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Os SR1b são únicos: na tecnologia de ribbon, no design open-baffle e na qualidade de som. Ouvi-los é uma obrigação de todos os audiófilos. Até agora, desde que cumpridas algumas condições de audição e garantidas a compensação de impedância e de resposta em frequência, são dos melhores auscultadores que já ouvi – se não mesmo os melhores em alguns aspetos: transparência, velocidade, microdinâmica e palco sonoro.
Esta foi a análise mais difícil que já escrevi sobre auscultadores. Mas o prazer de os ouvir obriga-me a partilhar a experiência com os meus leitores fiéis, que confiam há longos anos na minha capacidade para descrever o que oiço de forma que eles próprios sintam que os estão a ouvir.
Os Raal Requisite SR1b são diferentes de todos os outros auscultadores que eu já testei, ou ouvi. Tanto podem ser soar horríveis à saída da caixa, como sublimes, se cumprirmos todas as condições associadas com a amplificação, os indispensáveis adaptadores, a igualização e ângulo de colocação junto às orelhas. Atenção: junto, não sobre ou em redor das orelhas.
Full-ribbon
Os SR1b reproduzem todas as frequências por meio de uma fita de alumínio praticamente desprovida de massa e tornada condutora, que, modulada pelo sinal, vibra por efeito de um poderoso campo magnético (não os coloque junto a objetos ou superfícies metálicas), tal como sucede com as membranas ultrafinas de mylar da concorrência eletrostática e isodinâmica, ou planar magnética (Stax, Audeze, Hifiman, etc).
Mas, ao contrário destas, que estão fixadas em todo o seu perímetro, de que pode resultar ‘efeito de tambor’, os ribbons verdadeiros estão suspensos apenas nos topos e vibram livres, pelo que a resposta é muito mais rápida. Trata-se de um projeto inovador e distinto da concorrência no mercado áudio.
Este transdutor full-range é assim um verdadeiro ribbon que reproduz todas as frequências (30Hz-30kHz), ao contrário dos oBravo (híbridos), que dividem o espetro de frequências por dois transdutores diferentes: uma variante de ribbon (AMT) para os médios e agudos e um altifalante dinâmico para reproduzir os graves; e dos Hedd, que utilizam um único ribbon AMT full-range.
Open-baffle design
Por outro lado, os SR1b não têm os tradicionais auriculares com almofadas, sejam eles do tipo aberto ou fechado, para envolver ou colocar sobre as orelhas.
Os ribbons dos SR1b, que são facilmente substituídos pelo próprio utilizador, em caso de avaria, e custam apenas 150 euros cada, estão montados numa estrutura de metal e carbono, suportada por uma cabeceira de cabedal, com a respetiva mola de aço de ajuste lateral suave, e ficam suspensos junto às orelhas sem nunca lhes tocar, apenas com o apoio de pequenas espumas forradas a cabedal e colocadas longitudinalmente sobre o maxilar e lateralmente sobre as têmporas.
Os auriculares (se é que lhes podemos chamar assim) podem rodar sobre um eixo, de modo a ficarem paralelos às orelhas ou num ângulo até 90º (já vamos ver porquê).
Duas pequenas abas laterais em carbono funcionam como baffle para evitar (sem sucesso) o cancelamento precoce das frequências baixas, o que só seria possível com umas abas enormes. Os SR1b são assim do tipo open-baffle, e por isso precisam, além de adaptadores de impedância, de adaptadores de compensação de resposta em frequência ou, em alternativa, de igualização paramétrica (já lá vamos também).
Sem almofadas, sem suor
Assim, à primeira vista, parecem uma geringonça acústica que não deve ser levada a sério. Mas a construção é sólida e, quando os colocamos, são extremamente leves (apenas 426 gramas) e confortáveis de usar, sobretudo porque nunca tocam nas orelhas, logo não provocam sudação, mesmo em dias de calor.
Os auriculares devem ficar colocados de molde a que a área central do ribbon fique ao nível dos orifícios auriculares. O ajuste vertical é feito por meio de furos na cabeceira de cabedal, como num cinto. É uma solução algo artesanal e pouco precisa, mas funciona. Uma segunda correia de cabedal é colocada na nuca para evitar (também sem grande sucesso) que os auscultadores se desloquem quando nos inclinamos para a frente.
