Ao contrário da Devialet, que optou por uma estratégia de promoção comercial fora dos circuitos audiófilos tradicionais, com o relativo sucesso de quem arrisca sobreviver num habitat que não é o seu, a Sonus Faber criou também espaços de exposição próprios, como a galeria colectiva WOM, em Nova Iorque (ver em Artigos Relacionados), elevando o conceito de showroom ao nível de ‘club privé’, contudo continua a incentivar a sua relação com os media generalistas e a imprensa especializada mundial, fazendo convites para ‘retiros comerciais’, com forte componente cultural e gastronómica, sempre que algum produto pela sua importância simbólica justifica o investimento.
Deste modo, consegue concentrar sobre si as atenções de praticamente toda a crítica de áudio mundial reunida simultaneamente num único local.
Foi assim com a apresentação mundial das Ex3ma, comemorativa dos 30 anos, em 2014, em Vicenza (ver Artigos Relacionados), e mais recentemente com as SF16, ambas versões modernas de dois modelos icónicos da Sonus Faber: as Extrema e as Snail originais.
No decorrer da longa apresentação das SF16, que se realizou num resort turístico na Sardenha e que o Hificlube transmitiu praticamente em directo via Facebook (ver Artigos Relacionados), foi mostrado um ‘teaser-video’ da nova série Sonus Faber Tradition, entretanto integralmente revelado, quando da recente apresentação mundial na WOM-Townhouse, em Nova Iorque (ver Artigos Relacionados).
Desta vez, hélas, a apresentação foi apenas reservada para os distribuidores e a imprensa americana, tendo nós recebido em simultâneo deste lado do Atlântico um dossiê de imprensa completo com fotos e press-releases, mantendo-nos assim ao corrente do acontecimento.
As fotos foram reveladas aos leitores de imediato em primeira mão na página Facebook do Hificlube, mas faltava o testemunho presencial, que não demorou muito a chegar à ocidental praia.
Como sempre, a Imacústica foi dos primeiros distribuidores mundiais a apresentar toda a nova colecção Sonus Faber Homage Tradition, aproveitando o audioshow 2017, a que se seguiu o imashow 2017, quando os novos produtos divulgados no certame são depois disponibilizados em condições acústicas e de conforto ideais nas lojas de Lisboa e Porto, que não são possíveis de oferecer num ambiente de show aberto ao público.
Sonus Faber Homage Tradition – a tradição ainda é o que era
A nova série Tradition substitui a Homage original, sendo composta por 4 modelos dos quais apenas 3 foram entretanto apresentados: Guarneri e Amati, que substituem respectivamente a Guarneri Evolution e Amati Futura; e Serafino, um modelo novo de chão, na linha da Amati mas mais pequena, ou não fosse o nome derivado de Santo Serafino, um dos discípulos de Nicolò Amati.
Segue-se a Vox Tradition, uma coluna central para aplicações AV, de que só se conhece ainda o nome e que substitui a Homage Vox.
Na hierarquia da marca, as Tradition situam-se logo acima das Olympica e abaixo das ‘individualidades’: Il Cremonese, Lilium e Aida.
Tal como tem acontecido nos últimos anos, a dupla responsável por mais esta notável série é composta por Paolo Tezzon (engenharia acústica) e Livio Cucuzza (design industrial) que tão bons resultados tem dado para a Sonus Faber.
A empatia entre ambos é total. Paolo e Livio funcionam como aquelas duplas de atacantes no futebol que adivinham o que o outro está a pensar, transformando ideias e conceitos em realizações práticas de arte funcional.
Com a série Tradition, Paolo e Livio concretizaram o sonho de ‘evolução na tradição’, mantendo a forma de alaúde (ou será agora de um barco?) e a qualidade de construção e acabamentos que distingue de imediato a marca da concorrência, ao mesmo que integra soluções técnicas dos modelos de topo e outras inovações, como a opção pelas ‘3 vias ½’ que, como iremos ver é a 'pedra de toque' das Serafino e Amati.
As Tradition são lindas! As paredes e o topo agora também são em madeira. Basta olhar (e tocar, literalmente, com a mão!) para apreciar a excelência dos acabamentos, que se apresentam em duas cores: Red (a tradicional cor de violino) com incrustações, ‘vivos’ de alumínio e painel frontal forrado a cabedal, tudo em tom de negro; e Wengé, um tom de castanho-bronze, mais discreto, com incrustações creme e ‘vivos’ de alumínio em tom titânio, sendo o painel frontal em cabedal castanho.
À primeira vista, o vermelho é mais espectacular, logo o preferido da maioria; o Wengé, é como a Coca-Cola, primeiro estranha-se, depois entranha-se.
A ‘coluna vertebral’ em metal, que faz parte do ‘Exosqueleton’, o esqueleto interno, ao qual se adicionam os amortecedores (‘Dampshelves’) no topo e na base, confere solidez estrutural e beleza adicional ao conjunto. Os ‘silent spikes’ (sanduíche de borracha entre duas placas de metal) são o contributo final para a firmeza e estabilidade.
Todos os 3 modelos utilizam o mesmo tweeter de cúpula mole de 28 mm e altifalante de médios de 15 cm que derivam dos altifalantes das ‘Il Cremonese’. Não admira, pois, que partilhem o ‘carácter acústico’, com as diferenças a verificarem-se sobretudo na extensão e volume do grave.
A pequena Guarneri é uma monitora de duas vias que vem com o seu próprio suporte em alumínio e fibra de carbono. A placa superior de junção da haste do suporte à base da coluna tem a forma de uma ‘quilha’, conferindo leveza aerodinâmica à Guarneri.
Na campanha promocional foi utilizado um dos famosos barcos Riva Aquarama (ver video de abertura), onde Livio Cucuzza parece ter bebido muita da inspiração: da forma às incrustações entre as placas de madeira e às aplicações metálicas.
Tanto a Serafino como a Amati, são modelos de-chão de 4 altifalantes e ‘3-vias ½’. Apenas diferem no volume interno e no diâmetro das unidades de graves, respectivamente de 18 e 22 centímetros, logo na extensão do grave. E, claro, no tamanho, no peso e no preço.
Numa sala de dimensão média, a Serafino satisfaz plenamente. A Amati já exige mais cuidado na colocação e alimentação para evitar excitar os modos da sala. Nem sempre mais significa melhor.
Para a maior parte das aplicações domésticas, a Guarneri é quanto basta e vai ser a preferida das mulheres, que gostam pouco que lhes roubem espaço vital na sala.
A opção pelas ‘3 vias ½’ é uma inovação na Sonus Faber e decorre dos estudos de desenvolvimento dos modelos de topo, nomeadamente ‘Il Cremonese’. Até agora, os dois ‘woofers’ da Amati funcionavam na mesma banda de frequências, apresentando-se como uma ‘3-vias’.
Na nova Amati e na Serafino, o ‘woofer’ inferior encarrega-se apenas das frequências abaixo dos 80Hz, enquanto o ‘woofer’ superior faz a ligação com o altifalante de médios aos 250Hz.
Esta solução, que implica a existência de caixas de ressonância independentes para cada um dos ‘woofers’, resulta num registo grave mais tenso e intenso e igualmente extenso, com muito melhor definição e resposta transitória.
Só falta agora ouvi-las.
Sonus Faber Homage Tradition Collection – audição integral
Paulo Soares e Miguel Batista, a arte de carregar o piano em toda a sala. Ver em full screen a 1440p.
Tal como escrevi aqui, a crítica áudio está a mudar – para melhor, creio. Em vez de montar um sistema em minha casa, com todos os problemas logísticos – e de segurança, considerando o preço elevado dos componentes - que isso acarreta, reservei um auditório da Imacústica-Lisboa só para mim e, com a imprescindível e eficiente colaboração de Paulo Soares e Miguel Batista (veja-os em acção no vídeo), pude ouvir não apenas um modelo mas todos os modelos da nova série Homage Tradition numa única sessão.
Um luxo de outro modo impossível, mas que pode ser partilhado (e verificado) por todos os leitores, ao contrário do que sucederia se as audições tivessem decorrido em minha casa. Basta deslocarem-se à Imacústica.
Além de montar o sistema, composto por Audio Research CD9/GS Pre/150 e cabos Nordost, e de colocar todas as colunas nas respectivas posições, previamente marcadas, Paulo Soares seleccionou também as faixas, que foram utilizadas na avaliação dos 3 modelos, das quais escolhi como ilustrativas da audição: ‘Lua’, por Princezinho; ‘Wish You Were Here’, na versão ‘up-beat’ de Seguridad Social e 'Danse Macabre’, de Saint Saens, num registo audiófilo da Reference Recordings.
São estas as faixas que vai assim ouvir, sempre na mesma sequência nos respectivos vídeos, ilustrados com uma foto diferente do mesmo modelo por cada faixa, tal como foram reproduzidas pelas Guarneri, Serafino e Amati num dos auditórios da Imacústica. Deste modo o leitor pode acompanhar melhor a minha avaliação.
Sugiro o visionamento em HD 4K e a audição com um DAC e uns bons auscultadores, ou mesmo ligado ao seu sistema de som.
As gravações digitais 96/24 foram registadas directamente sem qualquer processamento posterior, além, claro, da compressão AAC utilizada pela Vimeo. Apesar de ter editado excertos curtos seleccionados para permitir uma comparação A/B/C quase imediata, é provável que oiça um ou outro ruído ambiente ou até um avião a sobrevoar a Imacústica preparando-se para aterrar na Portela…
Como é óbvio, o que se ouve é meramente ilustrativo e serve apenas de ‘teaser’ da audição no local que se aconselha a todos os interessados. Contudo, é notável que mesmo assim seja possível ouvir pequenas diferenças acústicas entre os 3 modelos que justificam (ou não) os cerca de cinco mil euros que os separam entre si. A saber:
Sonus Faber Homage Tradition Collection
Guarneri – 14 900 euros
Serafino - 19 500 euros
Amati – 25 900 euros
Avaliação geral
Todos os 3 modelos partilham a mesma unidade de médios e o tweeter. Não será, portanto, surpresa para ninguém que partilhem o mesmo carácter sonoro, embora com personalidades diferentes por influência do volume interno e da importante quota parte dos ‘woofers’ na reprodução dos graves.
