A Hegel é uma empresa nórdica, norueguesa para ser mais preciso, pelo que os seus produtos não são baratos. Não é que sejam caros, nós é que ganhamos pouco…Mas eis que, com o H90, a Hegel resolveu dar um bodo aos pobres, oferecendo aos consumidores o fruto do casamento entre o H80 e o Röst (ver teste aqui), por apenas 1700 euros.
O H90 é o fruto do casamento entre o H80 e o Röst, por apenas 1700 euros
Não vem vestido de branco como o Röst, do qual também não recebeu a herança genética da arquitectura Control4; nem tem o painel frontal em metal como o H80. Mas, naquilo que interessa realmente, é um amplificador integrado cuja secção de amplificação, por si só, mark my words, vale o dinheiro que pedem por ele. E tem entrada para auscultadores! E que bem que ela funciona. Sacou um grave tenso de um par de Pryma, que são algo enfáticos no baixo; e não vacilou perante as dificuldades colocadas por um par de Hifiman HE1000, tanto em termos de potência disponível como de equilíbrio tonal.
Oferece ainda como extras, nada despiciendos nos tempos modernos, um DAC interno e ‘networking’ com funcionalidade ‘streaming’ para o poder ligar à rede. Ou, de forma mais básica, via Apple Airplay com um iPad ou iPhone. A vantagem do AirPlay é o Plug&Play. Rima e é verdade. Para o potencial comprador do H90, é quanto basta. Um smartphone e a Spotify (eu prefiro a Tidal). E o som resultante é excelente. Claro que eu prefiro sempre a ligação física, mas o ‘airplay’ aqui não é apenas ‘ar’, tem conteúdo musical.
O controlo remoto é básico, embora tenha a particularidade de comandar fora da sua jurisdição, e o H90 não tem uma app própria. Contudo, com um iPhone e a app Linn Kinsky (que é grátis mas podia ser mais user friendly) tem um ‘media player’ funcional (para Android sugerem o Bubble UPnP) para aceder a uma biblioteca de ficheiros em HD num NAS externo.
O material tem sempre razão?
Com o H90 ligado ao PC via USB, já tive mais dificuldades. O manual é bonito e ecológico mas não é lá muito informativo. Só diz que não é preciso driver – nem mesmo com PC/Windows - e que funciona bem com ficheiros em CD quality, mas que pode ter algumas limitações com 24-bit.
Quando ligado via USB, o ‘sound card’ do H90 substitui automaticamente o do seu computador, coadjuvado pelo controlo remoto, pelo que todos os sons que passa a ouvir: do You Tube, do Skype ou até do Windows, passam a ser reproduzidos pelo amplificador/colunas/auscultadores.
Mas lá consegui ouvir ficheiros que tenho armazenados no meu Synology até aos declarados 192/24. Isto com o media player da Groove Music, com o JRiver só funcionou com Kernel streaming a 44/24. Mas não com Wasapi. Com um Mac não há qualquer incompatibilidade, diz-me o Nuno Cristina. Para surpresa minha, reproduziu ficheiros DSD64, quando o próprio fabricante diz que não é compatível. Eu acho que, quando se instala o H90 no PC via USB, ele ‘toma conta do sistema’ e toca tudo, incluindo DSD64 e PCM192, mas à maneira dele, pois a ligação USB surge-me listada no Playback Devices do Windows como ‘SPDIF Interface’ TE7022 (?), em vez da denominação genérica speakers, e com o limite de 96/24 na configuração ‘Advanced’.
Uma vez mais, o som resultante é de grande qualidade, eu diria mesmo de surpreendente qualidade, apesar da aparente trapalhada informática. O som do H90 é indiferente aos ‘dígitos’, só lhe interessa a música.
Quando o comprar, informe-se bem na Ajasom como instalar o H90 para obter o melhor resultado com USB e Ethernet, pois com o AirPlay é canja. Ou melhor: peça ao Nuno Cristina para fazer a instalação. Eu admito que fiquei um pouco ‘às aranhas’. Mas como se dizia na tropa, quando eu por lá andei, na Arma de Transmissões: ‘o material tem sempre razão. Mea culpa, pois.
SynchroDAC
A secção de DAC tem as tradicionais entradas S/SPDIF coaxial e óptica (3X) e USB. Aqui um aparte: a Hegel utiliza o circuito ‘SynchroDAC’ que, como o nome indica, não é do tipo assíncrono, como o são quase todos hoje em dia, para eliminar o ‘jitter’. E isto porque os engenheiros da Hegel defendem que os circuitos assíncronos eliminam apenas parte do ‘jitter’ e transformam o resto em desvios de amplitude, que ainda é pior. Com um bom relógio interno (Direct Master Clock), o circuito síncrono é, segunda a Hegel, mais eficaz, baixa a distorção e melhora a resolução.
