A Musical Fidelity produziu o conjunto amp/leitor CD Nu-Vista com tiragem limitada. Apesar do preço elevado, esgotaram-se. Foram produzidos 500 exemplares numerados e certificados que são hoje peças de colecção. Quem comprou, ganhou. A perder ficava Antony Michaelson, se não aproveitasse o vento de feição. A MF lançou agora a versão 308, que é a série Nu-Vista chapada com transístores no lugar das «nuvistor», as válvulas anãs tão raras quanto originais. Digamos que é o mesmo bolo, só quem um tem passas e o outro pinhões. E o sabor? O próprio Antony admite que não ficaria surpreendido se houver quem prefira os «308», que são até relativamente mais baratos. Ainda bem que é assim, porque depois de o ter apodado de «bife empertigado», ele podia pensar que eu gostava mais dos «308» que dos Nu-Vista só para o chatear.
Quando os liguei (comecei pelo leitor-CD), percebi logo que o Nu-Vista 3CD e o CD A308 eram como duas gotas de água. Afinal, o segredo do som não estaria nas «nuvistor» mas no resto: upsampling automático para 96kHz, no «jitter» muito baixo e na fonte de alimentação regulada por «choke» (filtragem por bobina).
Bastava-me procurar no meu computador o que escrevera sobre os Nu-Vista, definir, copiar e transportar. Ninguém ia dar por nada. E não creio que algum dia venha a ser criada uma comissão de inquérito para investigar este autoplágio. Pois se há quem me copie descaradamente todos os meses e ninguém faz nada...
Quanto testei o Nu-Vista 3CD comparei-o com o Krell KPS28c. E escrevi assim:
«Este é um dos casos paradigmáticos de Yin e Yang. Digamos que o KPS28 favorece a voz masculina e o 3CD a voz feminina; o primeiro tem da guitarra e do violino o conceito de um instrumento de caixa com cordas; o segundo, o de um instrumento de cordas com caixa. O KPS28c pinta o palco sonoro com os tons e a textura do pastel; o 3CD é um desenho a tinta da China com a minúcia e a precisão de um arquitecto. Associo o KPS28c a termos como: cheio, amplo, envolvente, autoritário, poderoso; já o 3D suscita-me associações de: claridade, limpeza, focagem, recorte. À sua maneira são ambos extremamente transparentes, permitindo «ver» em profundidade dentro do palco sonoro. Mas enquanto o KPS28 privilegia o colectivo sem prejudicar o indivíduo; o 3CD privilegia o indivíduo sem pôr em causa o colectivo. Digamos que o primeiro é socialista e o segundo social-democrata. É na reprodução do som do piano que estas duas «ideologias» são mais evidentes. O piano é, sem dúvida, o mais «colectivo» dos instrumentos individuais, o único que se pode substituir a uma orquestra, como no caso dos estudos transcendentais ou as sonatas de Liszt. Nada como a virtuosa Valentina Lisitsa, num registo Audiofon do grande Peter McGrath (a mais extraordinária gravação de um piano alguma vez registada), para solicitar as potencialidades sonoras do instrumento. O KPS28c é mais escuro, mais emotivo, mais introspectivo, mais profundo, como se sobre as notas houvesse um fugaz véu negro de viúva balzaquiana, mais formal que eficaz: deixa adivinhar o que pretende cobrir, é erótico e excitante. O Nu-Vista 3CD despe Valentina do manto diáfano da insuperável técnica e não deixa tecla sobre tecla: o som é limpo, fresco, cristalino, maravilhoso, com total ausência de «ringing» (vantagem do «up-sampling?»), alvo e leve como um véu de noiva feliz (sem nada por baixo!)». Toda nua, só com um véu? Onde é que eu já ouvi isto?...
