Delaudio950x225
Publicidade


Reviews Testes

Riviera AIC-10 BAL – verdadeira obra-prima

Riviera AIC10 side2.jpg

Read full article in English here

 

O amplificador analógico, híbrido, estéreo de auscultadores e colunas Riviera AIC-10 BAL restaurou a minha fé na humanidade, numa época em que a tecnologia digital domina.

"Não há o absoluto em reprodução do som musical; ou não existe a aparelhagem absoluta, um sistema ou um componente que desempenhe ótimo em qualquer situação todos os gêneros musicais.

Sempre há e haverá necessidade de ajustagem tonal e de adaptação acústica; sempre. Que é antes de tudo uma arte e não uma técnica. Aí é que está.

É arte pessoal e intransferível que não se aprende em escolas nem nos livros, e muito menos em revistas comerciais. Porque o que pode ser bom para mim pode não ser para uma pessoa “normal”. Holbein Menezes, abril de 2007.

Nota: Holbein Menezes, o decano dos audiófilos brasileiros, faleceu recentemente aos 99 anos.

Música para consumo humano

Partindo deste pressuposto, é fácil compreender por que motivo a empresa Riviera Labs arrisca produzir amplificadores “afinados” para ouvidos humanos, sem especial preocupação com a THD (Distorção Harmónica Total), numa época em que a crítica especializada está equipada com o Audio Precision 555, capaz de medir distorção até aos 0,005%, ou mesmo 0,0005%, apesar de um ser humano “normal” conviver bem com distorção 100 vezes superior: 0,5% (e até gosta!), como a dos amplificadores a válvulas.

Nota: Leiam este artigo ‘BB Tubes, Beauty and the Beast’ que publiquei no Hificlube sobre um software que introduz distorção ‘de válvulas’ no sinal para, alegadamente, melhorar a qualidade do som, segundo alguns dos mais famosos engenheiros responsáveis pela masterização de discos, que dão a cara pelos resultados assim obtidos.

Maître Jean Hiraga

Jean Hiraga foi o primeiro que tentou compreender a importância da qualidade vs quantidade de distorção, num artigo polémico, intitulado “A musicalidade dos amplificadores – Um estudo sobre distorção harmónica e análise espetral”, após ter lido um estudo de uma universidade japonesa sobre o timbre de centenas de violinos, onde se concluía que a diferença entre o timbre de um Stradivarius e um violino moderno reside no padrão harmónico dos sons que produz, e não nos tons fundamentais.

Segundo Hiraga, a musicalidade transcende as especificações técnicas. O que conta é o padrão harmónico da distorção e não a distorção harmónica total, pois é com base nesse padrão que o ouvido deteta o timbre.

Nota: os leitores interessados podem ler aqui Musicality and Distortion: A Conversation | audioXpress, o famoso debate entre Jean Hiraga, Jan Didden e Dennis Colin.

Ouvidos de ouro vs Objetivistas

Foi assim que começou a guerra interminável entre os “ouvidos de ouro” e os objetivistas. Os primeiros alegam que a composição espetral da distorção é mais importante que a distorção propriamente dita. Já os objetivistas defendem que a distorção, todo o tipo de distorção, é inaceitável num amplificador bem projetado, embora a distorção seja medida com sinais puros e não com música.

A música é composta sobretudo por harmónicos, que conferem a cada instrumento ou voz o seu timbre caraterístico, enquanto as fundamentais fornecem a altura básica de uma nota. Mas são os harmónicos que criam o som rico e complexo, tal como o percebemos, quando ouvimos música.

Em última análise, esta discussão reflete a atual oposição entre subjetividade e objetividade na avaliação da qualidade sonora. Ambos os lados têm méritos, e a escolha entre “ouvidos de ouro” e objetividade técnica muitas vezes depende das preferências pessoais e das prioridades de cada indivíduo.

Já li muitos argumentos técnicos a favor e contra e também ouvi bons e maus exemplos acústicos de ambos os lados. A razão argumenta que quanto menos distorção melhor, mas a emoção recusa a noção de que é sempre assim, ainda que a primeira apresente provas científicas e a segunda apenas conjeturas pessoais.