Integração orgânica
Para aprofundar a análise auditiva do DAC, sem o contributo da secção de amplificação, liguei o H90 a um amplificador externo via saídas analógicas variáveis, e também a um par de colunas activas, mas senti que se perdia o som orgânico do conjunto integrado.
…a resolução não é tudo, a emoção também conta
O DAC do H90 não é compatível com MQA e a Hegel recusa-se a entrar na corrida dos kHz. Mais de 90% da música disponível em suporte físico ou via ‘streaming’ é a 44/16 e aqui o H90 dá cartas. De qualquer maneira, os ‘downloads’ HD estão pela hora da morte (e a morrer mesmo, talvez por isso) e a maior parte são aldrabices ‘upsampladas’ de originais a 44/16.
Claro que eu tenho uma boa colecção de áudio HD, incluindo DSD256. Mas eu sou piloto de testes, faz parte do meu trabalho como ferramenta. A resolução não é tudo, a emoção também conta. E o H90 tem emoção para dar e vender. Para quê, pois, andar a discutir o sexo dos anjos, quando o que se ouve com o H90 já é ‘angelical’?
Som natural
A Hegel gaba-se de que a naturalidade do som dos seus amplificadores se deve à utilização de tecnologias desenvolvidas ‘em casa’ na última década. Como, por exemplo, os duplos circuitos de amplificação e alimentação para os andares de ganho de tensão e corrente (DualAmp/DualPower) e aquilo a que chamam SoundEngine: um sistema de cancelamento de erros do tipo ‘feedforward’, uma evolução do originalmente concebido pela Quad, que compara o sinal de saída com o sinal de entrada e corrige desvios, eliminando assim a distorção de transição da Classe A/B, obtendo-se as vantagens da Classe A sem as desvantagens da dissipação excessiva de calor.
Marketing à parte, a verdade é que a impedância de saída dos Hegel (de todos eles) é tão baixa – e o consequente factor de amortecimento tão elevado: superior a 2000 – que o H90 é praticamente imune à impedância das colunas, mantendo a linearidade da resposta a todas as frequências e um controlo de grave soberbo.
O H90 é um rei que ‘não faz fraca a forte gente’, faz fortes mesmo as colunas mais fracas
Não é por acaso que pode ligar um H90 a um par de colunas dez vezes mais caras - mesmo as que se fazem difíceis como divas caprichosas - que ele nunca dá parte de fraco. Ou seja, é como um rei que ‘não faz fraca a forte gente’. Pelo contrário: ‘faz fortes mesmo as colunas mais fracas’.
Em audições domésticas subsequentes, o som que consegui extrair de dois pares de modestas Sonus faber Concertino de diferentes épocas, deixou-me ao mesmo tempo intrigado e encantado.
Notas de audição
O H90 cumpriu com rigor todos os itens da minha cartilha audiófila, superando as limitações das suas parceiras de ocasião e as próprias limitações da sua categoria:
- potência subjectiva muito acima dos 60W especificados, com controlo total do processo musical em curso, sem perda de souplesse dinâmica e total ausência de grão ou artificialidade electrónica;
- resolução orgânica com detalhes bem integrados no corpus musical, de talhe doce e prenhe de nuances sem o excesso de sharpness que, nas imagens fotográficas digitais, por exemplo, vem sempre acompanhada de um halo desagradável;
- integração perfeita das três bandas, tornando despicienda a análise parcelar de graves, médios e agudos, embora eu não resista a enaltecer aqui a notável qualidade dos baixos, não só ao nível do corpo mas sobretudo da informação e ritmo;
- som relaxado e relaxante, apresentando-se com ‘cores’ saturadas, fixas, sólidas, de textura verosímil, que conferem elevado grau de realismo à reprodução das vozes e, bem assim, de todos os instrumentos acústicos;
- imagem estável e bem dimensionada, simultaneamente bem focada, sem ‘recuo’ ou frontalidade aparente, e expansiva: aquém, além e para lá do limite das colunas.
Conclusão
Se procura um amplificador integrado até 2500 euros (o H90 só custa 1700), não deixe de o colocar na sua short list de audições obrigatórias.
O Hegel H90 é um grande amplificador integrado que suplanta com distinção a sua categoria de potência e preço. A performance da secção de amplificação, por si só, justifica os 1700 euros. O DAC e as novas funções de networking são oferta da casa…