Curiosamente, a Guarneri é, em termos tonais (com as variações dinâmicas decorrentes das dimensões físicas), mais ‘próxima’ da Amati que da Serafino.
Digamos que a Serafino não é apenas um novo nome na colecção, é também um novo conceito sonoro, com um ‘voicing’ próprio, no qual Paolo Tezzon procurou o corpo, a textura e a compostura: é mais discreta em termos de detalhe.
A Guarneri quase não se distingue da Amati na transparência geral e rivaliza com vantagem na focagem e amplitude da imagem. Perde, claro, na macrodinâmica, pois a Amati desloca muito mais ar; na escala e na profundidade da imagem.
Guarneri Homage Tradition
Comentário:
É mais fácil construir um bom monitor de duas-vias que uma coluna-de-chão de banda larga. Desde logo a integração de apenas duas unidades proporciona maior coerência de fase e de dispersão polar.
Depois, o ‘baffle’ mais estreito estimula a focagem, a estabilidade da imagem e com ela o proverbial ‘vanishing act’: as colunas ‘desaparecem’ com fonte do som.
Claro que tem limitações macrodinâmicas e de extensão, apesar de tudo muito bem colmatadas com a judiciosa utilização da carga ‘reflex’ na busca do equilíbrio entre presença e definição do grave, com o recorte a perder-se abaixo dos 50Hz na zona de acoplamento do pórtico com o ar da sala.
Não admira, pois, que a Guarneri tenha reproduzido ‘Lua’ quase como a Amati, sobretudo a voz de Princezinho e os transíentes das cordas; se tenha aguentado corajosamente em ‘Wish You Were Here’, cuja ‘batida’ se centra nos 80Hz; e apenas tenha cedido na ‘Danse Macabre’ onde a quantidade de ar em movimento faz toda a diferença nos ataques da orquestra. De resto, nos timbres, são ‘almas gémeas’.
Serafino Homage Tradition
Comentário:
Já vimos que Paolo Tezzon optou pela primeira vez nas Tradition pelo conceito de ‘3-vias 1/2’. Ou seja, para quem saltou a descrição, em vez de ambos os ‘woofers’ reproduzirem a mesma banda de frequências, como é vulgar nas colunas de ‘3-vias’ e 4 altifalantes, aqui o ‘woofer’ inferior reproduz os graves apenas e o superior faz a ligação grave-médio.
Assim sendo, é possível dar mais ou menos corpo e textura ao som na medida em que se permite ao ‘woofer de ligação’ entrar mais ou menos no território do altifalante de médios. Na Serafino, é permitida ao 'woofer' superior maior sobreposição (pelo menos uma oitava) com o médio que na Amati.
Não é por acaso que a Serafino parece soar ‘maior’ e tem a voz mais ‘grossa’ e encorpada (peito) que a Amati. Por outro lado, é mais ‘laid-back’ nos registos médio-altos, o que pode induzir a sensação (errada) de menor transparência e vivacidade.
Paolo Tezzon procurou – e encontrou – um denominador comum que torna a Serafino apta a reproduzir todos os géneros musicais sem impor a sua personalidade vibrante como a Amati. É confortável e discreta, tal como a cor Wengé (embora também possa ser encomendada em vermelho)
Amati Homage Tradition
Comentário:
Se pode lá chegar, não hesite. A Amati aproxima-se perigosamente da ‘Il Cremonese’ (39 600 euros) que, no teste que publiquei na Hi Fi News (ler aqui), eu considerei a melhor coluna de sempre de Paolo Tezzon.
E se é verdade que em ‘Lua’ qualquer delas cumpriu cabalmente os objectivos, há com a Amati mais informação e um maior envolvimento emocional do ouvinte. Com ‘Wish You Were Here’ não é necessário desejar que ‘ele’ esteja lá – está mesmo! E a ‘Danse’ de Saint Saens soa muito mais…macabra!
O conceito ‘3 ½’ é explorado aqui de forma diferente. O conjunto médio/agudo soa praticamente como o da Guarneri, quase como uma ‘2 vias’ pura. O ‘woofer’ superior dá ao médio o suporte físico, a força e o ataque da estrutura dinâmica apenas na oitava inferior da sua acção, sem ousar tocar no equilíbrio tonal dos médios, ao mesmo tempo que define a crista dos graves inferiores conferindo-lhes recorte e articulação.
Apreciação geral final
Sem prejuízo de voltar a analisar qualquer dos 3 modelos em mais pormenor, eu direi que a escolha de qualquer delas depende apenas da sua disponibilidade financeira e de espaço.
Tendo em conta o prestígio da marca, o design e a beleza; e a qualidade de construção e de som, em todos os casos o valor percebido é muito superior ao valor exigido.
Mesmo que escolha pelo método ‘pim-pam-pum’ não pode falhar nunca. Fica sempre bem servido…
Para mais informações:
IMACUSTICA