Admito já – chamem-lhe disclaimer se quiserem: quando se trata de DACs da Chord, eu não sou integralmente isento na apreciação. Não por conhecer pessoalmente John Franks (conheço também dezenas de outros fabricantes, e isso não me causa qualquer embaraço), nem por seguir a carreira de Robert Watts, desde os tempos da Deltec e da dpa (fui das primeiras pessoas a quem ele revelou o famoso chip que está na base da tecnologia de conversão Field Programmable Gate Array), mas porque o DAC64 original é uma das minhas ferramentas de trabalho, desde que o testei, em Maio de 2003 (teste disponível em Artigos Relacionados: 'Ao ritmo do coração').
Ora, na era digital em que vivemos, 10 anos é uma eternidade. Logo em 2008, surgiu a primeira versão do QBD76, que oferecia, numa óbvia cedência ao mercado da altura, a opção Bluetooth (teste também diponível em Artigos Relacionados).
O QBD76 era uma clara evolução, tanto em termos de transparência como de resolução, mas old habits die hard, e eu habituara-me àquele som “confortável”, “fofo” e “ redondo” do DAC64, que era o émulo mais próximo do “velho” som analógico, num mundo irremediavelmente digitalizado.
Entretanto, já me passaram pelas mãos, leia-se, pelos ouvidos, dezenas de outros DACs, de todos os tipos, com e sem amplificação associada, portáteis e até de bolso, uns melhores que outros, alguns excepcionais, com preços que vão dos 300 aos 10 000 euros - e mais além...
Na secção de Testes/Reviews, os leitores têm muitos exemplos recentes, que são o espelho da extraordinária evolução da tecnologia digital no registo e reprodução de música.
Aquilo a que assistimos hoje é uma autêntica guerra de números, que já vai nos 384kHz/32 bit, e nos permite apreciar agora o que era impossível ainda há dois anos: fazer o download e reproduzir uma matriz original em DSD nativo. Um formato que, tendo também os seus pecados, nomeadamente a necessidade de filtragem do ruído ultrasónico, é o mais próximo do analógico.
Num post recente, Paul McGowan, da PS Audio, defende as vantagens do formato DSD deste modo:
PCM é linguagem de computador, tem de ser descodificada para ser amplificada; o sinal DSD contém de facto música, e não apenas números! Em teoria, pode ser amplificado directamente, desde que alguém conceba o amplificador apropriado...
Nota: Robert Watts está actualmente a trabalhar para a Chord num amplificador de Classe D revolucionário, com uma velocidade de comutação tão rápida que foi preciso abandonar o silício e recorrer a semicondutores de nitreto de gálio utilizados nos radares militares. Diz quem ouviu o protótipo que o mundo não está preparado para a revelação da verdade do som...
Mas eu não quero ir por aí ainda: já ouvi DSD desinteressante e PCM fabuloso! Há até quem defenda que a resolução do CD é por si só superior à capacidade do ouvido humano, e que tudo o resto é marketing! E muitos dos ficheiros áudio disponíveis na net a 96 e 192kHz são uma fraude!
Acima dos 20kHz, é como o malmequer: muito pouco, ou nada! Tanto assim que na HD Tracks - e este é apenas um de muitos exemplos - o álbum Peter Frampton Comes Alive foi reclassificado de 192kHz/24 bit para 48kHz/24bit, depois desta questão ter sido exposta em fóruns internacionais...
Então, qual a vantagem de DACs cada vez mais “rápidos” para percorrer estradas de música com “limites de velocidade”? Ver para crer (clicar na lupa para aumentar). Em baixo, apresentamos a análise espectral de um curto excerto da mesma faixa, originalmente gravada em DSD pela Channel Classics, a 44,kHz, 96khz e 192kHz.
Reparem não só na extensão da informação em frequência que, de qualquer modo, não temos alegadamente capacidade para ouvir, mas sobretudo na regularidade da resposta, patente na eliminação do efeito de pente pela inevitável filtragem digital, que será tanto mais suave quanto mais elevada for a frequência de amostragem.
Em última análise, é a música que conta. Mas quem não gosta de ter um carro que atinge os 384 Km/hora, e que tem cruise control DSD, mesmo quando as poucas autoestradas de alta resolução têm portagens caras e limites de velocidade?
Hoje qualquer carro dá 120. E o conforto, o silêncio, a suavidade da marcha, a segurança, o arranque, a travagem e – sejamos sinceros – o prazer de possuir e exibir não contam? O motor de um Ferrari é música para os seus ouvidos? Posso garantir-lhe que soa muito melhor em DSD...
No próximo andamento, vamos fazer uma agradável viagem musical no Chord QBD76 HDSD em classe DSD, com o Qute HD à boleia. Não perca.
CHORD QBD76 HDSD/QUTE HD - Parte 2: “KIND OF BLUE” - AUDIÇÕES