, não fico, gravo, não gravo). Por vezes, acabo por perder uma audição, por causa de um encontro fortuito no corredor – não há tempo a perder no Highend.
Por outro lado, há que optar por visitar, fotografar, filmar e gravar, ou editar. Não é por acaso que as principais revistas americanas e inglesas mandam equipas inteiras para cobrir áreas específicas: analógico, digital, colunas, amplificadores, de preço tal e tal, etc. E, mesmo assim, não chegam primeiro, nem vão mais longe que o Hificlube. O que podem ter – admito - é mais informação sobre modelos, especificações, preços, porque a informação é-lhes dada previamente em inglês e basta fazer copy paste.
Também eu comecei há muitos anos por fazer uma listagem pormenorizada, por ordem alfabética, mas isso implica ter alguém, a recolher primeiro toda a informação para depois eu a poder trabalhar calmamente no press center. Concluí que, por mais que me esforçasse, chegava sempre atrasado.
Assim, o ideal é andar ‘à solta’ no M.O.C., sem percurso previsto, de máquina pronta a disparar. Deste modo, os leitores do Hificlube puderam ver o que eu vi, no próprio dia; e ouvir o que eu ouvi, embora sem grande qualidade de som, numa primeira fase, nos vídeos generalistas. Os próximos vídeos serão mais longos e representativos da qualidade e incidirão sobre audições específicas.
As notas que tomei vêm depois, após uma selecção rigorosa, pois é impossível opinar sobre tudo. Os próprios americanos opinam apenas sobre aquilo que lhes interessa em termos comerciais – e para os britânicos, o que é 'nacional' é bom. Britannia rules...
Nós, como não temos produção nacional, salvo raríssimas excepções, como a Innuos, podemos dar-nos ao luxo de escrever sobre tudo, desde o highend americano e europeu às loucuras chinesas...
Neste momento, apetece-me escrever apenas sobre aquilo que me ficou na cabeça, sem ter de recorrer a cábulas ou press-releases. Tal como a cultura, o importante é o que fica, depois de esquecermos o muito que vimos e ouvimos.
Com tanta concorrência a escrever sobre o mesmo, acho que a única forma de fazer diferente é escrever sobre a minha experiência pessoal, em Munique.
E assim, de repente, o que me vem à cabeça são as pessoas, não as coisas, embora sejam estas que nos levam lá:
Dan D’Agostino orgulhoso com o que considera ser a sua magnus opera, tal como as Wamm de Dave Wilson. Que, não por acaso, foi a primeira pessoa a quem Dan demonstrou o amplificador ‘Relentless’, pois mais ninguém o ouviu. Ironicamente, estava em exposição estática apenas. É enorme, algo que não transparece nas fotos (mas é óbvio no vídeo já publicado). Quando perguntei a Dan se era tão bom quanto é bonito, respondeu: melhor!
Segundo testemunhas, o conjunto Relentless/Wamm é provavelmente o melhor sistema (e o mais caro!) de som que o dinheiro pode comprar actualmente.
Peter McGrath mostrou-me (também não as ouvi) as monitoras Wilson Audio TuneTOT, um nome mal escolhido, porque ‘tot’, na Alemanha, tem a ver com ‘morte’.
Pela hora da morte vai ser o preço, que deve chegar aos 15 mil euros! Mas foi de vida que se falou, e de como Dave Wilson resiste com fé e esperança à grave doença que o atormenta, sempre com espírito positivo e com planos para o futuro.
Flemming E. Rasmussen exibiu o novo prévio topo de gama Gryphon Zena, que será o último com a sua assinatura, pois anunciou que se vai retirar por razões de saúde.
Fiore Cappelletto, entusiasmado com a nova linha Sonetto, da Sonus faber, que vai ‘democratizar’ o hifi de qualidade, mas será integralmente construída em Itália.
‘Mudámos o armazém da fábrica para outro edifício para poder criar um centro de produçao exclusivo para a gama Sonetto, tens de lá ir ver aquilo, está quase pronto’, disse-me.
Rob Watts que me deu uma curta entrevista exclusiva sobre o novo DAC Hugo TT2, 2 x mais potente que o Hugo e 5 x mais potente que o TT. De tal forma, que pode alimentar directamente um par de colunas, dispensando prévio e amplificador.
John Franks também deu um ar da sua graça com um novo amplificador de 150W c/ base em Mosfets (analógico c/ fonte comutada) dedicado para o Dave Choral Étude, depois do transporte também dedicado Blu MKII FPGA.
Cá em baixo, no ‘zoo’, dei com Bruno Putzeys, o génio que criou a tecnologia Ncore de amplificação digital, em amena cavaqueira com Laurence Dickie, da Vivid, que apresentou as novas colunas Kaya. Será que preparam em segredo uma versão activa com processamento DSP?
Alon Wolf esperava-me à porta da Magico. ‘Então, só chegaste agora? As A3 foram demonstradas ontem, agora até ao fim são só as M6’.
E foi assim que fui a Munique e não ouvi a A3, as colunas de chão mais baratas de sempre da Magico. Fala-se em 12/13 mil euros. Mas a esta hora já deve estar um par a chegar à Imacústica, onde as posso ouvir sem a pressão do (i)mediatismo.
Edwin, da Siltech, demonstrou as Arabesque Minissimo Diamond com o novo amplificador derivado do Cube.
Que bem que aquilo toca (veja o video)! O som é cheio, encorpado, musical e relaxado. É também caro, claro...
Herbert Ludwig, da Audio Physics, exibia com um largo sorriso o catálogo da feira. ‘Sabia que as colunas na foto da capa com a cantora norueguesa Kari Bremnes são da Audio Physics?’ E mostrou-me um par com um enorme autógrafo da artista. ‘Este não vendo, fica para mim...’
Thomas Gessler, da Audionet, exibiu o novo super integrado topo de gama Humboldt (na demonstração optaram por Stern &Heisenberg) e mostrou-se esperançado de que a marca possa voltar ao mercado nacional pela mão de Rui Palhinha.
Assim como Silvio Delfino, que conheço há mais de 20 anos, e me revelou que virá a Portugal apresentar a sua nova marca Riviera, pois já tem um distribuidor ‘apalavrado’ (quem será?, eu sei).
A construção é soberba, o som não sei, pois na área de exposição a ideia é mais mostrar que demonstrar.
Admiro as pessoas que nunca desistem. Como Rondi D’Agostino, a ex-esposa de Dan, que comprou de volta a Krell das mãos incompetentes do grupo chinês que esteve na origem da saída de Dan, e pretende levantar a marca até ao seu antigo prestígio e me mostrou a sua primeira grande aposta: o integrado digital K-300i, com tecnologia iBias para garantir o funcionamento em Classe A até 10W e quasi Classe A a partir daí até aos 200W. Tem ligação ethernet para utilização streaming: Roon, Spotify, Tidal e Deezer ready. Mas não tem saída para auscultadores.
‘Vai ser o nosso próximo lançamento, um headphone amp’, riu-se Rondi. Foi um prazer revê-la. Já lá vão tantos anos que tanto eu como ela combinámos não os contar...
E o que dizer da ingenuidade romântica da chinesinha Nicole que me confessou o desejo de para o ano voltar à carga, literalmente, e apostar numa sala enorme para poder exibir e demonstrar as potencialidades ESD Acoustic full horn system.
É preciso ter muita coragem para investir num mercado já saturado de ‘cornetas’, sobretudo quando são tão, digamos, ‘exóticas’ e artesanais, quando comparadas com as Avantgarde e as Cessaro.