JVH desceu do pedestal do high end e sentou-se no sofá para ouvir um amplificador integrado de 1 500€. Os parentes não caíram na lama, o som também não.
Ser crítico de áudio, permite-me ouvir equipamentos de som que não tenho capacidade financeira para comprar.
É mais fácil analisar um amplificador que não me custou os olhos da cara, pois não sofro tanto se não cumprir as elevadas expectativas criadas pelo seu preço.
… eis o tipo de amplificador que eu aconselho aos amigos…
O Rotel A14MkII custa apenas 1.499€, logo o que se espera dele é que cumpra os requisitos mínimos que se exigem de um amplificador integrado de 80W/8 ohms de Classe A/B na sua categoria de preço.
Este é o tipo de amplificador que eu aconselho aos amigos que, depois de lerem as minhas análises hiperbólicas a amplificadores que custam tanto como um T1 com vista para o mar, me perguntam:
“E já agora não sugeres nada que se possa comprar com o subsídio que já nem para as férias dá, com esta inflação louca?...”
Eis uma alternativa acessível: Rotel A14MkII.
A família Tachikawa
A Rotel é uma empresa fundada em 1961, em Tóquio, que passados 61 anos continua na posse da família Tachikawa originalmente de origem taiwanesa.
Esta longevidade é o seu melhor cartão de visita. Nenhuma empresa resiste tantos anos se os seus produtos não tiverem qualidade – muito menos competitividade.
Num mundo global, a competitividade implica redução de custos, logo a deslocação para a China, onde são fabricados com o tradicional rigor japonês, era inevitável. Todos os componentes, incluindo os PCB e os transformadores, são produzidos na fábrica de Zhuhai, com exceção dos chips do DAC.
Rotel é vizinha da B&W
Se pensarmos que há uma relação empresarial entre a Rotel, a Classé e as colunas B&W – e, já agora - a Michi - este é um amplificador com algum pedigree - portanto, recomenda-se.
Daren Orth é o engenheiro responsável pela eletrónica Rotel. E como todos os bons projetistas de amplificadores, começa por uma fonte de alimentação robusta, com capacidade para gerar corrente suficiente para alimentar colunas com 4 ohms de impedância (150W/4 ohms). Um pouco mais de capacidade filtragem não se perdia nada, embora os condensadores de folha fina sejam de boa qualidade.
E juntou ainda alguns melhoramentos no circuito inspirados no desenvolvimento dos topos de gama “Tribute” e Michi.
Clássico com soluções modernas
Mas atualmente um bom amplificador não chega. É preciso responder às necessidades do consumidor moderno: AAC streaming Bluetooth, PC/USB, Roon Ready e um DAC da Texas Instruments 32-bi/384kHz com MQA/MQA Studio, que substitui os AKM originais, cuja fábrica ardeu recentemente.
Falta-lhe o streamer, mas com a ligação PC/USB pode utilizar o seu portátil para cumprir as funções de streaming.
De linhas elegantes
O A14MkII chegou-me às mãos na versão negra. Pode optar pela cor prata. Trata-se de um “slimline” de linhas direitas (430x93x345), com 9 Kg de peso.
No painel frontal, o único botão rotativo é o de controlo de volume. A seleção de funções e fontes é feita por meio de botões de pressão individuais.
O mostrador é banal, de baixa resolução, e funciona como apoio visual do botão de Menu, em conjugação com as teclas de +/-.
Além das múltiplas funções do volume, mostra apenas a fontes, volume e controlos de tonalidade selecionados (bass/treble +/-10dB).
Marchar, só em frente
Se pretender fazer o setting de um determinado parâmetro vai ter sempre de correr o menu todo, porque não é possível recuar, só avançar. E são 30 campos, alguns desnecessários ou redundantes! Pode utilizar o remoto mas o problema mantém-se. Mas há aqui uma função interessante: é possível regular o volume máximo de cada fonte.
Não vou enumerá-los todos – o Manual está disponível no site da Rotel. Mas há um que é fundamental: PC-USB 2.0. Já vamos ver porquê.
Bluetooth rocks
Logo que o A14MkII chegou, liguei-o ao sistema, fiz o emparelhamento Bluetooth com o meu Galaxy S22 Ultra e comecei a ouvir streaming da Tidal e Qobuz, enquanto escrevia.
…para o consumidor médio, o Bluetooth é quanto basta para o usufruto diário de música…
Como sempre acontece, o som melhorou ao fim de uns dias: ao princípio soa macio, mas algo difuso, sem contraste dinâmico e estrutura harmónica, a que o Bluetooth também não é alheio.
