Na sua peregrinação regular às capelinhas do áudio de Lisboa, JVH visitou o auditório da Ajasom-Damaia para uma audição crítica das Audiovector R8 Arreté. Eis a reportagem do acontecimento.
Os audiófilos portugueses talvez não se apercebam, mas são dos mais ‘mimados’ da Europa. Em Lisboa – e também no Porto – têm alguns dos melhores e mais sofisticados auditórios de áudio highend.
De tal modo que já publiquei um artigo apelando à promoção do ‘turismo audiófilo’ que, no fundo, passe a heresia, é uma forma de ‘turismo religioso’, com as suas crenças e rituais e – porque não dizê-lo: fanatismos e respetivos gurus.
Guru de pacotilha
Há quem abusivamente (ainda que amavelmente) me considere um guru – para o bem e para o mal: há gurus que levam pessoas por maus caminhos - eu só mostro o caminho, cada um faz o seu caminho, caminhando.
De facto, não sou mais que um audiófilo com longa experiência de audições em todo o mundo de uma vasta gama de equipamentos, e com alguma capacidade para refletir na escrita aquilo que ouvi, contribuindo assim para uma primeira abordagem mais informada por parte do leitor - a única que conta.
Não pretendo impor nada. Não pretendo saber mais que ninguém. Não vou em modas. Tenho como referência o som da música ao vivo não amplificada e o som dos muitos sistemas que já ouvi e mais se aproximam deste desiderato. Independentemente do preço. Independentemente da marca. Independentemente do distribuidor. Independentemente da tecnologia. Independentemente das medidas.
A realimentação (negativa) provoca indigestão
Como exemplo: um amplificador com excesso de realimentação negativa (negative feedback) medirá sempre melhor (distorção) e soará sempre pior que outro com aplicação judiciosa (ou mesmo dispensa) desta tecnologia de correção.
Posto isto, o que fui eu ouvir à Ajasom que me suscitou esta introdução?
Audiovector R8 Arreté
As novas colunas Audiovector R8 Arreté, suportadas por eletrónica Nagra HD e a linha Grandioso da Esoteric, que passou a jogar também com a camisola da Ajasom, depois de anos ao serviço exclusivo da Delaudio.
As R8 Arreté são a versão em menor escala – mas não em menor qualidade – das R11 Arreté, com acabamentos sumptuosos em raiz de nogueira italiana (pode optar por acabamento Piano em cinza, preto e branco) com painel frontal (baffle) em alumínio sem brilho, e tecnologia de ponta: altifalantes com cones de carbono e fibras vegetais e bobinas com formantes de titânio, por exemplo.
More than meets the eye
Sistema em Demonstração:
- Esoteric K1X Grandiosos (SACD)
- Esoteric N-01XD (Streamer/Dac)
- Esoteric G-02X (Master Clock)
- Bergman Galder + Odin + Lyra Delos
- Nagra Classic Phono
- Nagra HD Preamp
- Nagra HD Amp
- Audiovector R8 Arreté
- Shunyata Everest (Filtro de Corrente)
- Shunyata Alpha, Sigma e Omega (Cabos de Corrente e Digitais)
- Kimber Kable Select (Cabos de Coluna e de Sinal)
Aparentemente, as R8 são colunas de 3-vias, com tweeter quasi-dipolo AMT Integrator, 3 unidades de médios de 6,5 polegadas (com frequências de corte em escada) e um subwoofer que respira pela base elevada num suporte de design elegante. Mas são muito mais do que isso.
Eu diria mesmo que as R8 Arreté são um sistema complexo, a exigir mais do que uma análise auditiva simples. Aconselho, pois, os leitores (e potenciais compradores) a fazer a sua própria apreciação auditiva prévia. O sistema é tão revelador que eu preferi ouvi-lo sem o Master Clock: a precisão temporal do K1X Grandioso já é suficientemente...eh...grandiosa...
Configuração isobárica
O grupo de graves é composto não por um altifalante mas por dois: 8'' + 6'', de diâmetros diferentes, portanto (!?, it's a first for me...), em configuração isobárica (tandem); e o grupo de médios é reforçado por um médio/grave de 4 polegadas escondido na armadura metálica traseira.