Mesmo assim, arrisco-me a dar a minha opinião, apenas com base em análise auditiva. Mas é importante cada um experimentar por si para poder chegar às suas próprias conclusões sem juízos prévios. Oiça antes de se pronunciar, porque há mais coisas entre o Céu e a Terra do que a Ciência consegue explicar.

Luca Chiomenti, no stand da Riviera Labs, Highend 2023, Munique.

Luca Chiomenti, no stand da Riviera Labs, Highend 2023, Munique.

Luca Chiomenti

Luca Chiomenti, o projetista da Riviera Labs, optou conscientemente por utilizar tríodos duplos no andar de entrada, Classe A pura, em todos os estágios, e prescindiu de realimentação negativa (apenas localizada), mesmo sabendo que assim os seus amplificadores nunca irão medir bem pelos padrões técnicos convencionais.

Teria sido fácil trocar válvulas por amplificadores operacionais e encharcar o circuito em realimentação negativa, até o número de zeros a seguir à vírgula agradar aos objetivistas. Mas seria a qualidade de som dos seus amplificadores a mesma, se fosse esta a via escolhida? Luca está convencido de que não. E eu tendo a concordar com ele, agora que ouvi o AIC-10 BAL.

Luca não é apenas mais um curioso que resolveu construir um amplificador na mesa da cozinha. Formou-se no Politécnico de Milão, e há 30 anos que desenvolve projetos de áudio para várias empresas. Sabe muito bem o que teria de fazer para enganar os equipamentos de testes e passar com distinção. Mas não foi esse o caminho que escolheu, apesar da sua vasta experiência neste campo. Porquê?

Tal como Jean Hiraga, que eu tive o prazer de conhecer pessoalmente (ler O dia em que conheci Jean Hiraga), Luca não está apenas focado nas especificações. Ele pretende criar amplificadores para reproduzir música para consumo de seres humanos, cuja fisiologia auditiva é complexa e resulta de uma evolução de centenas de milhares de anos, não para obter medidas perfeitas no laboratório.

Nota: Ler "Technical Overview", por Luca Chiomenti

Padrão de distorção

Luca alega que o ouvido humano introduz até 10% de distorção de 2ª harmónica em tudo o que ouvimos? Contudo, o cérebro tem a extraordinária capacidade de eliminar essa distorção e o que ouvimos é um tom puro. Assim, quando o padrão harmónico da distorção de um amplificador corresponde ao da audição humana, o cérebro ignora-a também. 

Zero Global Feedback

As técnicas de realimentação (feedback) são frequentemente (ab)usadas para estabilizar o amplificador e obter bons resultados nos testes SINAD (1). Contudo, eliminam também a distorção não-dissonante que é agradável e natural para o ouvido humano, ao mesmo tempo que introduzem desvios de fase e harmónicas de ordem elevada, essas, sim, não-relacionadas com a música, logo dissonantes, que o sistema auditivo deteta facilmente como distorção. Um mau negócio, em termos audiófilos, portanto.

Foi Harry Nyquist quem disse, e cito: Negative feedback applied to an electronic circuit is like a dog chasing its tail”.

Nota: (1) ‘Evaluating SINAD – Why It’s not Important.

Silvio Delfino (foto cortesia Riviera Labs)

Silvio Delfino (foto cortesia Riviera Labs)

Silvio Delfino

A Riviera Audio Laboratories nasceu, na Itália, em 2017, e foi-me apresentada, no Highend, de Munique, em 2018, por Silvio Delfino, que a fundou com Marco Muzio, o ‘designer’ industrial responsável pelo belíssimo cofre de metal que guarda as jóias eletrónicas produzidas por Luca Chiomenti.

Apresentação da Riviera Audio Labs, no HIFI'23, LIsboa

Apresentação da Riviera Audio Labs, no HIFI'23, LIsboa

Nota: Silvio Delfino esteve em Portugal, na apresentação da marca Riviera Labs, no evento Lisboa HiFi'23.

