A Oppo tornou-se conhecida pelos seus leitores universais CD/SACD/Blu-ray. Eu próprio tenho um BDP-93 EU. Agora já vão no 105 e ainda há uma versão ultraartilhada, que se bate com o que de melhor se fabrica no mundo. Mas pronto, também não podemos ir a todas, até porque cada vez mais eu utilizo apenas o PC como fonte privilegiada de áudio e vídeo de alta resolução.
De fabricante OEM a ícone audiófilo em poucos anos. Mais: muitos modelos ditos highend têm um Oppo lá dentro. Tudo começou com a Lexicon, mas depois alastrou como fogo de morro acima. São as chamadas badge brands: só muda a caixa e o logotipo. E o preço, claro! Por dentro, Oppo; por fora upa, upa!...
Assim, quando começou a correr o rumor de que a Oppo ia lançar uns auscultadores (orto)isodinâmicos para concorrer com a Audeze (a propósito: eu adorei os LCD 3, ler teste aqui) e outros como Hifiman e Abyss, fiquei na expectativa. E, de facto, em Munique, lá estavam eles, acompanhados pelo amplificador dedicado HA-1, que utiliza muita da tecnologia desenvolvida para o BDP 105.
Gostei tanto do que ouvi, que me deixei fotografar com eles, uma associação rara que normalmente significa a aprovação prévia de JVH.
1. Introdução
Entretanto, os Oppo chegaram à lusitana praia há já cerca de 1 mês na caravela da UAE (que também distribui os Audeze). Portanto, podia ter escrito sobre eles antes, mas preferi esperar que os “queimassem” primeiro na UAE, não fosse eu “queimá-los”, sabendo-se que sou um fã incondicional dos Audeze, mais ainda que dos famosos Stax electrostáticos.
Daí que eu só agora tenha decidido atacar o teclado: tenho andado entretido a ouvir música com os Oppo PM-1 e não me apetecia escrever sobre eles. Muito menos devolvê-los...
Há quem defenda que esta história da “queima” é uma treta, uma desculpa do crítico quando não gosta muito de um produto e precisa de um argumento justificativo.
Em muitos casos, até é verdade. Quando um componente qualquer não cumpre o que se espera dele, sobretudo cabos, dá sempre jeito escrever que precisa de 300 horas de “queima”, e, logo por azar, o distribuidor pediu a devolução, quando o teste ainda ia no adro das 100 horas, e tal e coisa.
Um dia levei três cabos diferentes (cobre, prata e prata/ouro) ao departamento de química do IST para tirar a limpo o mito da direccionalidade, que era muito gozado no departamento de acústica pelo Prof. Onofre: “como se os electrões fluissem melhor para um lado do que para outro”, e ria-se.
A conclusão foi a de que, dependendo da estrutura molecular do condutor, com a utilização contínua (“queima”?), criam-se “árvores de iões” com um determinado padrão, quando os electrões fluem sempre para o mesmo lado, pelo que teoricamente pode haver vantagem em manter o sentido da ligação. Mas se os ligar ao contrário, o padrão restabelece-se nesse sentido ao fim de algum tempo, logo em vez de 'queimar' cabos talvez seja mais apropriado escrever 'domesticar'...
PM-1 e HA-1: almas gémeas
Bom, tanto o PM-1 como HA-1 chegaram-me já com mais de uma vintena de horas de utilização intensiva, Jorge Gaspar dixit, e eu dei-lhes com mais trinta ou quarenta horas em cima, metade das quais com ruído rosa a níveis médios e, portanto, não há desculpas!
Não que eles precisem de desculpas, mas confesso que quanto mais tocam melhor tocam. Apesar disso, há sempre uma evolução positiva na primeira meia-hora. Uma questão de fluxo?
Olha este, como se não bastasse a “queima” agora ainda temos o “aquecimento”?! No caso do HA-1, sem dúvida, pois funciona em Classe A (e se ele aquece, pá!), e a membrana ultrafina do transdutor do PM-1 melhora claramente – e literalmente - o desempenho com os “alongamentos”...