O leitor-CD A308 obteve na minha tabela a mesma classificação que o seu irmão Nu-Vista. Com a vantagem de ser, se a memória não me falha, menos incisivo. Continua a despir Valentina mas agora com pudor afectivo e já não com a gula lasciva do «voyeur». Isto apesar de o adversário ter sido desta feita o fabuloso conversor Chord DAC64 (a minha referência absoluta na audição de CDs). O leitor-CD A 308 tem um pouco menos de alma, de instinto maternal, que o DAC64. É mais masculino e jovem. Se fosse vinho era um Beaujolais: frutado, límpido, com um «piquinho» delicioso.
Seguiu-se a audição do amplificador integrado A308 (150W s/8 Ohms; 300W s/ 4Ohms; elevada tensão de pico: 99V; e de corrente: 48 Amperes; e de factor de amortecimento: 140, o que pressupõe graves sólidos) sempre com a memória auditiva do Nu-Vista M3 em pano de fundo e o apoio da memória escrita:
«O M3 tem uma transparência única e uma riqueza de pormenor que só experimentei com amplificadores Chord: o mesmo grave tenso e articulado; a mesma resposta pronta com soluções micro e macro dinâmicas que não cessam de surpreender o ouvinte. No agudo superioriza-se até, é de uma graciosidade e subtileza notáveis, sem grão ou quaiquer outros artefactos electrónicos para nos estragar o prazer da audição. Os registos médios soam, numa primeira análise, um pouco secos, despidos (NU?), mas cedo nos apercebemos que se trata de uma opção a raiar o fundamentalismo acústico. A precisão da focagem e a individualização de naipes e timbres é perfeita em toda a dimensão, melhor, em todas as dimensões, do palco sonoro, com o negro do silêncio a contrastar com a claridade ímpar dos sons prenhes de detalhes ínfimos. Quando muito instado (o M3 nunca dá parte de fraco), instala-se uma vaga sugestão de dureza que cedo se esquece face à musicalidade reinante em toda a extensão do espectro audível: das profundezas oceânicas dos graves às alturas celestiais onde se cantam hosanas à perfeição divina dos agudos».
Agora rasure termos como «seco», «despido» ou expressões como «vaga sugestão de dureza», deixe ao lume durante uma semana e tem o MF A308. Mais por menos é o que o «MF A308 Dual-Mono Integrated Amplifier» lhe dá. Coisa rara nos tempos que correm. E tem entrada phono: mm/mc. E controlo remoto que não lhe deve nunca tirar o gozo de mexer naquele botãozão central. Pronto, admito que o Nu-Vista M3 tem mais poder e controlo e é mais autoritário que o A308. Mas para autoritário já temos o Bush, e eu até nem gosto de música árabe...
Distribuidor: Sintonia Fina
Quando os liguei (comecei pelo leitor-CD), percebi logo que o Nu-Vista 3CD e o CD A308 eram como duas gotas de água. Afinal, o segredo do som não estaria nas «nuvistor» mas no resto: upsampling automático para 96kHz, no «jitter» muito baixo e na fonte de alimentação regulada por «choke» (filtragem por bobina).
Bastava-me procurar no meu computador o que escrevera sobre os Nu-Vista, definir, copiar e transportar. Ninguém ia dar por nada. E não creio que algum dia venha a ser criada uma comissão de inquérito para investigar este autoplágio. Pois se há quem me copie descaradamente todos os meses e ninguém faz nada...