Eu retirei essa correia porque me incomodava e não servia para muito, e mantive a cabeça direita q.b., até porque a posição dos auriculares é crítica. Ajuste a posição horizontal das pequenas almofadas sobre as têmporas e o maxilar e vai ficar surpreendido com o resultado sonoro: um pouco (milímetros!) mais para a frente ou para trás, e a tonalidade do som altera-se! Tal como as colunas de som, os SR1b têm uma sweet spot onde tudo soa melhor.
Esqueça o jogging
Portanto, se está apensar fazer jogging com os SR1b, esqueça. E não só por razões mecânicas, também por razões elétricas, pois não pode ligá-los a um telemóvel ou DAC portátil, nem sequer a um amplificador qualquer.
E é aqui que a porca torce o rabo, pois os SR1b custam 3600 euros, e vai precisar de outro tanto para os alimentar convenientemente. Calma, não desista já, porque tudo vai valer a pena e os adaptadores de compensação de resposta vão torná-los mais, digamos, universais, mas nem mesmo assim menos exigentes quanto ao equipamento complementar.
Ao contrário dos atuais auscultadores planar-magnéticos, que até podem ser ligados a telemóveis, os SR1b precisam de ser ligados a amplificadores potentes e capazes de alimentar com corrente elevada cargas de muito baixa impedância.
Curto-circuito
A impedância é de 0,2 ohms! Leu bem: é quase um curto circuito. São como as colunas Apogee Scintilla (1 ohm), que só funcionavam bem com amplificadores Krell. No caso dos SR1b, a SAEQ (de origem Sérvia, tal como a Raal) e a Schiit são os únicos fabricantes que produzem amplificadores para auscultadores capazes de os alimentar sem necessidade de adaptador: o Raal-Requisite HSA1-C “Switch Drive”, created by SAEQ (€5400), que também funciona com auscultadores planar-magnéticos e dinâmicos convencionais, é um deles.
Se os SR1b já soam sublimes com um adaptador de permeio, tremo só de pensar como soarão com uma ligação direta, embora eu ache que o HSA1-C, no fundo, não passa de um amplificador com adaptador de impedância e compensador de frequência integrados, o que vai dar no mesmo.
Nota: o HSA1-C também dispensa o adaptador de frequência no modo SR1 (ver foto).
Ligar os SR1b a qualquer outro amplificador é imolá-lo! Mas não desespere. A Raal Requisite tem uma solução, aliás duas, para este problema: os adaptadores de impedância TI-1a para ligar os SR1b diretamente aos bornes de saída para colunas de um amplificador convencional (min. 100/150W); e o TI1b para ligar os SR1b às saídas balanceadas de um amplificador de auscultadores como o excelente Ferrum Oor (a versão que me foi fornecida pela Ajasom).
Nota: a Ajasom ficou de me fornecer também um adaptador TI1a para eu poder ligar os SR1b às saídas para colunas do meu Rose RS520, que não chegou a tempo da publicação deste artigo. Fica para um Follow-Up, porque a audição dos SR1b é extremamente aditiva. Passo horas a ouvi-los, sem incómodo físico ou cansaço auditivo, e deixei de ouvir os meus Hifiman HE1000. É como uma droga!
Passo horas a ouvir os SR1b, sem incómodo físico ou cansaço auditivo. É como uma droga!
Sushi e Tempura
Há quem oiça – e adore - os Raal-Requisite SR-b1 “ao natural”, isto é, apenas com o indispensável adaptador de impedância, mas sem compensação de resposta em frequência por hardware (“open-baffle compensation barrels”) ou software (igualização paramétrica da Roon, JRiver Audirvana, etc.)
Sinceramente, eu não os recomendo ‘ao natural’. O som é, de facto, ultra-transparente, ultra-rápido, ultra-dinâmico, ultra-detalhado e isento de colorações de ‘caixa’; mas, em termos tonais, a gama média soa esquálida e seca, os agudos excessivamente brilhantes: e o grave é sólido, articulado, ultra-definido, muito tenso, mas pouco extenso e intenso. Eu diria que “sem compensação”, os SR1b soam brilhantes e artificiais. Admito que, ainda assim, todos os outros soam “abafados” e lentos, por comparação.