A Oppo tem meios financeiros com que a Audeze nem sonha e, quando finalmente lançou os PM-1, reuniu a crítica internacional, leia-se anglosaxónica, apresentou o produto e distribuiu press-kits que tinham no saco um... parzito dos ditos. Eis a razão porque já foram publicadas mais de uma dezena de “reviews” em tudo o que é revista e blog.
Claro que os “bifes” têm sobre nós uma enorme vantagem: 90% do teste consiste no copy paste do white paper da própria Oppo, com a descrição externa e interna, funcionalidades, características técnicas, etc, tanto do PM-1 como do HA-1 (este ainda tem poucas reviews, aqui eu sou dos primeiros, vá lá), motivo pelo qual são quase todas iguais, às vezes ipsis verbis.
E mais foto menos gráfico, mais audição ouvida menos teste de medida, as conclusões são também quase todas iguais: a Oppo fez um excelente trabalho mas, hélas, não fez esquecer os Audeze. A mim também não.
Paradoxalmente considero os PM-1 uma “Melhor Compra” que os LCD-3.
Porquê?
Bom, como não posso impedir que leiam o livro de trás para a frente, e fiquem a saber que a culpa é do mordomo, vou publicar isto em fascículos (aproveito os intervalos para ouvir música), prometendo não perder muito tempo nos caminhos verdejantes dos press-releases, que podem ler no site da Oppo. Traduzir dá um trabalhão e depois ninguém liga, pois a malta passa por cima de tudo o que é técnico e chato de ler e vai logo ler a conclusão.
Mas não deixarei de me referir aos aspectos técnicos que, na minha opinião, parecem ter tido mais influência no resultado final. Agora, desculpem-me, mas vou ouvir os Oppo.
2. Design e construção
Os auscultadores estão na moda e há-os de todos os tipos, cores e paladares, tanto no formato e materiais como na tecnologia: supra/circum/introauriculares; fechados, abertos ou semi; activos e passivos; de ligas plásticas e de metal, pequenos, grandes, leves ou pesados.
Os mais exóticos utilizam membranas planas ultrafinas excitadas por transdução electrostática ou (orto)isomagnética. São normalmente grandes, pesados, caprichosos, frágeis, nada confortáveis e muito caros. Os audiófilos masoquistas, que não se importam de enfiar a cabeça num torno (que no Verão passa a forno) para apreciar a superior naturalidade do som, preferem-nos para ouvir música.
Os mais vulgares funcionam com altifalantes mais ou menos convencionais. São normalmente leves, acessíveis e nada esquisitos quanto ao parceiro que escolhemos para os ligar, que até pode ser um telemóvel. O som varia entre o mauzinho e a qualidade de estúdio dos modelos de topo, daí que sejam os preferidos dos profissionais.
Toda a gente os utiliza, desde os médicos ortorrino para nos medir o grau de surdez, aos jogadores de futebol para não ouvirem as bocas dos adeptos quando a equipa perde.
Já os putos espetam nos ouvidos os do tipo supositório, com o som no máximo, ou porque estão surdos por abuso de drunfos acústicos, ou só para chatear o passageiro do lado que tem de levar com aquele tshtshtsh incomodativo.
OPPO PM-1
Os PM-1 são uma contradição nos termos, porque sendo do tipo exótico (planarmagnéticos abertos), são razoavelmente leves, confortáveis, sensíveis (podem ser ligados ao iPad, iPod ou iPhone) e até não são “irrazoavelmente” caros.
Claro que ninguém vai fazer jogging com eles. Mas podia. Claro que ninguém os compra para ouvir com iPhones. Mas podia. Claro que (sendo abertos) nenhum engenheiro de som os vai utilizar no estúdio de gravação. Mas devia. Pelo menos para ouvir o resultado final. Claro que um dia vou ter de os devolver. Mas não queria.
Ao contrário dos Audeze que têm o aspecto de um produto construído por artesãos rurais em madeira exótica, os Oppo são um produto industrial fabricado com materiais duráveis, de qualidade, com excelentes acabamentos e um design moderno, sólido e fiável.
