Read full article in English here
Os Palma DHS-1 são um modelo inovador de auscultadores dinâmicos, circum-auriculares de alta qualidade, made in Spain, que podem funcionar em modo ‘aberto’ ou ‘fechado’, e vão custar-lhe €2,195, na Ajasom. Plenamente justificados.
O nome é uma homenagem a Las Palmas, enquanto a designação DHS são as iniciais de Dual Headphone System, porque os auscultadores podem ser utilizados como ‘abertos’ ou fechados’, bastando para isso rodar as tampas de alumínio perfuradas, sem ter de os tirar dos ouvidos.
Esta dupla funcionalidade não é única no mercado, mas o ‘design’ dos Palma DHS-1 é revolucionário tanto no engenho como na versatilidade. No fundo, funcionam como um dispensador cuja tampa se roda para abrir os orifícios por onde cai a pimenta ou o sal, por exemplo. A ideia é simples e muito utilizada em duches, porém ninguém se lembrou dela para aplicação em auscultadores.
A fórmula de Fibonacci
Mas a comparação termina aqui. A distribuição destes pequenos furos de diferentes diâmetros na tampa não é aleatória. Segue a fórmula de Fibonacci: 1,618 (Golden Ratio),* que rege a progressão geométrica da distância entre os círculos e a redução do diâmetro dos furos. Este padrão tem assim uma função técnica (acústica) e artística (beleza visual).
*Nota: Para seguir a golden ratio à risca, devia ser uma espiral.
O mais curioso é que a diferença acústica subjetiva e objetiva entre os modos open-back e closed-back é surpreendentemente mínima, ainda que audível e facilmente detetável. Mas estou a adiantar-me.
Plásticos: zero!
Os Palma não utilizam nenhum componente de plástico: a caixa dos auriculares é fabricada em Sapele, uma madeira de origem africana, com boas propriedades acústicas; a cabeceira e as almofadas são forradas com pele genuína; e os ganchos de suporte são em aço inox.
De realçar que a madeira aqui não é apenas um anel cosmético só para embelezar, pois trata-se de uma verdadeira caixa acústica com tanta importância no resultado final como a caixa de uma coluna de som.
Na Ilha dos Cães, a banhos (de música)
Até o logo cor de laranja é em alumínio, tal como a tampa perfurada. O logo estilizado parece simbolizar um animal, talvez um cão, porque o nome original latino das ilhas Canárias era Canariae Insulae, que significa Ilha dos Cães e não Ilha dos Canários. Estou a especular, claro.
A construção é excelente: artesanal (são fabricados à mão) e tecnicamente evoluída (tampas de alumínio maquinadas até à perfeição). É verdade que os suportes em aço inox parecem utensílios de cozinha, mas a colocação na cabeça é fácil, firme e estável, embora só permita o ajuste vertical, pois os auriculares não basculam no plano horizontal. E eu devo ser cabeçudo, porque fiquei quase no limite da extensão dos suportes.
O prazer de audição fez-me sentir em Las Palmas – na praia, a ouvir o mar com um par de búzios e a beber margaritas.
A cabeceira e as almofadas são macias e confortáveis, suportando razoavelmente o peso total de 490g, enquanto a mola interna não aperta demasiado a cabeça. O diâmetro interior das almofadas envolve à justa as minhas orelhas, pelo que podem pisar orelhas de maior formato. E isso afeta (muito) a qualidade do som: o grave, por exemplo. Experimente antes de comprar. Atenção: os Palma devem ser usados como ‘over-the-ear’ e não como ‘on-the-ear’!
Ouvi os Palma durante horas sem ter vontade de os tirar, apesar de não me conseguir abstrair de que tinha meio quilo em cima da cabeça. Mas o prazer de audição fez-me sentir em Las Palmas – na praia, a ouvir o mar com um par de búzios e a beber margaritas.
Transdutores eletrodinâmicos
Os DHS-1 utilizam transdutores eletrodinâmicos. Não são, pois, do tipo planar magnético de que sou indefetível adepto. O coração que vibra lá dentro é composto por um diafragma de 50 mm, de material vegetal composto, com cúpula central de celulose rígida e anel de suspensão ultrafino de poliamida, com bobina de 26 mm e íman de neodímio.
A sensibilidade é muito elevada (aberto: 102dB; fechado: 104dB) e a impedância é de 32 Ohms. Os DHS-1 são, assim, uma pêra-doce para qualquer amplificador decente. Claro que vão soar melhor com um bom amplificador, ainda que sejam compatíveis com um telemóvel ou um simples dongle.
Produto de luxo
Os DHS-1 custam €2,195, um preço razoável para um produto desta qualidade, embora possa parecer elevado para uma marca ainda desconhecida (mas não por muito tempo, garanto). A embalagem é de cartão simples, com uma manga de papel branco com a foto e a informação do produto.
Mas, lá dentro, traz uma elegante bolsa de transporte de plástico rígido forrada a tecido macio, com o logótipo da marca gravado, em cujo interior estão acondicionados os auscultadores, e dois sacos de veludo preto, um para os auscultadores e outro para os cabos:
- Cabo de 1,2m com jack de 3,5mm
- Cabo de 1,2m com jack Pentacon de 4,2mm (balanceado)
- Cabo de 2,8m com Jack de 6,3mm
Traz ainda uma bolinha de madeira. Uma amostra de Sapele (creio). Um toque de requinte espanhol.
Amplificadores: cada cor, seu paladar
Ouvi-os durante cerca de duas semanas com amplificação variada: iFI Diablo 2, Chord Hugo 2, Austrian Audio Full Score e iFI GO bar Kensei. Os Palma DHS-1 são tão neutros que deixam transparecer imediatamente as diferenças na qualidade de som de cada um dos amplificadores. Contudo, pelas suas características acústicas, creio que o melhor casamento teria sido com um amplificador a válvulas ou híbrido, como o notável Riviera AIC 10 BAL. E já vamos ver por quê.
Neutro não significa estéril
Há quem confunda a neutralidade dos Palma com esterilidade, ou seja, com um som demasiado seco. Mas a esterilidade pressupõe a incapacidade para ‘dar à luz’. Ora, a música está lá toda: prenhe de sons de que não nos apercebemos antes, tal a quantidade de informação apresentada, colocando os Palma na categoria de monitores de estúdio. O segredo está em saber obter o melhor equilíbrio tonal.
Resposta plana
A opção de fábrica por uma resposta em frequência plana é como uma tabula rasa, na qual podemos inscrever a nossa igualização preferida.
O que se passa é que a resposta em frequência dos DHS-1 é praticamente plana, e nós estamos habituados às curvas de Harman e suas variantes. Tal como acontece com as colunas de som, nem sempre uma resposta plana significa um som mais agradável. Embora seja um gosto adquirido, pois ao não sofrer de erros de adição (quanto muito, de omissão) tem também menos colorações.
No caso dos auscultadores, esta aparente ‘rejeição’ tonal por alguns ouvintes, deve-se à ênfase nos registos médios-altos aos quais nós, humanos, somos particularmente sensíveis, roubando assim calor ao som em geral, enquanto ao grave pode faltar o corpo que alguns rebenta-cabeças adoram, embora não lhe falte impacto: o baixo é poderoso e tenso. Não admira, pois, que haja quem os possa achar frios, quase clínicos, na sua abordagem musical. Nada de mais errado.
Aberto, fechado ou no meio, eis a questão
A primeira experiência a fazer é com os modos ‘open-back’ e ‘closed-back’, bastando para isso rodar as tampas 14 graus, sem ter de os retirar da cabeça, permitindo uma comparação A/B instantânea. Como seria de esperar, os Palma DHS-1 soam melhor ‘abertos’: mais espacialidade e mais extensão do grave. Digamos que ‘fechado’ o grave é mais tenso e intenso, mas menos extenso. A diferença é particularmente notória nas vozes, que soam mais claras e projetadas, mas menos naturais que no modo ‘open-back’, cujos agudos são também mais etéreos.
No final, concluí, contudo, que o melhor som obtém-se no modo ‘semi-fechado'. Ou seja, algures entre o modo aberto e fechado. Faça a experiência. Oiça vozes, sobretudo masculinas, enquanto roda muito lentamente ambas as tampas. Ao fim de várias tentativas, vai verificar que há uma posição onde lhe soam mais naturais, com o justo equilíbrio entre corpo e claridade. No meu caso, o ponto ideal situa-se mais ou menos a meio caminho. O proverbial copo meio-cheio ou meio-vazio depende do gosto ou da música que se ouve (ver foto).