Conheço Silvio Delfino há tantos anos, que sou incapaz de localizar no tempo a primeira vez que falei com ele sobre os múltiplos produtos áudio que já representou e distribuiu. Mas a Riviera Labs parece ser o grande projeto da sua vida. E como eu o compreendo, depois de ouvir o amplificador de auscultadores Riviera Labs AIC-10 BAL. Se ao menos eu o pudesse comprar. E não apenas para o utilizar como amplificador de auscultadores, também como amplificador de colunas: são 10W de puro gozo.

Mais do que os olhos alcançam

É fácil perceber que um amplificador de auscultadores, com esta qualidade de construção, ‘design’ distintivo e sólido, com acabamentos luxuosos, não pode ser barato – e, de facto, não é: são quase €20.000. Ufa!

Ao ouvi-lo, vai, contudo, perceber que não está só a pagar a arte metalúrgica: o espesso painel estilizado e gravado, os dissipadores que acompanham as arestas arredondadas; e a excelência dos componentes internos, soldados à mão em placas de circuito de dupla face e 2 mm de espessura, pois é sobretudo a qualidade do som que justifica o elevado investimento. É tão bom quanto isso!

O exemplar que me foi enviado amavelmente pela Ajasom, o distribuidor oficial em Portugal, apresentou-se em cor de champanhe com três botões dourados para selecionar respetivamente: Input Line 1/Bal, Line 2, Line 3), Output (High Gain, Low Gain, Speakers) e Volume. Há também uma versão em cor de antracite com botões prateados. Eu fico-me pelo champanhe.

Riviera Labs AIC-10 BAL: controlo remoto só comanda o volume.

Riviera Labs AIC-10 BAL: controlo remoto só comanda o volume.

Amplificador híbrido de Classe A pura

O AIC-10 BAL é um amplificador híbrido de Classe A pura, que utiliza um tríodo duplo (12AU7/ECC82) no andar de prévio e Mosfets no andar de potência. Vem equipado com uma válvula JJ eslovaca, de ganho-médio, também utilizada em amplificadores de guitarra, mas é possível ‘afinar’ o som com válvulas equivalentes da Mullard ou da Radiotechnique.

Com base na minha experiência com as Mullard (mais quentes) e as Radiotechnique (mais neutras), instaladas num prévio McIntosh C2200, aconselho estas últimas. Se as encontrar no mercado especializado, não hesite em utilizá-las. Eu gostei também da JJ ECC802S Gold de origem, que soou ‘macia’ mas com tons bem definidos.

Riviera Labs AIC -10 BAL: foto do interior. É muito fácil substituir a válvula por outra equivalente.

Riviera Labs AIC -10 BAL: foto do interior. É muito fácil substituir a válvula por outra equivalente.

Som de válvulas ao meu gosto

Mas a Brimar CV4003, que também vinha na embalagem, soou ainda mais quente, com uma ênfase dourada nos registos médios, que soaram mais encorpados (soa mais alto?), sobretudo as vozes, que parecem saltar do palco sonoro. Acabei por optar pela Brimar, porque está mais próxima da minha ideia de "som de válvulas", embora o grave das JJ soe um pouco mais definido.

No painel frontal, estão, além dos botões de seleção, as saídas para auscultadores (Jack de 6,35 mm e XLR de 4-pinos). O circuito interno é o mesmo, pelo que não vai ouvir outra diferença que não seja a proporcionada pela qualidade da ligação.

Riviera Labs: ligações no painel traseiro.

Riviera Labs: ligações no painel traseiro.

Atrás, residem as 3 entradas de linha (uma XLR) e os terminais para ligação de colunas de som. A potência declarada de saída aqui é de apenas 10W/8 ohms, suficientes para alimentar um par de colunas de sensibilidade média (88dB) numa sala pequena, desde que não abuse do pedal. O amplificador de auscultadores Riviera AIC-10 BAL é assim também um notável amplificador de baixa potência para colunas, que me deixou rendido.

Incrível autenticidade

Comecei por utilizar um par de Sonus faber Concertino e passei depois para as novas Franco Serblin Accordo Goldberg, e continuo em choque pela qualidade do que estou a ouvir, dia após dia, quando pensava que só iria utilizar auscultadores.

E eis que passei dias a ouvir o AIC-10 BAL com colunas, quando a sua função principal é alimentar auscultadores. Significa isso que não gostei do AIC-10 BAL na sua função primordial? Nem por sombras! Acontece que o Riviera AIC-10 BAL é um excecional amplificador analógico de auscultadores, mas também de colunas de som.

Este foi o melhor som que alguma vez consegui ‘sacar’ dos meus Hifiman HE1000 – e nem precisei de igualização. Também fiz experiências com os novos Heddphone TWO e um par de Raal Requisite SRb1 (ver em baixo), com resultados assombrosos. Se o AIC-10 não fosse tão caro, já não o deixava ir embora...

AIC-10 BAL + HEDDphone TWO

AIC-10 BAL + HEDDphone TWO

O Riviera AIC-10 BAL é um excecional amplificador analógico de auscultadores, mas também de colunas de som.
O Riviera AIC-10 BAL e os auscultadores Raal Requisite SRb1 (com os indispensáveis transformadores de impedância e compensadores open baffle) fazem uma parelha imbatível.

O Riviera AIC-10 BAL e os auscultadores Raal Requisite SRb1 (com os indispensáveis transformadores de impedância e compensadores open baffle) fazem uma parelha imbatível.

Un vero capolavoro!

O grave é notável de controlo, extensão e informação; os médios têm uma autenticidade inaudita; os agudos encantam com o seu brilho dourado. A imagem é verosímil, tal como a volumetria dos elementos que a compõem, no tempo e no espaço, diferenciando-se no timbre e solidarizando-se na harmonia. O AIC-10 BAL tem ataque, dinâmica e ritmo. E velocidade. Tem tudo. Bravo, Luca, o AIC-10 BAL è un vero capolavoro!

O problema agora é ter de despedir-me do AIC-10 BAL. Posso estar errado nesta paixão súbita, mas deixem-me gozar enquanto posso.

Nota: A Ajasom enviou-me o Riviera Labs AIC-10 BAL com o objetivo de eu o utilizar para alimentar os auscultadores full-ribbon RAAL Requisite SRb1, através dos transformadores de impedância indispensáveis (ler teste aqui) devido à ultra-baixa impedância. Tanto com o TI 1B (saída de linha) como com o TI 1C (saída de colunas), os resultados foram sempre excelentes, nomeadamente com este último. Esta é uma parelha de audição obrigatória.

Conclusão:

O amplificador analógico, híbrido, estéreo de auscultadores e colunas Riviera AIC-10 BAL é o melhor que ouvi até hoje. Mas é também o mais caro. O amplificador estéreo de colunas é a deliciosa cereja no bolo. Poder comê-lo e tê-lo ao mesmo tempo, seria um sonho.

  • Potência: 2x 10W a 8 ohms
  • Entradas: 1x XLR; 2x RCA
  • Saídas: Colunas; 4-pole XLR; Jack
  • Dimensões: 260 × 435 × 145mm (LxPxA)
  • Peso: 14.4Kg
  • Preço: €19.926

Riviera AIC10 side2

Luca Chiomenti, no stand da Riviera Labs, Highend 2023, Munique.

Silvio Delfino (foto cortesia Riviera Labs)

Apresentação da Riviera Audio Labs, no HIFI'23, LIsboa

Riviera Labs AIC-10 BAL: controlo remoto só comanda o volume.

Riviera Labs AIC -10 BAL: foto do interior. É muito fácil substituir a válvula por outra equivalente.

Riviera Labs: ligações no painel traseiro.

AIC-10 BAL + HEDDphone TWO

O Riviera AIC-10 BAL e os auscultadores Raal Requisite SRb1 (com os indispensáveis transformadores de impedância e compensadores open baffle) fazem uma parelha imbatível.


Delaudio950x225
Publicidade