Mas para o consumidor médio, o Bluetooth é quanto basta para o usufruto diário de música. A maior parte dos potenciais compradores de um Rotel A14MkII não tem uma vasta coleção de ficheiros áudio de alta resolução, nem quer saber de DSD e MQA para nada.
Apenas está interessado em ouvir as novidades da Spotify ou explorar as suas antigas coleções de LP (Phono MM) e CD (evite leitores-CD ou DACS externos com nível de saída acima dos 4V, que podem provocar sobrecarga).
Assim, quando o liguei ao PC via PCB-USB para ouvir ficheiros áudio via JRiver e MQA e DSD via Roon surgiram logo as incompatibilidades nas amostragens e o DAC do Rotel não era reconhecido pelas aplicações.
Se vai utilizar um PC como streamer (PC-USB), para ouvir a Tidal ou Qobuz, além de instalar a Asio Driver disponível no site da Rotel, vai ter de alterar o default USB 1.0 para USB 2.0. Se tem um MAC, não precisa de driver.
Resolvidas estas questões informáticas, o A14MkII cumpre na integra as especificações: PCM 384kHz e MQA/MQA Studio 352,8kHz. E via Roon reproduz DSD128 como PCM 352,8kHz.
No painel frontal, o A14MkII oferece ainda uma outra entrada USB A, ativada com o botão USB. Pensei que podia assim ouvir também música armazenada numa pen ou disco rígido.
Contudo, esta ‘misteriosa’ entrada USB-A só é compatível com periféricos Apple: iPhone, iPad ou iPod (!!). A sério? Eis uma opção comercial, mais do que técnica, que é, no mínimo, discriminatória.
Mas, como já referi acima, nada o impede de ligar o seu Galaxy via Bluetooth.
A entrada para auscultadores aceita apenas jacks de 3,5mm. E não corta a saída do sinal para as colunas. Utilize os botões A-B para desligar as colunas.
Curiosamente, há ainda outra entrada USB A, no painel traseiro, mas essa tem apenas funções de carga (5V/0,5A) – do seu telemóvel, por exemplo.
…o A14MkII tem um som tipicamente Rotel: escorreito, limpo, muito linear…
Primeiros sons
O Rotel A14MkII tem um som tipicamente Rotel: escorreito, limpo, muito linear, não tão encorpado como eu gostaria, com um grave bem definido (sem adiposidades) e não adiciona nenhuma coloração particular ao som em geral, nem às vozes em particular, cuja reprodução não lhes rouba inteligibilidade ou altera a tonalidade.
O A14MkII não é um ‘brutamontes’, apesar dos alegados 150W/4, que me parecem otimistas, tendo em conta a fonte de alimentação.
Há no A14MkII uma delicadeza e uma finesse própria da Classe A, e por isso não me surpreendeu o facto de ficar bem quente, após umas horas de utilização, a revelar forte polarização.
Aposto que os primeiros 10W são em Classe A, talvez por isso eu goste tanto de o ouvir a tocar baixinho, no silêncio da noite, permitindo-me deambular na transparência do palco sonoro em busca de informação musical relevante.
Mas, claro, também é capaz de atingir volumes hostis à vizinhança, se lhe abrir as goelas, embora não me pareça tão à vontade como os concorrentes de Classe D a níveis elevados de pressão sonora.
O volume de abertura é 45 por default. E compreende-se porquê. Até metade do seu percurso, o potenciómetro parece não fazer efeito e o som sobe (demasiado) suavemente. Aconselho o acasalamento com colunas com boa sensibilidade.
Com monitoras, opte por subir 2dB no grave. De resto, oiça-o sem tempero (bypass). Com colunas-de-chão do tipo reflex, colocadas perto das paredes, poderá ao contrário corrigir algum excesso de grave. Os controlos de tonalidade também podem ter vantagens, por omissão.
Atenção: qualquer alteração é extensiva a todas as outras entradas.
O Rotel A14MkII é muito silencioso: não sofre de hum e não vai ouvir qualquer sopro mesmo com o volume no máximo (sem sinal, claro), o que revela cuidado na escolha da topologia e na construção.
Compare-o com a concorrência da NAD, Marantz e Audiolab, antes da compra. Se acabar por se decidir pela Rotel, não vai arrepender-se, pois a relação qualidade/especificações/preço é muito competitiva.
O som mais próximo que ouvi deste A14MkII é o do meu Naim Uniti Atom, que custa o dobro do preço.
Para mais informações: