O High End 2023 morreu, viva o High End 2024 (9-12 maio). A indústria de áudio não inova, quando muito renova, pois continua a utilizar tecnologias do século passado, aqui e ali com laivos de modernismo, para reproduzir som por meios eletrónicos, como os gira-discos, as válvulas e as colunas de corneta, as quais são o ex-libris do show de Munique.
Tal como na análise histórica, o distanciamento permite-nos ver/ouvir com maior isenção o que se passou em Munique, por isso talvez ainda não seja tarde para fazer o embrulho final, um wrap-up, como dizem os anglo saxónicos, antes de colocar mais uma reportagem na prateleira do esquecimento, numa época em que só não morrem à nascença as notícias virais.
De Frankfurt a Munique
O High End começou em Frankfurt, no romântico Hotel Kempinsky, e em 2007 transferiu-se para Munique, que é uma cidade muito mais acolhedora, mais ecológica, com parques, transportes públicos e passeios que foram pensados para as pessoas, e não para os carros, mesmo sendo esta a terra da BMW.
Só por isso, vale sempre a pena ir a Munique.
A cidade orgulha-se das suas raízes bávaras e, ao fim-de-semana, as pessoas passeiam-se com orgulho de trajes tradicionais: elas de blusa branca, corpete bordado, saia comprida e avental; eles de jaqueta, calções de couro bordados, chapéu de pena, ambos bebendo cerveja e cantando em esplanadas e cervejarias a abarrotar, com a orquestra a tocar modinhas populares que estimulam as gargantas a cantar entre arrotos carbónicos e risos de alegria.
Mesmo assim, o MOC, o centro de exposições onde se realiza o certame, recebeu 22.137 visitantes de 100 países, 550 exibidores de 54 países e 529 jornalistas de 43 países, segundo a última press-release. A organização foi, como sempre impecável, ao melhor estilo alemão.
O High End Show, de Munique, é tão vasto na oferta e na diversidade que 3 repórteres podem fazer 3 reportagens tão diferentes que não coincidem em nada, ou em muito pouco, dependendo dos seus interesses pessoais e comerciais.
Al Di Meola, famoso guitarrista, foi talvez o mais solicitado embaixador de sempre para apresentações, entrevistas e sessões de autógrafos.
Saturday Night in San Francisco
Assistimos, na sala da Nagra, à apresentação do LP de ‘Saturday Night in San Francisco’, de que só foram editadas 600 cópias, a sequela de ‘Friday Night in San Francisco’, com base em matrizes originais que estiveram guardadas na cave da sua residência durante 40 anos, e levaram 3 anos a ser restauradas pela Impex Records.
Peter McGrath
Assistimos também à apresentação Peter McGrath, outro grande embaixador, este da Wilson Audio, que tocou as suas matrizes digitais de gravações exclusivas e não comercializadas, também na sala da Nagra, através de colunas Wilson Audio Alexx V, que nunca soaram tão bem. As Alexx V gostam de filet-mignon digital, codificado em MQA, neste caso, de que McGrath é grande defensor. Diz que o MQA é o formato que mais se aproxima do que ouviu ao vivo. Ele deve saber do que fala...
O som da música ao vivo
Ouvimos, na sala da MBL, uma curiosa comparação entre som reproduzido eletronicamente e som ao vivo de instrumentos acústicos tocados a 1 metro de distância. Não há comparação possível, mas a MBL está de parabéns pela iniciativa.
Os lusitanos
Assistimos ainda à apresentação da Innuos, por Nuno Vitorino, o único representante da indústria portuguesa que conseguiu vingar onde todos os outros falharam: na grande selva do highend.
Veja/oiça em baixo a comparação entre Pulse, Pulse+Pulsar e Statement.
Além da Innuos, os dois outros únicos representantes nacionais foram a Vicoustic, que produz painéis decorativos para tratamento acústico de salas; e Miguel Carvalho, que foi, pela primeira vez, o demonstrador de serviço na sala da Kroma Atelier, onde provou ter unhas para a Mercedes (as colunas, não o carro) contrariando as más condições acústicas com uma imagem estereofónica focada e ampla, com boa dinâmica e um som tonal e tímbricamente correto.
Magico S3 com boa acústica
Não por acaso, um dos melhores sons que ouvimos no MOC foi também o das Magico S3, que foram demonstradas na única sala tratada acusticamente. Eu acho que esta moda de tratar as salas vai pegar no futuro. E não só isso: além da boa acústica, provou-se que a melhor forma de controlar o grave numa sala má é utilizar subwoofers, que podem ser regulados ao milímetro em amplitude e fase.
Wilson Audio
Havia Wilsons por todo o lado, umas a tocar melhor do que outras. Além do som fantástico que Peter McGrath ‘sacou’ de um par de Alexx V, na sala da Nagra, as Alexx V + WatchDog, na sala da Tech DAS/CH Precision, portaram-se muito bem.