Nota:
Dois woofers em tandem correspondem a um woofer montado numa caixa com o dobro do volume interno. Mas os sistemas isobáricos não se distinguem pela extensão, antes pela tensão e poder do grave.
Freedom Circuit
Novidade é a possibilidade de ‘escoamento’ para a terra por meio de um filtro e dois cabos longos (Freedom Circuit) da diferença de muito baixa tensão entre as cestas dos altifalantes.
As cestas são de alumínio mas há sempre impurezas ferrosas que podem criar campos magnéticos causadores de distorção por indução.
Coluna de som com ‘guelras’ de tubarão
A coluna vertebral em metal tem ranhuras (guelras ou brânquias) de ‘respiração’ do tipo slot que são parte integrante da configuração quasi-dipolo de todo o sistema, e muito contribuem para a espacialidade e profundidade da imagem.
A ‘armadura’ convexa tem quatro grupos de ranhuras diferentes para cumprir funções diferentes: cinco ranhuras na posição superior para ‘descomprimir’ e deixar respirar o tweeter AMT; a meio, sete ranhuras para o médio-grave de 4 polegadas, já referido; mais abaixo duas saídas de sete ranhuras para a onda traseira dos dois médios encarregados das frequências mais baixas (já vimos que todos três têm frequências de corte diferentes, sendo que o superior têm uma longa sobreposição com o tweeter AMT). E não esquecer as ‘ranhuras’ da base.
Aposto que a resposta polar se aproxima da forma de oito dos painéis e eletrostáticas. Ainda que um oito algo irregular, pois a radiação traseira das R8 será no máximo de 1/4 da radiação frontal.
R8 são filhas das R11 Arreté
As R8 Arreté derivam das R11 Arreté, que foram apresentadas na sala da Ajasom, no Audioshow 2017, pelo próprio projetista/fabricante Ole Klifoth, a quem fiz uma entrevista breve que podem (re)ler aqui, na qual lhe perguntei a origem da designação Arreté, pois soa a algo de negativo em francês:
‘Ah, isso, pois, a palavra vem do grego Arete que significa ‘excelência absoluta’ e está associada também a virtudes morais, à coragem e à eficácia. E nós achamos que a R11 tem isso tudo. Estão aqui 35 anos de estudos e experiências. É o expoente máximo das nossas capacidades: Arete, portanto.’
Análise auditiva da R11 Arreté
Na altura, foi esta a avaliação auditiva que fiz das R11 Arreté:
'Excepcional pureza tímbrica, patente na fluidez e pureza das cordas e das vozes femininas, associada a uma sensação de transparência geral do ar envolvente, a que não é alheia a utilização de dois tweeters AMT ‘open-back’.
Os oito ‘woofers’ montados na ‘quilha’ traseira conferem-lhe notável autoridade macrodinâmica e o efeito de bipolaridade contribui para a tridimensionalidade da imagem, a textura e o ‘corpus sónico’, ao actuar como estrutura acústica sólida que sustenta uma grande gama-média isenta de colorações.
Integração perfeita de todas as unidades, com excelente coesão e entrosamento das gamas num todo coerente e linear, que respira a uma só voz: do mais ténue suspiro de uma soprano à explosão controlada dos ‘tutti’ orquestrais.
Imagem estereofónica 3D estável e ampla, com incrível dispersão lateral e boa ilusão de profundidade.
Só lhes reconheço virtudes – e um defeito: o preço de 200 mil euros!’
E publiquei este vídeo da audição, que pode ser visto em exclusivo no Hificlube.net
Amplificação Nagra HD
As R8 estavam a ser amplificadas por eletrónica Nagra, tal como as R11 no Audioshow 2017. Mas não posso dizer que o som é igual, muito embora a memória auditiva seja falível. Até porque as fontes eram diferentes, com exceção do gira-discos:
As R8 Arreté não têm a mesma capacidade para movimentar ar, nem seria legítima essa expectativa. Por outro lado, também não vai precisar de movimentar tanto dinheiro da sua conta bancária, pois custam ‘apenas’ 58 mil euros, pautando-se assim como uma ‘melhor compra’, na relação preço/qualidade demonstrada.
A gama média das R8 soa um pouco mais ‘recuada’, dando ligeira proeminência aos extremos de frequência: o grave gosta de mostrar que está lá para o que der e vier. A imagem impressiona mais pela estabilidade que pela focagem, evitando a 'visão de sniper' dos solistas.
Graves presentes e recortados
Jorge Mendes é um ouvinte atento, e não foi por acaso que me deu a ouvir ‘Comes Love’, de FrauContraBass, que, como o nome indica, canta ‘covers’ de canções famosas, acompanhando-se ao contrabaixo acústico.
E as R8 não se fizeram rogadas, reproduzindo o ‘rosnar’ das cordas do contrabaixo sem afetar a limpeza da voz feminina.
Por outro lado, há uma clara característica familiar: o palco sonoro é expansivo, alicerçado na semi-dipolaridade do sistema.
Assim, não fiquei surpreendido com o padrão de música ‘ambiental’ selecionado por Jorge Mendes, o meu anfitrião.
Música atmosférica
Ambiental, mas não no sentido de ‘música de hall de hotel’, antes com mistura ‘atmosférica’, natural ou artificial (de estúdio), pois as R8 reproduzem o ‘ar’ com incrível realismo:
A House Built From Cloth, do álbum We Come From The Sun, No Man No Cry, por Oliver Koletki e Jimmy Sax, com um saxofone ‘espacial’; ou o etnicismo de Baghon Main por Arooj Aftab & Darian Donovan Thomas (estamos sempre a aprender…).
Can’t We Be Friends?
Mas, sendo eu algo conservador no gosto musical, não resisti a selecionar para os leitores do Hificlube.net a gravação registada em direto no auditório da Ajasom de ‘Can’t We Be Friends’, numa interpretação histórica de Ella Fitzgerald e Louis Armstrong, nas versões LP (Verve), SACD e streaming (em sequência no vídeo). Oiçam com auscultadores e um bom DAC e comparem. Dá que pensar, não dá?...
Não sei se no vídeo é possível ouvir as diferenças. Mas ‘ao vivo’ a superior qualidade do LP é indesmentível. Admito que possa haver aqui recurso a diferentes masterizações, o que sempre serve de desculpa para o facto de eu ter ‘abandonado’ o LP, como principal fonte de áudio, há muito anos. Uma vez mais, humildemente me penitencio perante os leitores. Mea culpa. Outra surpresa para muitos é o facto de o streaming Tidal/MQA se bater com o LP, depois de ter sido arrasado por quem ouve sinais de teste em vez de música. Primeiro oiça, depois opine, é o meu conselho.
Cornetas na cave
Na cave da Ajasom, ouvi pela primeira vez as Blumenhofer Genuin FS3MkII, alimentadas por um integrado da Esoteric, tendo como fonte o Rose RS150 Streamer/DAC, cujo teste podem ler aqui.
O sistema completo era composto por:
- Rose RS150 (Streamer/Dac)
- Esoteric F-07 (Integrado)
- Blumenhofer Genuin FS3 MKII
- SOtM MT-1000 (Filtro de Corrente)
- Kimber Kable (Cabos de Coluna e Sinal)
- Furutech (Cabos de Corrente)
As colunas Blumenhofer distinguem-se pela unidade ativa de compressão com diafragama de Mylar e a corneta que, aliada ao woofer de cone de papel de 25 cm, lhes garante uma elevada eficiência de 96dB, e lhes permite serem alimentadas por amplificadores a válvulas de baixa potência.
A audição foi breve mas promissora e a exigir mais atenção no futuro. Por alguma razão se chamam Blumenhofer que, em alemão, significa algo como 'produtor de flores'...
Para mais informações: Jorge Mendes
Marketing Executive
TLM 963 480 041 | TLF 210 541 838
Como nascem as Audiovector R8 Arreté
Fabricadas à mão na Dinamarca pelo próprio Klifoth (filho), uma coluna de cada vez, sem pressas, com extremo cuidado e carinho. Estas coisas pagam-se, sobretudo com origem em países escandinavos...