A Lindemann Audiotechnik é uma empresa tecnológica alemã, com 25 anos de experiência, que produz produtos de nicho para reprodução/conversão de sinais áudio de alta resolução, e é agora distribuída em Portugal pela Imacustica.
O seu produto mais conhecido no mundo audiófilo é o famoso e ultrapremiado Musicbook, agora nas versões Source (Streamer) e Power (NCore).
A Lindemann foi, aliás, a primeira empresa no mundo a desenvolver um DAC com USB, depois de ter criado, há 20 anos, o primeiro conversor USB/SPDIF, que permitia ligar um computador a um DAC externo.
Digamos que a Lindemann sabe o que faz, quando se trata de processar os sinais digitais a partir de suportes físicos (CD), ficheiros de alta resolução e streaming.
Lindemann abre o livro
Mas o Musicbook Source, embora não custando a fortuna que se pede hoje por qualquer produto dito highend, não está ao alcance de todas as bolsas (3.280,00€).
Recentemente, a Lindemann resolveu colocar todo o seu know-how na área digital numa linha mais acessível, sob o conceito genérico ‘Audiophile Essentials’, criando assim a Limetree, uma coleção de deliciosas miniaturas (no tamanho, que não na tecnologia de ponta), montadas em caixinhas quadradas (10 x 10 x 4 cm) de alumínio sólido, com apenas 300 gramas de peso, sendo a gama composta por: andar Phono (595,00€), USB DAC (795,00€), Headamp (595,00€), Bridge (745,00€) e Network Streamer (895,00€).
Limetree Network
Nota: o teste do Limetree Network serviu de pretexto para a primeira apresentação no Hificlube de um produto em vídeo
É sobre este último modelo que nos debruçamos hoje, agora por escrito, depois de prolongadas audições e testes exaustivos às características e funcionalidades declaradas e confirmadas, com apenas uma pequena diferença por excesso e outra por omissão. Read on, please.
Beber chá em pequenino…
O logótipo da Limetree é, como o nome indica em inglês, uma delicada folha da árvore de tília. Para nós, é apenas uma folha da qual se faz chá para os nervos; para os alemães a tília (Lindenbaum, em alemão) é uma árvore sagrada que, segundo a mitologia germânica, tem extensos poderes mágicos e simbólicos.
A tília é também a árvore do amor (à música sob formato digital, neste caso) e da justiça, que é o que eu espero fazer-lhe nesta análise crítica.
Streamer, DAC, Headamp, Upscaler: 4 em 1
Aparentemente, a folha de tília deu poderes ‘mágicos’ a esta caixinha, pois é, ao mesmo tempo, um streamer, um amplificador de auscultadores, um DAC-USB (PCM 24-384kHz e DSD256) e um Upsampler (até DSD256). Se já tem um HeadAmp/DAC de qualidade, e não quer prescindir dele, opte pelo Bridge e poupa 150 euros.
Para o ajudar a dominar todas estas ‘artes’, o Network utiliza dois DAC Asahi Kasei (AK4452), em modo diferencial (duplo-mono) e um re-sampler AK4137 com 32 bits de resolução e 180 dB de dinâmica. Todos os sinais são sincronizados (re-clocking) por um MEMS FemtoClock para ‘limpar’ o jitter antes de serem enviados para os conversores.
… a qualidade de som da Limetree Network é superlativa, ao nível mesmo de modelos full size muito mais caros...
A Pro-ject tem no mercado ‘caixinhas’ semelhantes, até mais baratas, mas a qualidade de som da Limetree Network é superlativa, tanto com ligação LAN como WLAN, sobretudo esta, surpreendentemente. Eu diria mesmo que está ao nível de modelos full size muito mais caros. I kid you not! Também funciona muito bem com Bluetooth, mas como se diz em Brooklyn: it is what it is…
Atar e pôr ao fumeiro
Instalar o Network é tão simples como dar (há quem diga tirar...) a chupeta ao bebé. Primeiro instala a app da Lindemann (grátis) disponível para Apple e Android no seu telefone ou ipad; Depois liga o Network à corrente de setor, com a fonte de alimentação fornecida. Com o cabo Ethernet também fornecido, liga-o ao seu router.
