Ultimate Audio Sessions 2021: um elétrico chamado desejo
As B&W 801 D4 e 803 D4, respetivamente com amplificação Boulder e VAC, foram as cabeças de cartaz das Ultimate Audio Sessions, que se realizaram na loja de Lisboa e vão repetir na loja do Porto.
‘Um elétrico chamado desejo’, do original ‘A street car named desire’, de Elia Kazan (1951), com Vivienne Leigh e Marlon Brando, nos protagonistas, é um clássico do cinema mundial.
A fotografia, da autoria de Carlos Delgado, que decorava o Auditório Principal da Ultimate Audio, suscitou-me de imediato este título para a reportagem, porque o sistema em demonstração ativa é, também todo ele, um objeto de desejo:
- Boulder Amplifiers, Inc., 3060 & 2110
- Bowers & Wilkins 801D4
- IDEON audio Absolute Dac
- Taiko Audio Extreme Server
- Reed-audio Muse 3C e 5A
- Entreq Olympus T
- Isotek Genesis
- Critical Mass Systems Maxxum Reck
O catálogo da UAE é muito vasto, e há sempre novidades, mesmo para mim que tenho uma longa memória de experiências feita.
Destaco da lista acima a Entreq, Ideon, Reed, Taiko, tudo marcas desconhecidas, ou que conheci recentemente através da UAE.
Mas a cabeça de cartaz era, sem dúvida, a bem conhecida Bowers & Wilkins, na versão D4 da famosa 800 Diamond Series.
Do útero de Steyning para a maternidade de Worthing
Em 1999, sobre as B&W Nautilus 801 (o modelo original é de 1980), no âmbito de uma visita que fiz à fábrica da Bowers&Wilkins, em Worthing, no Sussex e ao Centro de Pesquisa, em Steyning, onde tive o prazer de conhecer Peter Fryer e John Dibb, publiquei no DN, um artigo intitulado ‘In Utero’, de que transcrevo um excerto:
‘As B&W Nautilus 801 têm aquela ambiguidade entre o divino e o diabólico que as torna tão próximas de nós humanos. Podem soar sublimes e delicadas – as vozes elevando-se ao céu em suspensão; ou violentas e autoritárias – os metais dilacerando a carne, as percussões exorcizando no seu frenesim os males de alma que nos afligem.
Os agudos cantam hossanas nas alturas, enquanto os graves descem ao inferno, chafurdando sem remorso na lava inscandescente da última oitava perdida – lá onde muitos subwoofers não ousariam sequer entrar…’.
E ainda:
‘…as B&W Nautilus 801 respiram, sopram, arfam com uma sensualidade que nos prende desde o primeiro sussurro, insuflando no ouvinte a paixão e o desejo de posse, mas também o respeito e o temor reverencial perante a evidência da sua superioridade.
É isso, chegam a assustar, tal a demonstração de poder e dinâmica.
Os metais rasgam com um realismo atroz o espesso tecido percutivo a golpes violentos de cutelo, e não com as finas e delicadas incisões cirúrgicas a que o hifi nos habituou; com movimentos certeiros de arco, os violinos desenham no ar um palco amplo e profundo, acomodando num abraço solidário todos os outros intervenientes, sem nunca desrespeitar a sua individualidade tímbrica e iluminando-os a todos por igual…’.
Memórias de vinte anos de inovação
Passados mais de 20 anos, nos quais a B&W foi primeiro adquirida pelas Eva Automation e depois pela Sound United, em que medida é que as novas B&W 801 D4, legítimas herdeiras das Nautilus 801 e descendentes diretas das Diamond Series D3, conseguem superar uma coluna de som que já era em 1999 superlativa?
No essencial, as D4 mantêm a ‘separação de poderes’, exigida pela democracia audiófila: graves, médios e agudos, cada qual no seu ‘ministério’.
O grave perdeu ‘perímetro abdominal’ e é agora reproduzido por dois woofers (2 x 250mm Aerofoil); o médio continua alojado na cabeça calva e negra, que antes era de Merlan (um material cerâmico rígido) e agora é em alumínio; o tweeter vive num condomínio próprio de metal escavado e exibe a riqueza dos diamantes e o preço correspondente de 35.000 euros!
