Para dizer a verdade, a primeira vez que ouvi as Acapella foi, de facto, no Highend Show, mas em Frankfurt, quando o certame se realizava ainda no hotel Kempinski, sob o lema ‘hifi among the trees’, e se assemelhava mais a uma tertúlia de audiófilos, quando comparado com a actual ‘feira gigante’ do MOC, de Munique.
Depois, passei a segui-las invariavelmente na CES, de Las Vegas, porque as ‘cornetas coloridas’ ficam sempre bem na fotografia (ver galeria fotográfica no final do artigo) e os tweeters de plasma têm o toque misterioso (e maravilhoso) que ajuda a compor histórias, numa altura em que, então no DN, eu ainda tinha a secreta esperança de converter os infiéis, incluindo os meus editores ignorantes destas coisas do highend, para quem um sistema da Pioneer e um plasma da Sony era atingir o graal audiovisual.
Recentemente, quando soube que a Exaudio, de João Pina, uma pequena empresa que representa grandes marcas, tinha juntado ao seu portefólio a icónica Acapella Audio Arts, fui ao baú de recordações buscar um artigo que tinha publicado no DN, ilustrado com uma foto minha das Acapella Triolon, que publiquei em editorial aqui.
Hificlube e Exaudio são vizinhos
As instalações da Exaudio, na Rua de Braga, Lote 1. Loja Esq.ª, no Pai do Vento, em Alcabideche, onde eu nasci e ainda moro, ficam ali mesmo ao pé do Colégio Amor de Deus, que os meus filhos frequentaram.
Sempre achei irónico que o Hificlube.net e a Exaudio não tivessem uma relação mais próxima, dada a proximidade, passe a redundância. Pois esta questão foi agora ultrapassada, depois de um encontro com João Pina, pelo que as marcas representadas pela Exaudio: Acapella, Acoustic Enery, Audio Note, Bryston, The Chord Company (cabos), Densen, Loricraft Audio, Merging, Perreaux, Stax, entre outras, vão passar a ‘ouvir-se’ mais aqui pelas bandas do Hificlube.net.
Acapella La Campanella
João Pina confessou-me que optou por encomendar o modelo ‘La Campanella’ (sino pequeno, em italiano), porque são as Acapella de corneta mais pequenas, logo têm o tamanho (e o preço: 21.172 €) ideal para as salas típicas dos audiófilos portugueses, além de serem mais fáceis de instalar no showroom da Exaudio, para fins de audição e demonstração.
Ao contrário de outros distribuidores nacionais, a Exaudio não tem ainda um auditório dedicado acusticamente tratado, tendo as La Campanella sido colocadas num espaço comum, como, aliás, o irão ser na sala-comum da vida real, com tectos falsos e amplas vidraças, que afectam sobretudo a percepção do grave, ao deixá-lo ‘escapar’ para o exterior, conforme João Pina teve o cuidado de me colocar de sobreaviso antes da audição formal.
A minha vasta experiência, no entanto, permite-me ‘ouvir’ para lá do que é audivelmente aparente, e o meu cérebro ‘reconstruiu’ assim o som 'integral' com base na actual performance das La Campanella e nas múltiplas referências de audição de outras Acapella, incluindo, claro, ‘La Campanella’, em outro tempo e em outro lugar.
Não foi assim difícil ‘ignorar’ o que estava ‘a mais’ (e que eu sei por experiência que ‘não está lá’), nomeadamente uma ou outra ressonância ou efeito de reflexo secundário); e ‘recuperar’ o que estava ‘a menos’ (e que eu sei também que ‘está lá’), refiro-me ao grave abaixo dos 50Hz.
Put a little blue in everything you do
Mas deixem-me primeiro apresentar ‘La Campanella’. Trata-se de uma coluna híbrida, composta por uma corneta híper-esférica invertida e uma caixa de graves dinâmicos, com 4 altifalantes de 6,5 polegadas.