Água-benta
A igualização (equalização, se preferir) é como a água-benta: cada qual toma a que quer. No caso dos Palma DHS-1, pode ‘benzê-los’ para os libertar do alegado ‘pecado’ de excessiva neutralidade e secura, embora eu também os recomende mesmo ao natural, dependendo da amplificação complementar.
Se pretende seguir a minha sugestão, basta' aspergi-los' com +2 abaixo dos 80Hz; +1dB aos 416 e 770Hz; +1 aos 1,42Khz, -2dB aos 2,64kHz, -1dB aos 4,11Hz, -3dB aos 7,22KHz e -1dB aos 13,89kHz para os converter. Ou seja, muito pouco, ou nada. Se utiliza a aplicação Roon, pode temperar a gosto no igualizador paramétrico. Também pode pedir ao FXSound para fazer parte do trabalho por si. Ou não faça nada, e oiça-os como vieram ao mundo.
Audições
Como sempre, aconselho a que leve os seus próprios discos ou Play list, mas aqui ficam alguns exemplos, das dezenas de faixas que ouvi, sempre com prazer. Em alguns casos, discos antigos, que já não ouvia há muito tempo, soaram frescos e novos, quase como renascidos das cinzas, tal é a sensação de presença:
‘Behind The Wall’, por Tracy Chapman, do álbum ‘Tracy Chapman’
Um relato pungente de violência doméstica no ghetto, cantado acapela. Suba o volume até que os ouvidos doam, tal como a dor que Tracy deveras sente. Com o timbre gravilhento que a distingue, a voz de Tracy soa poderosa, lancinante e emotiva, mas limpa, no ambiente de um estúdio seco e com pouca reverberação.
‘First We Take Manhattan’, por Jennifer Warnes, do álbum ‘Famous Blue Raincoat’
Jennifer Warnes cantou no coro de Leonard Cohen, e neste álbum presta-lhe homenagem, rodeada por um notável e vasto naipe de músicos e cantores. Um deles é o baterista Vinnie Colaiuta, que nesta faixa, ataca a pele da tarola com uma energia e ritmo a lembrar o famoso Jeff Porcaro. A Voz de Jennifer soa um pouco nasalada e envolta em reverberação eletrónica (os DHS-1 não perdoam!). Mas nesta e na faixa seguinte, ‘Bird On a Wire’, duas das cinco nas quais Colaiuta exibe as suas artes de percussão, os Palma DHS-1 provam a sua qualidade de monitor de estúdio, mantendo a voz, os coros e o saxofone de Dave Boruff a salvo das vibrações percutivas da tortura dos tambores.
’Memória de um beijo’, por Trovante, do álbum ‘’Terra Firme’
Senti-me nostálgico e fui ouvir os Trovante para me lembrar de como eram uma grande banda. É verdade que tudo soa envolto em reverberação eletrónica pairando sobre uma cama fofa de sintetizadores, mas a voz de Represas é como um feitiço. Tanto que fui até ao fim do disco, ‘Perdidamente’…
‘Olha o Fado’, Fausto, ‘Por Este Rio Acima’
Apenas uma amostra de um álbum que é uma obra-prima da música portuguesa do Séc.XX, talvez a maior. As guitarras, por uma vez bem gravadas, a voz do saudoso Fausto e os festivos coros, são eles próprios uma epopeia musical. Fausto era um perfeccionista. Os Palma DHS-1 fazem-lhe justiça póstuma. Embora nem tudo sejam rosas acústicas, Senhor.
E podíamos ficar aqui ad aeternum, indo por este rio acima.
Conclusão
Os auscultadores Palma DHS-1 distinguem-se pelo seu design convertível inovador, permitindo ao utilizador passar sem esforço do modo aberto ao modo fechado. A precisão da engenharia acústica, a qualidade dos materiais e da construção contribuem para uma excelente qualidade de som, que pode ser afinada ao gosto exigente dos audiófilos. No sossego do lar, ou num espaço público vibrante, os Palma DHS-1 adaptam-se para garantir uma experiência auditiva otimizada. E tudo isto por (apenas) €2.195.
Para mais informações: AJASOM