Tal como os Audeze, os Oppo PM-1 utilizam a tecnologia de transdução isodinâmica, que consiste basicamente numa membrana ultrafina (uma espécie de tímpano), na qual é impresso um circuito condutor em espiral que é depois atraído/repelido por um campo magnético composto por pequenos ímans de neodímio.
No fundo, são ambos colunas Magnepan em miniatura, enquanto os Stax são como as Quad electrostáticas.
Para evitar guerras de patentes, cada um dos fabricantes explora o mesmo princípio por vertentes diferentes: formato do diafragma: oval ou rectangular, espiral simples ou dupla, tecnologia push-pull com fileira de ímans só de um lado ou de ambos. Enfim, está tudo bem explicado nos respectivos sites.
Para o leitor basta saber que o que torna os auscultadores planares tão especiais é o facto de o diafragma ser excitado simultaneamente de forma linear em toda a sua área, eliminando a principal causa de distorção dos cones dos altifalantes tradicionais. Isso e o facto de se comportarem em termos de impedância como resistências puras sem efeito de indutância o que facilita o trabalho dos amplificadores.
Assim, não admira que muito do que escrevi sobre o som dos Audeze LCD-3 seja também válido para os Oppo PM-1, (afinal sempre vou fazer copy paste mas de mim próprio):
“Nunca gritam aos ouvidos, nunca se excedem, nunca a voz lhes dói, mesmo quando a ausência de distorção nos incita a ouvi-los cada vez mais alto”.
E também:
“Se é adepto da verdade nua e crua, e não gosta de espreitar, através de um véu diáfano para dentro da alcova onde repousa a ninfa da musicalidade, procure noutro lado: a música apresenta-se-nos toda nua ...só com um véu, que não esconde nada, apenas a torna mais erótica.”
Mas há diferenças entre eles? Há. Saiba tudo no próximo capítulo.
LCD-3 vs. PM-1
Já vimos nos capítulos anteriores que o Audeze LCD-3 e o Oppo PM-1 são muito diferentes no aspecto, mas muito semelhantes no 'conteúdo' musical, até porque utilizam a mesma tecnologia de transdução, logo oferecem ao audiófilo exigente o mesmo “tipo” de som.
A minha memória diz-me que o LCD-3 tem mais cor e contraste que o PM-1, apesar de partilhar o mesmo equilíbrio tonal e os genes da neutralidade tímbrica. Embora sejam ambos do tipo aberto, os PM-1 são mais 'fechados' (deixam escapar menos som para o exterior), o que também contribui para uma menor sensação de ar e espaço.
A minha actual experiência (sem termo de comparação presencial, hélas) diz-me que o PM-1 é ainda mais linear. O LCD-3 soou-me mais ágil em termos rítmicos, e era capaz de jurar que a sensação de mais recorte e vivacidade geral reside no suave “planalto” de 3dB entre os 3 e os 6kHz.
Recorrendo de novo às medidas, o PM-1 revelou uma resposta praticamente plana, com uma pendente suave abaixo dos 100Hz, uma bossa negligenciável nos 500Hz, que confere um peito agradável à voz masculina, e o tradicional “pico” nos 3kHz. Coisa pouca: para aí uns 3dB, quando alguns auscultadores convencionais chegam a uns escandalosos 12dB!, o que em termos visuais corresponde a “puxar” a cor de um televisor para sobressair numa comparação lado a lado na prateleira da loja...
O grave do LCD-3 - ou a minha memória dele - impressionou-me sobremaneira. O grave do PM-1 tem o mesmo carácter orgânico, mas tem uma textura menos elaborada. Contudo, descobri à minha custa que o grave do PM-1 faz parte de um edifício acústico em regime de condomínio, cujo equilíbrio não pode nem deve ser perturbado, sob pena de se perder a coerência geral. Sem dúvida que a Oppo afinou bem os seus meninos.
Ao nível do detalhe intrínseco do corpus musical, por exemplo, os LCD-3 exibem um detalhe intrínseco superior a níveis baixos de volume. Contudo, a partir de um volume médio esta diferença esbate-se, ainda que eu tenda a ouvir os PM-1 mais alto do que era habitual com os LCD-3, não necessariamente em busca da informação perdida, mas porque me dá mais gozo.