Quanto testei o Nu-Vista 3CD comparei-o com o Krell KPS28c. E escrevi assim:
«Este é um dos casos paradigmáticos de Yin e Yang. Digamos que o KPS28 favorece a voz masculina e o 3CD a voz feminina; o primeiro tem da guitarra e do violino o conceito de um instrumento de caixa com cordas; o segundo, o de um instrumento de cordas com caixa. O KPS28c pinta o palco sonoro com os tons e a textura do pastel; o 3CD é um desenho a tinta da China com a minúcia e a precisão de um arquitecto. Associo o KPS28c a termos como: cheio, amplo, envolvente, autoritário, poderoso; já o 3D suscita-me associações de: claridade, limpeza, focagem, recorte. À sua maneira são ambos extremamente transparentes, permitindo «ver» em profundidade dentro do palco sonoro. Mas enquanto o KPS28 privilegia o colectivo sem prejudicar o indivíduo; o 3CD privilegia o indivíduo sem pôr em causa o colectivo. Digamos que o primeiro é socialista e o segundo social-democrata. É na reprodução do som do piano que estas duas «ideologias» são mais evidentes. O piano é, sem dúvida, o mais «colectivo» dos instrumentos individuais, o único que se pode substituir a uma orquestra, como no caso dos estudos transcendentais ou as sonatas de Liszt. Nada como a virtuosa Valentina Lisitsa, num registo Audiofon do grande Peter McGrath (a mais extraordinária gravação de um piano alguma vez registada), para solicitar as potencialidades sonoras do instrumento. O KPS28c é mais escuro, mais emotivo, mais introspectivo, mais profundo, como se sobre as notas houvesse um fugaz véu negro de viúva balzaquiana, mais formal que eficaz: deixa adivinhar o que pretende cobrir, é erótico e excitante. O Nu-Vista 3CD despe Valentina do manto diáfano da insuperável técnica e não deixa tecla sobre tecla: o som é limpo, fresco, cristalino, maravilhoso, com total ausência de «ringing» (vantagem do «up-sampling?»), alvo e leve como um véu de noiva feliz (sem nada por baixo!)». Toda nua, só com um véu? Onde é que eu já ouvi isto?...
O leitor-CD A308 obteve na minha tabela a mesma classificação que o seu irmão Nu-Vista. Com a vantagem de ser, se a memória não me falha, menos incisivo. Continua a despir Valentina mas agora com pudor afectivo e já não com a gula lasciva do «voyeur». Isto apesar de o adversário ter sido desta feita o fabuloso conversor Chord DAC64 (a minha referência absoluta na audição de CDs). O leitor-CD A 308 tem um pouco menos de alma, de instinto maternal, que o DAC64. É mais masculino e jovem. Se fosse vinho era um Beaujolais: frutado, límpido, com um «piquinho» delicioso.
Seguiu-se a audição do amplificador integrado A308 (150W s/8 Ohms; 300W s/ 4Ohms; elevada tensão de pico: 99V; e de corrente: 48 Amperes; e de factor de amortecimento: 140, o que pressupõe graves sólidos) sempre com a memória auditiva do Nu-Vista M3 em pano de fundo e o apoio da memória escrita:
«O M3 tem uma transparência única e uma riqueza de pormenor que só experimentei com amplificadores Chord: o mesmo grave tenso e articulado; a mesma resposta pronta com soluções micro e macro dinâmicas que não cessam de surpreender o ouvinte. No agudo superioriza-se até, é de uma graciosidade e subtileza notáveis, sem grão ou quaiquer outros artefactos electrónicos para nos estragar o prazer da audição. Os registos médios soam, numa primeira análise, um pouco secos, despidos (NU?), mas cedo nos apercebemos que se trata de uma opção a raiar o fundamentalismo acústico. A precisão da focagem e a individualização de naipes e timbres é perfeita em toda a dimensão, melhor, em todas as dimensões, do palco sonoro, com o negro do silêncio a contrastar com a claridade ímpar dos sons prenhes de detalhes ínfimos. Quando muito instado (o M3 nunca dá parte de fraco), instala-se uma vaga sugestão de dureza que cedo se esquece face à musicalidade reinante em toda a extensão do espectro audível: das profundezas oceânicas dos graves às alturas celestiais onde se cantam hosanas à perfeição divina dos agudos».
Agora rasure termos como «seco», «despido» ou expressões como «vaga sugestão de dureza», deixe ao lume durante uma semana e tem o MF A308. Mais por menos é o que o «MF A308 Dual-Mono Integrated Amplifier» lhe dá. Coisa rara nos tempos que correm. E tem entrada phono: mm/mc. E controlo remoto que não lhe deve nunca tirar o gozo de mexer naquele botãozão central. Pronto, admito que o Nu-Vista M3 tem mais poder e controlo e é mais autoritário que o A308. Mas para autoritário já temos o Bush, e eu até nem gosto de música árabe...
Distribuidor: Sintonia Fina