Mas, tal como no Sushi, a qualidade e frescura dos ingredientes está lá e é inegável, pelo que, se optarmos antes por Tempura, ou seja, por um som “cozinhado” com “open-baffle compensation” (ver foto acima) ou "bem-temperado" por igualização paramétrica, o prazer auditivo é inexcedível na minha vasta experiência com auscultadores.
Aqui ficam algumas receitas:
Nota: O adaptador de impedância é obrigatório em todas as circunstâncias, salvo se utilizar o amplificador HSA1-C (ou o Schiit Jotunheim R). Estas receitas referem-se apenas à compensação de resposta em frequência que, como já vimos, há quem dispense, eu não, e creio que é aqui que residem as diferenças de opinião, maioritariamente favoráveis aos SR1b com compensação.
- A receita de hardware mais rápida e eficaz é a utilização dos compensadores de frequência (“open-baffle compensation barrels”), que me foram fornecidos com os auscultadores. São duas fichas XLR (ou RCA) macho-fêmea, com circuito interno de compensação (ver foto acima), que eu coloquei nos cabos de interligação balanceada entre o DAC Ferrum Wandla e o amplificador de auscultadores Ferrum Oor, ambos com alimentação Hypsos (cortesia da Ajasom).
- A saída balanceada de auscultadores do Oor liga-se à entrada de 32 ohms do adaptador de impedância TI1b (Nota: experimentei com 16 ohms e gostei, mas pareceu-me que colocava o Oor em dificuldades). O sinal para os Raal Requisite SR1b sai depois do adaptador TI1b – e não do Oor. Nota: não há perigo de trocar os cabos porque as fichas são diferentes.
- Com esta solução (hardware) não precisa de se preocupar mais com a igualização, embora para os bass freaks +2 ou 3 dB abaixo dos 60Hz não seja uma hipótese despicienda. Para mim, a compensação por hardware (fichas) é um bom denominador comum para todos os géneros musicais, instrumentos e vozes.
- A receita de software mais simples consiste em introduzir a seguinte fórmula no igualizador paramétrico da Roon, por exemplo. Nota: as soluções de software (igualização) podem dispensar a solução de hardware (adaptadores de frequência). Ei-la:
- Highshelf, Frequency=1254Hz, Q=0.5, Gain=-5dB
- Nota: pode juntar uma pitada de grave a gosto abaixo dos 60Hz: Lowshelf, Frequency=60Hz, Gain +2 ou 3dB.
A igualização é como as cerejas: quando se começa, é difícil parar de comer. Mas aqui vai uma receita Roon um pouco mais complicada:
Como em tudo na vida, há sempre exageros, e alguns audiófilos radicais, propõem a utilização dos SR1b acolitados por um, pasme-se! subwoofer abaixo dos 60Hz, colocado junto aos pés…
De facto, não é impossível, pois os SR1b são do tipo open-baffle, e permitem ouvir tudo o que se passa à sua volta, incluindo um sub, claro. Dizem que é uma experiência inolvidável, mas eu aqui passo. Se pretender experimentar, opte por um sub pequeno com ajuste de fase contínuo: os que só oferecem 0º, 90º e 180º não servem, pois a afinação de fase é crítica.
SR1b + Trio-Maravilha da Ferrum
Ouvi os Raal-Requisite SR1b, durante um período prolongado, tendo como equipamento associado o Trio-Maravilha da Ferrum (Wandla/Oor/Hypsos). Como fonte de música, utilizei o meu PC com JRiver, mas sobretudo o Rose RS520 exclusivamente como streamer, ligado ao Wandla por USB (aguardo o adaptador TI1a para poder ligar os SR1b diretamente ao RS520).
As saídas analógicas balanceadas do Wandla foram depois ligadas ao Oor com os “open-baffle compensation barrels” instalados nos cabos de ligação Kimber Carbon. Neste caso, não utilizei qualquer igualização complementar, porque é assim que os leitores irão provavelmente ouvi-los na Ajasom.
A saída balanceada de auscultadores do Oor atacou depois os SR1b por meio do adaptador de impedância TI1b (32 ohms). Parece confuso, mas funciona maravilhosamente.