Ou isso, ou o facto de eu ter testado os LCD-3 também com cabos balanceados (que os PM-1 aceitam igualmente mas não foram disponibilizados pela UAE em devido tempo), uma argumentação que não colhe porque com o Auralic Taurus eu até preferi a ligação via jack às XLR., lembram-se?
Em que ficamos, então?
A verdade é que não posso afirmar em consciência que o LCD-3 é superior ao PM-1, porque apesar de todos os meus esforços não foi possível ter um par dos Audeze para comparar. Os PM-1 estão aqui comigo e, na ausência dos LCD-3, eu adoro o que estou a ouvir.
Os LCD-3 são neste momento apenas uma boa recordação, e sabemos como a memória nos pode pregar partidas. Embora este seja um dos casos em que quero muito voltar a um lugar onde fui feliz, logo que a UAE tenha um par disponível, ou então dos LCD-X...
Posto isto, os PM-1 são os auscultadores mais lineares que ouvi até hoje, mais ainda que os LCD-3. E isso é uma coisa boa? Em teoria, sim. Na prática, a maior parte dos ouvintes vai sentir que falta um pouco de 'maldade'. E, numa primeira audição, pode até sentir-se frustrado nas suas expectativas, como acontece sempre com este tipo de transdutores.
Ao abusar do igualizador paramétrico do J.Rivers para tentar obter uma resposta de grave aproximada à do LCD-3, o som do PM-1 não melhorou em nada para minha surpresa, antes pelo contrário: o grave ganhou corpo mas tornou-se túrgido e desgarrado.
A longo prazo vai agradecer a coragem da Oppo de optar pela neutralidade, porque o maior gozo dos PM-1 é poder ouvi-los a tocar bem alto durante horas sem sentir cansaço ou desconforto.
O problema (ou virtude?) da transdução isodinâmica, que numa primeira apreciação pode parecer sensaborona, demasiado discreta, chata até, é que depois o som dos auscultadores convencionais soam como se tivessem corantes e conservantes para saber bem. Com bolos se enganam tolos...
E eu não testei os PM-1 apenas com música. Vi filmes e séries em sessões contínuas, como se não houvesse amanhãs que cantam; videos do You Tube, como este que vos mostro abaixo de um concerto intimista de Suzanne Vega na Tiny Desk, telejornais e até o “Eixo do Mal” para aquilatar da inteligibilidade de vozes dissonantes no seio da cacofonia reinante.
A dicção do PM-1 é perfeita e preserva o rico manancial de significantes presentes na voz sussurrada de Vega: não abre demasiado as vogais nem elimina consoantes mesmo quando são por natureza mudas, porque é na correcta reprodução do silêncio que reside a alma da música.
É por não alterar a 'pronúncia' dos sons, que tudo o que se ouve com o PM-1 é mais natural e faz mais sentido: o drama e a alegria, o sarcasmo e a ironia podem perder-se irremediavelmente no fluxo de sílabas às quais se alterou o ponto exacto de incidência da tonicidade fonética.
Num altifalante dinâmico convencional, um som com uma frequência de 500 ciclos, por exemplo, pode ser reproduzido em outros pontos do cone como 499, 501, 502, etc., o que produz 'fantasmas' de distorção. A membrana dos PM-1 é simultaneamente excitada em toda a sua superfície, num movimento linear de pistão.
A frágil relação significado/significante é mais perene com a transdução isodinâmica. That's why I love it so much!...
Nota: As almofadas montadas no par de PM-1 aqui testado são de pele macia muito agradável ao toque. Há uma outra versão em camurça, que não foi enviada, e que segundo alguns críticos tem, e cito 'um som diferente'. Não sei, nem comento. Só posso dizer que a posição das almofadas em relação ao seu pavilhão auricular (mais para baixo, para cima) tem influência na tonalidade geral. Experimente com o ajuste da bandelete à forma do seu crâneo.
A Oppo vai lançar uma versão PM-2 mais barata e fabricada num composto de plástico com almofadas de pele sintética, cujo desempenho acústico garantem ser muito semelhante.
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