Agora puxa o pequeno toggle switch para cima num gesto rápido, e já está. Nota: se deixar o botão em cima mais de 3 segundos ativa o upsampler DSD; se for durante 10 segundos faz reset ao sistema.
Pode instalar também uma pen com música na entrada USB, ou ligá-la por cabo a uma hard drive externa. Depois é só seguir o caminho das pedrinhas na App.
Ouvir rádio ou podcasts (airable), navegar na Tidal, Spotify, Qobuz ou Deezer (se já aprendeu a contornar o bloqueio geográfico com um VPN) ou, melhor ainda, navegar na Tidal, ou no seu NAS (desde que ligado à sua rede doméstica via router), pelo menos com a aplicação Roon Labs (Roon Ready certified), porque não consegui aceder diretamente ao NAS via App.
Também se pode ligar uma drive externa CD/ROM via USB, como a Apple Superdrive, controlando depois o leitor com a App. Nota: não tenho disponível uma superdrive pelo que não posso confirmar se funciona bem.
O Limetree Network é uma verdadeira caixinha de jóias musicais que pode ligar aos seus auscultadores, ou a um par de colunas ativas, até ao prévio ou amplificador integrado do seu sistema de som.
BitPerfect ou DSD?
Os ficheiros áudio podem ser reproduzidos na amostragem original (bitperfect), identificada pela cor do led SR (sampling rate), tanto em PCM como DSD:
Verde PCM 44,1 / 48 kHz
Cyan PCM 88.2 / 96 kHz
Azul PCM 176.4 / 192 kHz
Branco PCM 352.8 /384 kHz
Amarelo DSD 64
Laranja DSD 128
Lilás DSD 256
Em alternativa, pode prescindir de conversão bit perfect e optar por fazer upsampling para DSD256 (led DSD amarelo), mas apenas de sinais PCM (os sinais DSD mantêm a amostragem nativa, mesmo com o upsampling ativado).
Por outro lado, a função de upsampling de PCM para DSD256 só é efetiva a partir de 48kHz, sendo de DSD128 com amostragem Red Book (44,1kHz), isto com operação controlada por Roon. Não que o gato vá às filhós por aí, que são, aliás, todas deliciosas.
MQA ou DSD?
Tal como a Chord, a Lindemann não acredita no MQA. Contudo, pode utilizar o Network via Roon (ver foto) como renderer da conversão MQA (first unfolding) operada na origem pela própria Tidal (até um máximo de 96Khz).
Em alternativa, a Lindemann oferece a possibilidade de upsamplar todos os sinais PCM para DSD128/256, mesmo os de origem MQA depois de descodificados para PCM pela Tidal. E pede meças: o que é melhor? MQA ou DSD256? Já lá vamos.
Test-drive
Entendo que um teste deve ser feito em duas fases, que podem ser distintas ou simultâneas: primeiro há que confrontar o produto com as expectativas criadas pelo fabricante; depois confrontá-lo com as expectativas que nós próprios criámos sobre ele. O produto será tanto melhor quanto mais se aproximar de ambas. Finalmente, compará-lo com a concorrência na sua categoria de preço.
O Limetree Network passou com distinção todas as fases, e não conheço nenhum streamer tudo-em-um, que faça o que ele faz – e da maneira como o faz - por menos de mil euros.
O que é nacional, é bom
Antes de me sentar a escrever esta ‘review’, digamos assim, para parecer cosmopolita, fui ler algumas das análises de ilustres colegas da imprensa internacional, disponibilizadas na página da Lindemann, quase todas em inglês, algumas em ‘inglanês’, e concluí que se continua a utilizar muito a técnica do 'horóscopo', no qual o destino já está traçado à nascença.