Uma vez mais, a solução para controlar o grave passou pela utilização de subwoofers. Porque, de resto, são demasiadas as variáveis acústicas: da eletrónica complementar à acústica da sala, incluindo, claro, a seleção musical, o ambiente ‘social’ e até o lugar que nos coube em sorte. Nós tentamos sempre gravar na sweet spot às horas mortas (ou menos vivas...), mas nem sempre é possível.
Nota: O MOC foi durante algum tempo a catedral do áudio, e o ‘melhor som’ é como a água-benta: cada qual toma a que quer…
McIntosh em hotel de luxo
E, claro, não faltámos ao evento do McIntosh Group, no Hotel Kempinsky, onde foram apresentadas as novas e belíssimas Sonus faber Stradivari G2, que se pautou como um dos melhores sons de Munique, fora do MOC; e a sequela das icónicas monitoras ML1, ambas com amplificação McIntosh.
Creio que este evento da McIntosh é o início de uma nova tendência, pois, tal como sucedeu nos últimos anos da CES (refiro-me ao áudio high-end), muitos fabricantes optaram por demonstrar os seus produtos em hotéis de luxo, fugindo das más condições acústicas (e dos custos) do centro de exposições.
Das monitoras às cornetas
Claro que assistimos também a dezenas de outras demonstrações e audições, das quais demos notícias em direto na nossa página do Facebook; ou em diferido, enquadradas em artigos generalistas sobre cornetas ou colunas monitoras, as quais têm a vantagem de não excitar demasiado os maus modos das salas.
Ou então, em auditórios improvisados em contentores, montados nos quarteirões de avenidas largas na área de exibição ao 'ar livre' também conhecida por Zoo.
E ainda em artigos exclusivos sobre cada um dos distribuidores nacionais que patrocinaram a reportagem do Hificlube, e que os leitores podem agora consultar com mais calma aqui.
Desgostos e alegrias
Tivemos algumas desilusões, como na audição das Clarisys, que se anunciavam como herdeiras das Apogee, mas estão longe de soar como as Diva. Eu tive dois pares de Apogee Duetta, e sei do que falo.
Ribbon por ribbon, antes as AlsyVox, embora não tenhamos ficado também completamente convencidos da sua valia. Este tipo de sistemas são para se ouvir no silêncio da noite, nunca na confusão de um show. Aliás, tal como os auscultadores planarmagnéticos open-back, que deixam entrar o ruído ambiente que mina a qualidade do som.
Preferimos, de longe, ouvir as Western Electric, não as cornetas do princípio do século, desta vez, mas a coluna WE Conceptual, que utiliza um tweeter-médio AMT com irradiação polar a 360º.
Ou até as Thorens SoundWall open-back, que utilizam altifalantes dinâmicos em vez de ribbons.
Gostámos ainda de voltar a ver/ouvir as Avalon Isis, que andaram muito tempo afastadas do ambiente social do highend, pois Neil Patel é avesso à exposição pública – a sua e a dos seus produtos.
Devore, Koda e Trafomatic
A audição das Devore O/baby, Robert Koda Takemi, com colunas Kharma; e do amplificador a válvulas 300B Trafomatic Rhapsody, com cornetas da Tune Audio, deixaram também uma excelente memória auditiva.
Prémio de Inovação
A reportagem do Hificlube centrou-se nos produtos novos que em breve estarão disponíveis em Portugal, para que os leitores os possam ouvir por si próprios.
Normalmente, a inovação faz-se apenas na área digital, mas o amplificador analógico de auscultadores iFI Phantom foi dos mais inovadores, porque é compatível com todos os tipos de auscultadores, incluindo os eletrostáticos (!), bastando para isso mudar um cartão SD que regula a tensão de saída.
Loucura mansa
E, claro, mostrámos uma ou outra loucura audiófila para dar colorido e interesse ao que acaba por se tornar repetitivo, como as cornetas chinesas Super Dragon, da ESD Acoustic.
As Super Dragon foram apresentadas pela primeira vez em Munique em 2018, numa sala tão apertada que mal podiam respirar, depois em 2019 num espaço mais amplo; e agora numa vasta zona de passagem, onde atraíram muita gente, tal como as velhas Western Electric originais dos anos 30 do século passado. Nota: ver vídeo em baixo.
Faltava mostrar-lhes as Bayz Audio, da Hungria, que parecem ser fabricadas com canos de esgoto, mas soam como uma fonte de água limpa. Exibiram-se no certame paralelo HiFi Deluxe. Nota: ver o vídeo 'Auditions at the Zoo'
Não deixe de seguir a nossa reportagem completa aqui.
Até 2024, em Munique!