Coloquei os SR1b quase sempre paralelos aos ouvidos, pois soam melhor (mais corpo e estrutura) e com mais grave (definido e notavelmente informativo). Mas também os experimentei ligeiramente afastados, num ângulo de 30º, subindo ligeiramente o volume para compensar a perda (imagem mais ampla e som mais difuso, com estrutura mais delicada e menos graves).
São como um sussurro de lábios sensuais, tão perto das orelhas que nos dão um arrepio de prazer.
Que mais posso dizer dos Raal-Requisite SR1b?
- Que desaparecem acusticamente, e ao fim de um tempo já não os sentimos na cabeça (desde que não a incline para a frente para atar os sapatos, claro). Mas não desaparecem fisicamente, porque, estando eu a usá-los a 45º, a minha mulher riu-se e comentou: “Parece que tens guelras…”;
- Que, tendo cumprido todas as condições técnicas acima mencionadas, ouvi-os sozinho, no silêncio da noite, com a porta fechada, porque se ouvem em todo o lado, e achei que são um dos melhores auscultadores que já ouvi – se não mesmo os melhores em alguns aspetos: transparência, velocidade e microdinâmica;
- Que são os únicos auscultadores (e nem falo nos intra-auriculares) que não injetam o som à pressão nos ouvidos, criando uma sensação de opressão: os SR1b, mesmo com o som alto (oiça com moderação), são como um sussurro de lábios sensuais, tão perto das orelhas que nos dão um arrepio de prazer (pode sempre afastá-los um pouco, se isso o incomoda);
- Que são os únicos auscultadores com uma verdadeira imagem estereofónica, leia-se palco sonoro; e uma sweet spot (a posição exata em que soam melhor);
- Que redefinem os conceitos de resolução e claridade;
- Que redefinem os conceitos de micro-dinâmica e resposta transitória;
- Que redefinem o conceito de neutralidade tonal e ausência de colorações (nas vozes, por exemplo, que soam limpas, neutras e sem excesso de peito);
- Que, por comparação, os auscultadores eletrostáticos soam frágeis onde os SR1b soam atléticos;
- Que, por vezes, quando puxados até ao limite, senti o que parecia ser um fru-fru breve, fugaz e inconsequente no agudo superior e nas frequências muito baixas. Mas também podia ser o Oor em dificuldades. Ou os meus ouvidos.
- Que também senti, aqui e ali, que o grave podia ter um pouco mais de extensão e intensidade, mas graças a Deus não sofre do efeito donut (almofadas) com que os outros auscultadores ‘engordam’ artificialmente o som. O SR1b é de uma neutralidade tão inaudita, que é preciso reaprender a ouvir;
- Que, por vezes, senti que usava um adereço de um filme de ficção científica, ou inspirado pelo movimento Steampunk (ver teste do Rose RA180).
- Que, por outro lado, os SR1b também são uma obra de arte industrial reminiscente da insustentável leveza da arte cinética em suspensão de Alexander Calder (ver foto em baixo).
- Que, por vezes, senti-me nostálgico, quando me ocorreram à memória lampejos do tempo de infância em que utilizava duas caixas de graxa (de sapatos) e um cordel de sapateiro para comunicar com os amigos a poucos metros de distância.
- Mas, sobretudo, senti-me feliz por chegar a esta idade e ainda poder apreciar, durante horas, dias a fio, muita da música que me marcou, e que ouvi como se fosse a primeira vez, tal a quantidade de informação nova, não tanto em termos de conteúdo, sobretudo na forma de apresentação desse conteúdo.
Exemplos? Esta análise já vai longa, e juntar agora uma lista de 30 discos seria fastidioso. Mas, olhe, comece com ‘Thanks To You’, por Bob Scaggs, e vai perceber logo como tudo o que se escreveu sobre a incapacidade dos SRb1 para reproduzir vozes masculinas e graves não passa de ‘dor-de-corno’.
Se eu descobrir que é possível obter esta qualidade de som também com o meu Rose RS520 e um adaptador TI1a, acho que vou comprar um par de SR1b. Este par ainda aqui está, e eu já tenho saudades de quando partirem.
Os Raal-Requisite SR1b são os auscultadores do ano 2023 para o Hificlube. Ponto final. Parágrafo.