Ou seja: limitam-se a descrever com mais ou menos pormenor o Network e a enumerar as suas características técnicas e funcionalidades, sempre com base no copy-paste das informações do fabricante, motivo porque parecem todas iguais, seguindo-se o relato das audições (aqui já há alguma variedade, porque os gostos musicais são diferentes).
Mas, ao contrário do Hificlube.net, nenhum deles se deu ao trabalho de verificar, por exemplo, se o Network faz streaming de PCM384kHz via WLAN, isto é, por Wi-Fi (sem cabo), apenas porque no manual diz que não vai além de 192kHz. E não é que faz mesmo! E que suporta também DSD256 (aqui durante pouco tempo e com alguns drop-outs).
Ora, isto é importante, porque, se a memória não me falha, não há nenhum streamer deste preço que faça isto, pelo menos com esta qualidade de som, o que só prova a validade da plataforma de streaming 4.0 desenvolvida pela Lindemann.
LAN ou WLAN?
Para ligar por WLAN (Wi-Fi HD), primeiro tem de o ligar por cabo, para a App Lindemann o reconhecer. Depois, pressiona o botão WPS do seu router até começar a piscar. Com o bico de uma caneta, faz o mesmo ao botão correspondente no painel traseiro do Network. Seguem-se umas ‘piscadelas de olho’ entre eles e dá-se o ‘engate’: pode retirar o cabo de rede.
Durante o teste, tive apenas dois pequenos incidentes de incompatibilidade informática, quando o Roon deixou de reconhecer o Network, rapidamente resolvidos, e nenhum deles foi com WLAN!...
Nota: Claro que a sua rede doméstica tem que estar à altura da plataforma de streaming: eu sou servido pela rede de fibra da MEO 500 Mb apoiada na vertente Wi-Fi por uma rede mesh composta por vários módulos Devolo Magic 2.0 (cortesia de António Eduardo Marques - AEM Press).
Aliás, nem se deram ao trabalho de confirmar sequer se o Network reproduz via LAN PCM384 kHz e DSD256 bitperfect, apenas se limitaram a divulgar que isso vem escrito no manual. Nós verificámos, e podemos garantir que reproduz ambas as amostragens, de facto – e bem! Assim, como verificámos que não reproduz DSD512, ao contrário do MusicBook, que queremos testar já a seguir, depois deste delicioso aperitivo.
Do mesmo modo, ninguém comentou que o upsampling para DSD256 não se aplica a ficheiros DSD64 e DSD128 (DSD é sempre reproduzido na amostragem nativa, e bem).
Modo DSD ou PCM?
Outra das questões, levantadas por um dos meus ilustres colegas distraídos, é a de que é pena só ser possível comutar entre bit perfect/dsd upsampler no toggle switch, o que não é verdade. Basta entrar na aplicação e ir a settings/device settings/dac mode: PCM/DSD, o que facilita muito a comparação A/B sem ter de se levantar da sweet spot. C’mon, guys, do your homework, will you?...
Será o Limetree Network o dCS Bartók dos pobres?
Aqui chegado, dou comigo a pensar que confrontei injustamente o liliputiano Limetree Network, com o mesmo grau de exigência que apliquei ao dCs Bartók, que custa 15 000 euros! E como ele se safou bem, não dando parte de fraco…
O circuito de amplificação utiliza um módulo de Classe A, baseado num Opamp, com excelente qualidade de som, e tem potência q.b. para a maior parte dos auscultadores.
Ao fim de umas horas de audição, com os meus Hifiman HE1000, esqueci-me completamente que aquele som vinha de uma caixa tão pequena e tão barata…embora, claro, com o cursor de volume da App sempre a trabalhar no último quarto do percurso (+ de 75 até 90 e às vezes 100!), pois os ‘planares’ são pouco eficientes e exigentes com a alimentação eléctrica. Ainda bem porque todos os controlos de volume digital funcionam subtraindo bits. Quanto menos precisar de 'subtrair', melhor soa…
Ouvi ainda o Network a atacar um par de colunas ativas da Focal, e também ligado a um sistema composto por amplificação Naim e colunas Sonus faber Concertino.
Diz-me como soas, dir-te-ei quem és…
E como soa o Limetree Network? Não tão bem como o Bartók; quase tão bem como o conjunto Chord Hugo 2/2Go, que custa o triplo.
E muito melhor que os modelos concorrentes da iFI e da Pro-ject. O som do Network tem menos grão no agudo, mais textura nos registos médios e mais estrutura nos registos graves. De uma maneira geral, é ao mesmo tempo mais sólido e mais natural. E é obviamente mais dinâmico, e muito estável mesmo na presença de situações complexas.
Reproduz muito bem vozes, solistas ou corais, com boa diferenciação tímbrica e espacial, é harmonicamente capaz, ritmicamente desenvolto, com um ‘voicing’ neutro e bem equilibrado.
E, já que entrámos nesta catadupa de advérbios de modo, soa particularmente bem com ficheiros de alta resolução nativa.
Se DSD256 upsampling é mais importante para si que MQA com desdobramento total (full unfolding) MQA, this is a no brainer, ou seja, não precisa de pensar mais: compre.
Chá de tília com ou sem açúcar?
Finalmente, a pergunta de um milhão de dólares: soa melhor em modo bit perfect ou com upsampling para DSD256? Eu podia safar-me dizendo que é uma questão de gosto mas, de facto, não é só isso.
Já vimos que é fácil fazer uma comparação A/B, bastando para isso comutar entre PCM e DSD, utilizando o toggle switch ou, preferencialmente, a App da Lindemann.
Há um ligeiro hiato, com perda de som de alguns segundos, na mudança dos circuitos de conversão, mas o principal obstáculo é mesmo a diferença de nível: DSD soa um tudo nada mais baixo. Para fazer uma comparação justa tem de subir um pouco o volume, quando comuta de PCM para DSD (e vice-versa).
A diferença não é dramática – mas existe e, quando a tiver percebido, vai ouvi-la sempre. Mesmo com os olhos fechados. Ao princípio, parece não ser mais que a diferença que se ouve entre ‘fase absoluta’ e ‘fase relativa’ (há quem prefira o termo ‘polaridade’). Também há quem a oiça sempre, enquanto outros acham que é uma não-questão. Se assim não fosse, todos os pré-amplificadores teriam obrigatoriamente um comutador de ‘polaridade’, e são mais os que não têm…
Depois, vai começar a perceber que o som de PCM, além de soar mais alto, soa também mais focado e sólido ao centro, o grave tem mais impacto e recorte; e as vozes têm mais projeção e presença, tanto mais quanto mais alta for a resolução.
No modo DSD256 (e refiro-me à reprodução de PCM com upsampling, e não a ficheiros com resolução nativa, que soam sempre fantásticos de naturalidade), o palco abre-se em largura e profundidade, a boca do palco recua um pouco; e as vozes e instrumentos solistas soam mais laid back, com mais ‘distanciamento social’, mas também mais ‘naturais’, menos… ‘hifi’. O grave perde recorte mas ganha entrosamento; e o agudo torna-se mais doce e delicado.
Permitam-me uma analogia fotográfica: é como mudar de uma lente de 35mm para outra de 24 mm. Ou seja, passar do retrato aberto para a paisagem ampla.
Arrisco propor uma regra genérica: utilize PCM para a música em geral e DSD256 para a música clássica. Até ao dia em que, como Ulisses, vai ficar tão enfeitiçado pelo canto das sereias em DSD256, que as cordas do PCM já não vão poder segurá-lo ao mastro do navio digital…
Para mais informações: IMACUSTICA