A corneta de 450 mm em azul forte (já as vi em amarelo, vermelho, creme e outras cores igualmente fortes), assenta sobre uma elegante caixa de graves com 130 x 27 x 53, e tem na ‘garganta’ uma membrana quase sem massa (0,3 gr) que cobre todas as frequências entre os 600Hz e os 25kHz, suportada pelo altifalante de médio-grave superior, ao qual é permitida uma maior sobreposição para dar apoio à primeira das quatro oitavas da responsabilidade da corneta. Por este preço, não seria de esperar a integração de um tweeter de plasma. Para isso vai ter de subir mais alto nas gamas: de preço e de frequência.
O que isto significa é que toda a gama média-alta, sobretudo na banda entre 1 e 4kHz, na qual o ouvido humano é mais sensível, é reproduzida pela mesma unidade (single point source), garantindo coesão, estabilidade, claridade e focagem, com a inerente precisão da imagem estereofónica e uma notável velocidade de resposta a transitórios.
O formato não-concêntrico e parcialmente convexo da corneta (ver foto) está patenteado e foi concebido para contrariar o ‘efeito de corneta’, o que pode parecer um paradoxo, mas pretende-se assim eliminar a coloração conhecida como de projecção de ‘mãos postas’, que introduz uma dureza artificial no som do tipo megafone, aqui totalmente ausente.
Sendo embora uma ‘corneta’, La Campanella não atinge os habituais +100dB de sensibilidade, ficando-se pelos 93dB, para permitir uma melhor integração com as unidades de médio-graves, pelo que João Pina optou por as alimentar com um poderoso Bryston 4B, de 300W/8ohm (8.603 €), estando os Air Tight a válvulas expostos apenas para a fotografia.
Audição crítica
A primeira sensação marca-nos logo com a excelência da diferenciação tímbrica: instrumentos de sopro com timbres próximos nunca se confundem, mesmo quando integrados na complexidade harmónica de uma orquestra. O mesmo se pode dizer dos instrumentos de cordas e de percussão, embora esta característica seja mais marcante na área de trabalho da corneta.
Oiça-se, por exemplo, o Stradivarius de Isabelle Faust (Haydn) em diálogo com outros instrumentos de cordas de época. Ou faça-se um comparativo curioso de Recondita Harmonia (Tosca), cantada por Domingo, Carreras e Jonas Kaufman. São todos tenores. Mas são todos diferentes. No tom, no timbre e na personalidade vocal.
Depois concentrei-me na claridade da dicção e na inteligibilidade do discurso. I’m Confessing ('Dream with Dean'), na voz de Dean Martin, que mesmo mal tratada a uísque e tabaco, me permitiu seguir palavra a palavra, fonema a fonema:
I’m confessing that I love you
Tell me, do you love me too?
I’m confessing that I need you
Honest I do, need you every moment
In your eyes I read such strange things
But your lips deny they are true
Idem com Jacintha, cantando Lush Life, um clássico audiófilo. Até é possível ‘descortinar’ no sotaque que Jacintha não é americana, mas vagamente asiática (de Singapura). Seguiu-se Nat King Cole em ‘At Last’, embora a minha versão preferida seja a de Lou Rawls. E um pouco de Al Jarreau para provar que La Campanella também tem ‘funk’ nas veias, e um ritmo contagiante.
Passei por Boz Scags para ouvir até onde ‘descia’ Thanks To You. E foi só aqui que senti a falta de um pouco mais de profundidade no grave, pelas razões já expostas acima, o que re-confirmei com um excerto de um Adagio de Saint Saëns, com o órgão a pedir um pouco mais de poder e corpo, como pano de fundo de uma Filarmónica de NY, dirigida por Bernstein, excepcionalmente bem desenhada na tela ampla e profunda da imagem estereofónica.
Se é adepto e amante de ‘cornetas’ tem aqui mais uma excelente opção de audição pessoal antes de qualquer compra que se pretende sempre judiciosa e rigorosa.
Passe pela Exaudio para pôr ‘a little blue in everything you do’. Quanto mais não seja, vai enriquecer o seu álbum de audições memoráveis com La Campanella.
Galeria de fotos de arquivo do Hificlube
Para mais informações:
Tel: +351 21 4649110
Tlm: +351 91 7600209