Mas a lista de inovações tecnológicas é vasta, mesmo depois de as D3 alardearem 800 alterações em relação ao modelo anterior, mantendo apenas os… parafusos, reza a história:
A caixa fabricada em várias camadas de madeira laminada é moldada à pressão e terminada atrás com uma longa ‘coluna vertebral’ em metal, onde é fixado o filtro divisor;
A intricada estrutura interna Matrix é agora reforçada com placas de metal, assim como o interior do painel frontal e também o tampo superior, forrado a pele natural, onde assentam as ‘turbinas’ dos altifalantes de médios de suspensão flutuante (Continuum Cone FST) e agudos (cone de 25mm com vaporização por pó de diamante); e ainda a base, com o metal a eliminar vibrações do tubo inferior de ventilação reflex;
A ‘turbina’ do tweeter fabricada de um peça sólida de alumínio e mais longa assenta na ‘cabeça’ dos médios sobre separadores de silicone;
Mas a inovação mais radical é a substituição da ‘aranha’ de centragem convencional, normalmente em tecido ondulado, por uma estrutura fina, aberta e flexível, designada por ‘biomimética’, que cumpre a função de centragem sem constituir um obstáculo para o fluxo de ar.
Do estado sólido às válvulas
Na linha do que já sucedia com as D3, as D4 não são 'pêra-doce' para alimentar, com os parâmetros de sensibilidade, impedância e fase a aconselhar a utilização de amplificadores com forte capacidade de corrente, de preferência de estado sólido.
Isto não significa que não possam ser acasaladas com amplificadores a válvulas, como sucedeu com as 803 D4 e os VAC, no Auditório 2 da UAE, já lá vamos.
Boulder 'overkill'
Por outro lado, Miguel Carvalho também não precisava de ter exagerado ao optar por um Boulder 3060 de 150 mil euros (!) como partenaire das 801 D4. Mas isso até foi bom, porque assim fiquei a saber o que elas realmente valem – e valem muito!
Audição preliminar
Claro que isto não é um teste técnico, apenas uma ‘audição preliminar’. Assim, confirmo que tudo o que eu escrevi há 20 anos sobre as Nautilus 801 se aplica ‘ao quadrado’ às novas 801 D4.
Pouco mais tenho a acrescentar, a não ser que os leitores que vivem no Porto não devem perder a oportunidade para as ir ouvir nas Ultimate Sessions, marcadas para 29 e 30 de Outubro, na loja da Invicta.
Os diamantes são eternos
Tendo como meu anfitrião Rui Calado, ouvi música variada, num programa que abriu com a faixa de demonstração (drums and bass) que reproduzo no vídeo acima.
De preferência, oiçam o som através do vosso sistema ou com auscultadores, a nível elevado. Prestem atenção ao ataque, controlo e impacte dos sons de percussão.
Nota: Neste como em todos os outros vídeos desta reportagem, a imagem e o som foram gravados em separado, tendo sido utilizado um gravador digital a 96/24, colocado cerca de um metro à frente da sweet spot para captar o som direto das B&W 801 D4. Como é óbvio, o som é meramente ilustrativo e não representativo do som real que aconselho a experimentar ao vivo.
O vídeo não foi escolhido pela qualidade do som, mas pela surpresa de ouvir Tom Jones, himself!, esse mesmo, o que canta Sex Bomb, a cantar blues com sentimento, acompanhado por Jeff Beck à guitarra elétrica.
O disco foi gravado nos estúdios Abbey Road, em Londres, que utilizam exclusivamente colunas B&W 801 para a monitorização, daí que Rui Calado o tenha proposto como curiosidade.
Auditório 2: B&W 803 D4 com amplificação VAC
O sistema em demonstração no Auditório 2 da UAE girava à volta do modelo 803 D4, que é uma versão em menor escala das 801 D4, e também mais 'acessível' (20.000 euros, só as colunas, claro!). Marcas:
Há quem diga que o dinheiro não paga a felicidade do audiófilo, que é tudo uma questão de exibicionismo, no estilo ‘o teu é maior do que o meu’. Basta comparar estes dois sistemas para perceber que, infelizmente para quem não o tem, o dinheiro é muito importante no território da audiofilia.
Significa isso que o conjunto 803 D4/VAC não se recomenda? Nada disso. Se comparar os vídeos acima com os que publicamos abaixo, a diferença não parece grande. E, de facto, até nem é. Mas, para glosar uma frase publicitária: não é a mesma coisa.
Ditadura da Boulder
Com quatro válvulas KT88 por canal (em modo bridge) os VAC conseguiram ‘sacar’ graves incríveis das 803 D4. Mas uma coisa é o poder, outra é a autoridade geral. Que, no caso do Boulder 3060, é… ditatorial!
Mas como eu sou democrata (e pobre) já ficava contente com umas 803 D4…Ora, oiçam lá se eu não tenho razão...
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